Bloqueio das ruas. Por José Paulo Cavalcanti Filho
BLOQUEIO DAS RUAS
Por José Paulo Cavalcanti Filho
Já perdi audiência com juiz, num engarrafamento. Para piorar, a presidente Dilma vetou, em maio, o art. 3º, VII, da Lei 13.281/16 (que altera o Código de Trânsito). Um projeto dela mesmo…
Todos os direitos têm sempre limites que lhes correspondem, nas regras da democracia. É livre a manifestação de pensamento (art. 5º, IV da Constituição), mas não posso falar muito alto depois de certa hora perto da casa dos outros. É livre o exercício de qualquer trabalho (XIII), mas só se pode advogar com carteira da OAB. É livre a locomoção (XV), mas ninguém pode dirigir seu carro na contramão. O direito de protestar seria, então, o único sem nenhum limite?, eis a questão.
Esse direito é reconhecido pelo art. 5º, XVI: “Todos podem reunir-se pacificamente… sendo exigido prévio aviso à autoridade competente”. Trata-se de regra comum, nas democracias maduras. E sempre com dois limites. Um, que seja pacífico. Outro, o de que haja comunicação prévia. Tudo a partir do reconhecimento da prevalência do interesse coletivo sobre os individuais ou grupais.
Esses bloqueios são também injustos porque todos nós, os engarrafados, não temos qualquer poder para resolver as questões por eles postas. O desejo das lideranças desses movimentos parece, basicamente, ser só o de infernizar a vida de quem trabalha.
E como isso se processa?, em toda parte. Salvo datas ou eventos específicos, esses protestos se dão sempre nos fins de semana. Por duas razões. Uma é que os manifestantes trabalham. Protestam, portanto, não em seus horários de expediente. Mas nas folgas. Outra é que os incômodos que causam aos outros cidadãos serão então menores. E sempre se avisa local e hora das manifestações. Para que quem quiser ir, possa. E quem não quiser, fique longe.
Problema é que, no Brasil, tudo parece diferente. Como se nossa democracia fosse a primeira do planeta. Agora, moda é o bloqueio nas ruas e nas estradas. Perdemos tempo. Ficamos presos no trânsito, em vão. Já perdi audiência com juiz, num engarrafamento. Para piorar, a presidente Dilma vetou, em maio, o art. 3º, VII, da Lei 13.281/16 (que altera o Código de Trânsito). Um projeto dela mesmo. Com o fundamento, inacreditável, de que qualquer medida para dificultar bloqueios, feitos por movimentos sociais, representaria “grave ofensa às liberdades de expressão e manifestação”. É preciso (muita) coragem para dizer algo assim. Ou não ter nenhum receio do ridículo.
Há também outros problemas. Por exemplo, o que acontece se alguém não conseguir levar pai ou mãe a um hospital, por conta dos bloqueios? Morrendo o enfermo, quem vai preso? Alguém tem que ir, claro. Segundo as regras da responsabilidade civil, sem dúvida, os que coordenaram a baderna. E não serão processados por assassinato? Está errado, senhores.
Esses bloqueios são também injustos porque todos nós, os engarrafados, não temos qualquer poder para resolver as questões por eles postas. O desejo das lideranças desses movimentos parece, basicamente, ser só o de infernizar a vida de quem trabalha. Fazem protestos sobretudo para aparecer nas TVs e nos jornais. Com lideranças felizes por aparecer nas TVs, dando magníficas declarações.
Perdão, amigo leitor, mas tenho a impressão de que, em alguns casos (não são todos, sem dúvida), os manifestantes nem sabem direito o que fazem nas ruas. Minha sugestão é que, por exemplo num protesto do MST contra o “golpe”, jornais e TVs ouçam não os líderes, mas quem protesta. Tenho enorme curiosidade no que dirão. E nem é para saber o cardápio dos lanches que lhes são oferecidos. Nem quanto recebem, para fazer os bloqueios. Nem quem seriam as fontes pagadoras.
É só para conferir quantos sabem por que ali estão. Somente isso.
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José Paulo Cavalcanti Filho –É advogado e um dos maiores conhecedores da obra de Fernando Pessoa. Integrou a Comissão da Verdade