Histórias que o esporte escreve. Por Laurete Godoy
… São essas as bonitas histórias que o esporte escreve…
Nos Jogos Paralímpicos de 2024, o Brasil bateu recordes na conquista de prêmios e encerrou a participação em Paris com 89 medalhas, sendo 25 de ouro. E, por falar em medalhas, essa notícia me reportou a dois fatos relacionados a medalhas esportivas, que desejo compartilhar.
Cláudia Pastor integrou a equipe brasileira de basquetebol feminino, vice-campeã da Olimpíada de Atlanta realizada em 1996. Foi um evento especial. Comemorou o centenário da realização, em Atenas, dos Primeiros Jogos Olímpicos da Era Moderna, que haviam sido renovados dois anos antes, no congresso esportivo levado a efeito na Sorbonne, Universidade de Paris, graças ao empenho do humanista francês Pierre de Fredy, o Barão de Coubertin.
Passou o tempo…
Maurílio, filho da Cláudia, desde o nascimento sofria convulsões e ataques diários. Aos onze anos de idade foi diagnosticada a causa: um tumor no hipotálamo. Graças a uma campanha solidária feita pelas redes sociais, Maurílio foi operado em Paris, mas precisava de trinta e cinco mil reais para complementar o tratamento. Em 2016, sem recursos financeiros para tal, Cláudia decidiu leiloar sua medalha olímpica de prata e, por incrível que pudesse parecer, ela foi arrematada pelos necessários trinta e cinco mil reais.
Maurílio foi operado novamente e ficou curado. A pedido, o nome do comprador ficou no anonimato e, assim, permaneceu.
Em 2019, o programa Globo Esporte desvendou o mistério e tornou-o público.
Um professor de filosofia e educação física, apaixonado por esporte, atleta máster e colecionador de objetos esportivos, sensibilizado com o drama de Cláudia, teve uma atitude altruística. O valor do objeto leiloado era muito menor, mas ele decidiu destinar à compra da medalha olímpica, os trinta e cinco mil reais, que representavam todo o dinheiro que possuía e que acabara de receber como indenização, ao deixar o emprego em uma Universidade.
Combinada a estratégia com o leiloeiro, o comprador disputou lances emocionantes, competindo com ele próprio, até chegar à quantia que havia decidido doar e tudo culminou com a bem sucedida cirurgia do filho de Cláudia.
Finalmente, após três anos de espera, Cláudia e Maurílio puderam conhecer, abraçar e agradecer pessoalmente ao professor Jerry Edson da Costa, o magnânimo personagem dessa história. E, na oportunidade, Cláudia recebeu de Jerry uma réplica da medalha olímpica da qual ela se desfez, para proporcionar a cura do filho.
Posteriormente, em reconhecimento, Jerry recebeu a Medalha do Mérito Panathlético, maior honraria outorgada pelo Panathlon Club de São Paulo.
Ao contar esse fato, lembrei-me de outra história, que também tem a medalha como personagem central.
No ano de 1963 morei em São José dos Campos, onde conheci Alberto Marsson, integrante da equipe que conquistou o primeiro prêmio olímpico do basquete brasileiro. Medalha de bronze nos Jogos de Londres, em 1948, sob o comando do técnico Moacyr Daiuto.
A esposa de Marsson, de nome Dirce, também era jogadora de basquete. Por ela ouvi um lamento, que foi repetido ao longo dos anos: em 1950 integrou a equipe paulista que foi campeã brasileira de basquetebol. Porém, a festa de entrega dos prêmios ocorreu em São Paulo e Dirce não pode comparecer. Um dirigente recebeu por ela a medalha, mas nunca a entregou à jogadora. Contado o fato, vinha a sentida e amargurada queixa: – “Com isso, meus filhos e netos jamais poderão conhecer a medalha que conquistei como campeã brasileira. Essa é a maior tristeza da minha vida.”
Lá um belo dia, em silêncio para não gerar expectativas, decidi entrar em campo e apostei todas as minhas fichas na empreitada, a fim de proporcionar uma alegre surpresa à Dirce.
Consegui localizar a “Coca”, Zilda Ulbrich, que fora capitã da equipe de 1950. Procurei-a, marcamos um encontro e expus o fato. Prontamente ela me emprestou a famosa medalha, que levei ao amigo Piazza, companheiro do Panathlon Club, para fazer uma cópia. Quando fui devolver a peça original à proprietária, Coca não aceitou. Ficou com a cópia e fez questão de ceder a verdadeira medalha para a Dirce, por entender que a longa espera merecia essa gentileza…
No ano de 1999, depois de esperar quase meio século, em uma festa realizada no Tênis Clube de São José dos Campos, com um bonito discurso, o professor Antonio Carlos Pereira, panathleta e Coordenador de Esportes do Estado, entregou, finalmente, a medalha de campeã brasileira de basquetebol a uma Dirce Marsson emocionada e feliz, rodeada dos filhos e netos.
Entre os convidados, estavam Lilian e o professor Henrique Nicolini, fundador e incentivador do Panathlon Club de São Paulo, prestigiando o evento que comprovou, uma vez mais, o lema da associação da qual ele foi alma e coração: LUDIS IUNGIT – O ESPORTE UNE.
Posteriormente, Marsson me segredou: naquela noite, Dirce dormiu com a medalha de campeã pendurada no pescoço.
São essas as bonitas histórias que o esporte escreve…
São Paulo, 10 de setembro de 2024.
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Laurete Godoy – Escritora e pesquisadora. Autora de Brasileiros voadores – 300 anos pelos céus do mundo.
Tive a oportunidade de conhecer sr Alberto Marsson e D Dirce…Pessoas maravilhosas que me recebiam em sua casa com muito carinho.
Que Linda História. Deve haver várias, nesse imenso Brasil.
Quantas histórias lindas o Esporte nos brinda! Gratidão Laurete por sua narrativa, sempre tão linda!