A importância da multidão. Coluna Carlos Brickmann
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE QUARTA-FEIRA, 5 DE MAIO DE 2021
Já fui informado de que os participantes da manifestação de 1º de maio em favor de Bolsonaro não são tantos assim: são os privilegiados e os seus empregados. Ou que eram todos idiotas, incapazes de perceber que, ao sair às ruas para defender quem não merece defesa, se arriscaram a pegar Covid.
Pode ser, embora improvável. Mas não tem a menor importância. O fato é que as manifestações mostraram que há muita gente disposta a se mover em defesa de Bolsonaro. Podem ser idiotas, mastigar cloroquina, babar na gravata, mas todos votam, e o voto de cada um vale exatamente o mesmo que o voto do mais eminente cientista brasileiro. Isso é o que importa: quem quiser derrotar Bolsonaro não precisa nem deve perder tempo desqualificando seus eleitores. Precisa apenas obter mais votos do que ele.
Este colunista não acredita nos números divulgados. Milhões na avenida Paulista? Como, se ali, amontoados em seis pessoas por metro quadrado, não coubessem no máximo 600 mil pessoas? Mas isso também não importa: era muita gente. Equivocam-se por pedir uma ditadura? Sim – mas para impedir que reelejam seu candidato a ditador é preciso reconhecer que são muitos e que é preciso reunir mais votos que os deles. Democracia é simples assim.
Trump teve mais votos que qualquer presidente na História americana. Perdeu porque os democratas se organizaram para ter ainda mais votos.
As manifestações podem ser úteis à oposição: basta aprender com elas.
Lições de vida
Dia 13 de março de 1964. Este repórter ia a pé para a Folha de S.Paulo quando encontrou uma multidão no sentido oposto: era a Marcha da Família com Deus pela Liberdade. Foi difícil atravessá-la. Chegando à Redação, vi muita gente discutindo o tamanho da Marcha que eu tinha acabado de cruzar. Diziam que ali só havia milionários; que a Igreja ordenara aos fiéis que marchassem; ou que havia dois milhões de pessoas – uns 30% da população da cidade, na época. Bem, milhões não caberiam, milionários não lotariam o centro, a Igreja há milhares de anos recomenda a fidelidade conjugal, sem tanta adesão. Logo depois, o secretário de Redação, Woile Guimarães, me manda coordenar a cobertura.
Fiquei orgulhoso: 19 anos de idade, um ano de jornalismo, e recebia esta missão! Eu devia ser bom mesmo. Só depois descobri que era o único a não ter opinião prévia sobre o tamanho da Marcha. Dizia apenas que tinha gente pra burro (e não era essa a palavra que usava).
Rota de choque
De um lado, gente nas ruas pedindo o golpe; de outro, a CPI da Covid em que Bolsonaro não tem como se sair bem. E investigações sobre seu filho 01, o senador Flávio, com rachadinhas, dinheiro difícil de explicar, milicianos por todos os lados. Até onde Bolsonaro irá para salvar o filho e explicar sua própria atuação na pandemia? Terá apoio militar para salvar as aparências?
Bolsonaro depende do Centrão, que é caro; logo terá de reabrir ministérios que fechou para dar mais cargos aos aliados. Há a inconstância do presidente: promete reduzir a zero o desmatamento na Amazônia, no dia seguinte corta as verbas para a fiscalização; briga com a China, nosso maior mercado; consegue paralisar o acordo Europa-Mercosul, que levou vinte anos sendo negociado. Como sair de todos esses problemas sem ir para o tudo ou nada?
Tem apoio, mas…
Havia muita gente nas ruas em apoio a Bolsonaro no dia 1º de maio. Mas a pesquisa da CNI, Confederação Nacional da Indústria, indica que 89% da população consideram que a situação da pandemia é grave ou muito grave. É uma piora de nove pontos percentuais de um ano para cá. Para 4%, apenas, a situação da pandemia não é tão grave assim: está sob controle.
…a morte vota
Uma pesquisa nacional, em todos os municípios brasileiros, mostra que onde Bolsonaro teve maioria clara de votos a Covid matou porcentagem maior da população. Os eleitores do presidente seguiram seu exemplo: não ligaram para as aglomerações, não usaram máscara. Morreram em massa. É um levantamento da maior importância. Ver em https://go.shr.lc/3b4Jjia
Insaciáveis
A Câmara dos Deputados estuda como permitir que empresas possam, de novo, financiar campanhas eleitorais. Nada contra – só que o financiamento público de campanha, com valores milionários, continuaria em vigor. É mais dinheiro para quem já recebe bem mais do que o suficiente.
Novidade na praça
O jornalista Marcos de Vasconcellos, editor do site Monitor do Mercado, apresenta um novo serviço: o Monitor Investimentos, escritório de agentes autônomos de investimentos que, contratado pelo BTG Pactual, ajuda os investidores a encontrar oportunidades de mercado. Veja em https://monitordomercado.com.br/noticias/18109-monitor-do-mercado-lanca-assessoria-espe
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