Meu celular me escuta e vê? Por Paulo Renato Coelho Netto
Perto do celular, se falo que estou pensando em viajar, ou praia, ou passagem aérea, ou férias, propagandas começam aparecer nos sites que acesso. Do nada?
A cada dia que passa aumenta o medo do meu próprio celular. Existem mais mistérios nele que entre as nuvens digitais e a Terra.
Não se trata de mania de perseguição que precisa de psiquiatra e/ou psicólogo para dar um jeito.
Estou convicto que ele me escuta muito mais que falo, me vê mais que o vejo e me acompanha atento a tudo, mais que a minha própria sombra, que à noite tira folga de mim.
Perto do celular, se falo que estou pensando em viajar, ou praia, ou passagem aérea, ou férias, propagandas começam aparecer nos sites que acesso.
Do nada?
Mudo para carro, tênis, calça, bicicleta, Chicabon da Kibon e essas coisas surgem até nas redes sociais que, no meu caso, se resume apenas ao Instagram.
Tenho repetido uma determinada palavra ultimamente até que recebi, na caixa de spam do e-mail, uma proposta para fazer um curso a respeito.
Do nada?
Hoje abro o WhatsApp e aparece uma mensagem de dar dez tipos de medos diferentes ao mesmo tempo:
– Faça perguntas à Meta AI.
Gente do Vale do Silício, eu não estou preparado para essas coisas. Não quero perguntar nada para robô nenhum.
Agora encuquei com a câmera frontal do celular, essa para tirar fotografia da gente mesmo quando não tem alguém para fazer isso por nós, seres narcisistas da era digital.
Alguém, em algum lugar do mundo, ou mais perto que imagino, pode ver o que faço o dia todo, seja no banheiro ou até no escuro do meu quarto.
Para que uma câmera frontal no celular se existem pelo menos três do outro lado?
Sabemos que softwares permitem que terceiros tenham acesso total à câmera, ao microfone e à localização exata do proprietário do celular. Isso é crime.
No filme Invasão de Privacidade, coisa do milênio passado, em 1993, o dono de um prédio de luxo, interpretado por William Baldwin, tinha câmeras espalhadas pelo edifício todo.
Como um ser onipresente, ele via tudo e todos no edifício em Nova York, incluindo a personagem vivida por Sharon Stone, protagonista da cruzada de pernas sem calcinha mais famosa da história de Hollywood.
Hoje em dia qualquer ursinho de pelúcia pode vir com uma câmera embutida, ou caneta, óculos, relógio. Lâmpadas transmitem imagens e áudios em tempo real.
Desde que tenha uma câmera em um aparelho eletrônico, em algum lugar alguém pode te ver assistindo televisão, em frente a um computador, notebook, tablet ou lendo esse artigo que escrevi no escuro do meu quarto, no celular, enquanto o sono não vinha.
Cem carneirinhos, noventa e nove carneirinhos, noventa e oito carneirinhos…
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Instagram: @paulorenatocoelhonetto
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Paulo Renato Coelho Netto – é jornalista, pós-graduado em Marketing. Tem reportagens publicadas nas Revistas Piauí, Época e Veja digital; nos sites UOL/Piauí/Folha de S.Paulo, O GLOBO, CLAUDIA/Abril, Observatório da Imprensa e VICE Brasil. Foi repórter nos jornais Gazeta Mercantil e Diário do Grande ABC. É autor de sete livros, entre os quais biografias e “2020 O Ano Que Não Existiu – A Pandemia de verde e amarelo”. Vive em Campo Grande.