As tolices de Primavera. Coluna Carlos Brickmann
EDIÇÃO DOS JORNAIS DE DOMINGO, 5 DE DEZEMBRO DE 2021
Bolsonaro escolheu seu partido, o PSDB escolheu seu candidato, Lula é o nome do PT, Moro mostra que tem força. Agora, é esperar o ano que vem: o que se discute, tipo Alckmin será vice de Lula, candidato ao Senado pelo PSDB ou candidato a governador pelo PSD de Kassab, tanto faz como tanto fez. As próprias pesquisas, por enquanto, só servem para munir os partidos de informações: falta muito tempo para prever o possível quadro eleitoral.
Quando não há o que informar, começa a temporada da silly season, época das tolices. Discute-se tudo: se Michelle iria ou não à cerimônia de filiação de Bolsonaro ao PL, e por quê; se André Mendonça se comportará no STF como um jurista ou um fundamentalista evangélico (e se esquece a resposta óbvia: de que se comportará como um bolsonarista, ao menos enquanto seu atual ídolo for poderoso); se Moro, uma espécie de Bolsonaro que oculta a espingarda de cano serrado na caixa de violino, vai dividir o apoio militar de que o presidente disponha.
E a história da tal “noivinha do Aristides”, que não se sabe como surgiu, já que a senhora presa por insultar o presidente nega tê-la dito, a Polícia não a menciona, mas virou tema de fofocas sobre o tempo em que Bolsonaro era da ativa. Debate-se algo enterrado lá atrás. Achou-se até uma entrevista do ex-ministro e coronel Jarbas Passarinho, de 2011, sobre o hábito de Bolsonaro de, em visita ao quartel, ir dormir com os sargentos. E daí? O presidente só empunhou a caneta muito tempo depois.
Previsão de pesquisas
Um exemplo do que ocorre na silly season: a imprensa ouviu presidentes de partidos políticos querendo saber o que vai acontecer no ano que vem. A maioria acredita que, em fevereiro, Sergio Moro vai ultrapassar Bolsonaro nas pesquisas. Até pode acontecer: e, se acontecer, Bolsonaro terá de tomar providências urgentes para ganhar um cargo eletivo e manter-se protegido pelo foro privilegiado. No caso, talvez tente se eleger senador ou, o que é mais provável, deputado federal (é mais fácil e também garante o privilégio).
Mas pensemos juntos: a pergunta que está sendo feita é qual a previsão do que as pesquisas irão prever no ano que vem. É meio muito.
Trabalhar…
Bolsonaro está disposto a não ir ao Fórum Econômico Mundial, em Davos, Suíça, entre 17 e 21 de janeiro. Neste Fórum, reúnem-se líderes políticos e econômicos para discutir como vai o mundo. É uma excelente oportunidade para manter contatos com o Poder – e é exatamente por isso que Bolsonaro não quer ir até lá. Suas experiências no ramo têm sido ruins: vê seu Governo criticado por, no mínimo, nada fazer para reduzir o ritmo de desmatamento da Amazônia, por reduzir a fiscalização, por tolerar atividades ilegais; e, principalmente, por mentir a respeito da situação, acreditando que ninguém vai descobrir nada – justo agora, quando satélites registram tudo o que acontece.
Pior, os dirigentes de grandes países não disfarçam a aversão a Bolsonaro, isolando-o. Quem deve representar o Governo brasileiro por lá é o ministro Paulo Guedes – que, como recebe esse tratamento por parte de Bolsonaro e de outros ministros, já deve estar acostumado.
…dá trabalho
Dois governadores já confirmaram presença: Helder Barbalho, do Pará, e João Doria, de São Paulo. E, como de costume, haverá um grande grupo de empresários brasileiros, representando os maiores grupos do país.
Os amigos do inimigo
Gilmar Mendes, escolhido para o STF por Fernando Henrique, e Dias Toffoli, nomeado pelo presidente Lula, se empenharam a fundo pela aprovação do “terrivelmente evangélico” André Mendonça para o Supremo. No dia da sabatina, telefonaram para dezenas de senadores, pedindo votos para Mendonça. O ex-ministro Sergio Moro deu os parabéns a Mendonça pela aprovação, “com seus atributos técnicos e sua formação cristã”.
Pois é: Mendes não gosta de Moro (nem de lavajatistas como Mendonça), Moro não quer saber de Bolsonaro, que escolheu Mendonça, Toffoli tem berço petista. Será que todo mundo ficou maluco e resolveu dar a Bolsonaro uma vitória política que ele e sua caneta, sozinhos, não conseguiriam concretizar?
Os inimigos do amigo
Se André Mendonça fosse rejeitado, seria uma tremenda derrota política do presidente. Foram os adversários de Bolsonaro que evitaram essa derrota. Que será que eles sabem que nós não sabemos? Estarão convencidos de que o provérbio lusitano “Se queres conhecer o Inácio, dê-lhe um palácio” será mais uma vez confirmado?
Pode ser: Bolsonaro já não tem qualquer poder sobre o ministro André Mendonça. E André Mendonça é que passou a ser poderoso, tendo como incomodar Sua Excelência. O ministro Kássio com K até agora correspondeu à confiança do presidente, mas não são todos que têm sua falta de imaginação.
E, quando alguém já não tem nada a perder – no caso, tudo está garantido enquanto estiver vivo – seu poder é ilimitado.
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Vão perguntar a Guedes sobre nossas duas decolagens, que ele garante que viu. Ele poderá dizer que, na face austral da Terra plana, a gente tem o hábito de decolar pra baixo.
Andrezinho é dançarino exímio: tem bom jogo de cintura e ritmo é com ele, qualquer um.
Já escreveu loas a Lula quando das eleições de 2002 e livro a Toffoli. Qual a surpresa?