Eleição: vencedores ocultos. Por Aylê-Salassié Filgueiras Quintão*
Eleições…Não acontece de graça. Candidatos estigmatizados como de esquerda ou de direita, considerados hegemônicos na política, são todos expressão de um sistema eleitoral envelhecido e bastardo, vinculado a diferentes tipos de clientelismo…
Os grandes eleitores no pleito de 2026 não serão da direita, da esquerda, do centrão, do lulismo, do bolsonarismo, fascistas ou comunistas. Serão as novas tecnologias. Os verdadeiros vencedores estão ainda ocultos, e insurgirão no meio do processo eleitoral. Com isso, estaria com os dias contados o modelo de polarização ideológica, cujo propósito, explícito, é evitar a pulverização de recursos entre muitos partidos políticos e, implícita, de gerar negócios nem sempre confiáveis. O sistema está viciado. A inteligência artificial já sabe.
Chegou-se a registrar no Congresso Nacional a presença de representações de 38 partidos políticos. Essa pluralidade sempre era acusada, entretanto, de desaguadouro de negociatas com recursos públicos, quando da sua repartição e apropriação. E não havia necessidade sequer de prestar contas – senão partidária, ao Superior Tribunal Eleitoral, que quase sempre fez” vistas grossas” para o problema.
Agora vieram as eleições municipais. Os analistas parecem muito conservadores ao refletir as possíveis consequências. Somados, no segundo turno, os votos dados aos perdedores (42 %, estimativa) mais a abstenção de 29, 26 %, percebe-se que os vencedores não receberam mais de 40% dos votos. Em Santos a abstenção superou os votos do vencedor.
Não acontece de graça. Candidatos estigmatizados como de esquerda ou de direita, considerados hegemônicos na política, são todos expressão de um sistema eleitoral envelhecido e bastardo, vinculado a diferentes tipos de clientelismo: líderes populistas, indivíduos carismáticos, partidos tradicionais, organizações sociais, ideologias, e interesses privados. Para esses perfis o espaço está estreitando.
A candidatura de Pablo Marçal serve de alerta para um novo rumo que a política e a governabilidade tendem a tomar. Podem desembocar aí na frente numa espécie de Parlamento Digital virtual, ou em algo coletivamente emancipatório, na base do qual estarão as novas gerações, as redes sociais conectadas, e as novas tecnologias. E, ainda não entraram em campo os hologramas. Assim como se elegeu, no passado, no Rio de Janeiro , o macaco Tião como deputado federal e, e São Paulo, o palhaço Tiririca, também para a Câmara Federal, nada impede que a realidade virtual seja introduzida nas próximas eleições , de 2026, que vão escolher presidentes, governadores, senadores e deputados.
Tecnologias digitais conectadas podem abortar um parlamento holográfico, paralelo ao Congresso Nacional. Já existe no Brasil expertises capazes de dar-lhe consequência. Aquela história, mal contada pela Janja e pelo Maduro de que não era Lula que pronunciava algumas falas desastradas, já parecia uma experiência holográfica. Se consultada, a inteligência artificial, uma tecnologia também “pensante”, daria a informação correta.
Em 2004, viajei para Atenas (Grécia) com um grupo de estudantes de Jornalismo da Universidade Católica de Brasília para fazer a cobertura dos Jogos Olímpicos. Na longa preparação pedagógica, aqueles adolescentes conseguiram construir, nos laboratórios de informática internos, uma “âncora digital”, holograma que foi batizado de Athena Politeia, e que transmitia nosso noticiário em quatro ou cinco línguas. Quem não consegue compreender o modelo procure assistir ao filme “SIMONE”, com Al Pacino, ou “Jogos de Guerra”, de Leonard Goldberg: a imagem é reproduzida com perfeição, interagindo com o telespectador até coletivamente. Algumas televisões brasileiras já dominam essa tecnologia, só não a usam para não se confrontarem com os sindicatos de artistas.
As redes digitais elegeram Barack Obama Presidente dos Estados Unidos, e ainda ajudaram alguns candidatos a tornarem-se membros do Parlamento. FHC tentou fazer uso do modelo por aqui, e outros o tem experimentado fraudulentamente. Estratégias e sistemas analógicos serão engolidos pelas tecnologias inovadoras. É profunda a mudança, uma ruptura mesmo. As novas gerações não acreditam no sistema eleitoral convencional.
As eleições municipais no Brasil, que sempre servira de balizamento para as eleições presidenciais e de governadores, começam a perder o privilégio do prognóstico diante do sistema digital. A inteligência artificial não vai engolir atitudes como a de Boulos de aproximar-se (no segundo turno) das teses de Marçal, quando, no primeiro turno, recusou-se a debater com ele, dizendo não discutir política com marginal.
A impressão que se tem é a de que a partir das eleições de 2006 os cidadãos digitalmente conectados não se deixarão levar pelas narrativas e promessas de candidatos analógicos que blefam, colocando as esperanças em um futuro remoto. A rejeição vai aumentar. A inteligência artificial já está em campo, disponibilizando gratuitamente a vida privada ou pública daqueles que pleitearem uma cadeira no Parlamento. Muitos currículos, verdadeiros prontuários policiais, não resistirão. Será revelado, com precisão, quem está ou não apto a concorrer a um emprego no Estado.
Então, aguarde-se. Essas histórias de esquerda e direita, de nós e eles, de disseminação do ódio, de lulismo e bolsonarismo, de fascista ou comunista são tudo narrativas geradas artificialmente em empresas no submundo das criações publicitárias, para confundir os desavisados. O povo está ausente.
Nas próximas eleições, a inteligência artificial poderá desmascarar esses discursos. A rejeição aos partidos e candidatos analógicos tende mesmo a aumentar. Quanta gente poderá ser descartada!
Em tempo: o PT cometeu um grande equívoco, ao colocar o carisma de Lula acima da proposta do partido. O PTB morreu assim.
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Aylê-Salassié F. Quintão – Jornalista, professor, doutor em História Cultural, ex-guarda florestal do Parque Nacional de Brasília Vive em Brasília. Autor de “Pinguela: a maldição do Vice”. Brasília: Otimismo, 2018