O papel social da poesia. Por Adilson Roberto Gonçalves
… a poesia é fundamental como expressão para além da própria vida, como dizia Ferreira Gullar. E não se pode restringir à poesia que conhecemos, pois muito se produz em todos os cantos…
Soa pretensioso o título, mas a intenção é apenas relatar algumas reflexões de uma entrevista recente para um grupo de WhatsApp sobre poesia. Sim, teço algumas considerações sobre o papel social da poesia, mas sem estudos ou aprofundamentos. É uma opinião.
Entendo que a poesia é fundamental como expressão para além da própria vida, como dizia Ferreira Gullar. E não se pode restringir à poesia que conhecemos, pois muito se produz em todos os cantos. Na pandemia vimos o quanto nos fez falta a arte. Nasci em Pedreira-SP e fui criado em Campinas. As brincadeiras de rua, a escola e os conflitos para se manter foram determinantes para as escolhas da vida e, é claro, também para a escrita. Gosto mais de escrever à noite, perto da madrugada quando vou dormir. Mas inspiração pode cair na mente e nas mãos a qualquer tempo, então tenho sempre pronto um caderninho para anotações.
A poesia de Leminski me fascina e o dizer muito em poucos versos é uma busca constante para expressar minhas contestações e insatisfações. Poeta é o que expressa suas dores, amores, angústias, denúncias e um longo etc., mas que não necessariamente é entendido ou compreendido. Quando ele próprio já compreende os versos que faz é uma vitória interior. Estou nesse caminho. A língua é dinâmica, tanto a falada quando a usada para além da degustação. Mas, tal qual em todas as palavras que usamos, a conotação é temporal.
Perguntado se existe poesia boa ou má, respondo que, com certeza, não. Há poesia que agrada mais ou menos, depende de quem a lê e como a lê e assimila. Sendo arte íntima, nem todos a compreenderão como tentou escrever o poeta. Assim, quanto às múltiplas vozes e estilos vindos das ruas, perguntaram se elas “se completam ou criam nichos para pintar a face das grandes cidades”. Resposta direta: criam nichos. É muito difícil integrar a velha guarda de poetas clássicos com os movimentos das ruas, muito mais ricos e abundantes – hip hop, slam, rap, etc. Eu mesmo vou a alguns eventos fora de minha bolha muito raramente. É um erro de todos nós (atados e desatados).
Por fim, não acho importante ou fundamental ser um acadêmico, mas é uma oportunidade interessante, se levada com a devida responsabilidade. Ser acadêmico apenas por uma medalha ou diploma não faz sentido. De todas as academias e instituições culturais de que participo, estou sempre à frente de ações e procuro responder aos que estão fora com produção artística, cultural, intelectual. Muitos apenas se dão o valor pelo título.
Mas o espaço poético é muito maior do que as cadeiras acadêmicas.
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– Adilson Roberto Gonçalves – pesquisador da Universidade Estadual Paulista, Unesp, membro de várias instituições culturais do interior paulista. Vive em Campinas.