E nossos jornais? Por José Paulo Cavalcanti Filho
…E a Grande Mídia brasileira? Numa realidade cada vez mais radicalizada, que é a que temos hoje, como se comporta? Para uns, atuando como atores políticos, já desistiu de fazer jornalismo. Enquanto outros a veem numa missão redentora, como salvadora da Democracia…
E a Grande Mídia brasileira? Numa realidade cada vez mais radicalizada, que é a que temos hoje, como se comporta? Para uns, atuando como atores políticos, já desistiu de fazer jornalismo. Enquanto outros a veem numa missão redentora, como salvadora da Democracia. Cada qual escolha seu lado, a partir de como vê o mundo. “Cada qual com sua classe/ Seus estilos de agradar”, dizia Rouxinol (embolador de Gravatá). Mas, à margem da política, seria bom observar algumas regras que são comuns em países culturalmente avançados.
Para começar, os meios de comunicação devem sempre distinguir, com clareza, interesse do público na informação e interesse público da informação. No primeiro caso, a só curiosidade justificaria a notícia. No segundo, seriam preservados intimidade, vida privada, honra e imagem das pessoas. Sem contar que, como acontece nas melhores democracias, é cada vez mais necessário observar meios éticos na obtenção da informação (algo que deveria valer, sempre, sobretudo no Supremo). Inclusive processando-se documentos e fotografias, em princípio, apenas com o assentimento da pessoa diretamente interessada. Sendo feitos, sem isso, apenas quando for aberto, o evento. Ou determine o referido interesse público da informação.
Países que nos são culturalmente próximos já sagram Códigos de Ética para a Imprensa. Entre eles França (Carta do Jornalismo, 1918), Estados Unidos (1926), Inglaterra (1938), além de um código de procedimentos operado pela Press Complaints Commission (1991). Em Portugal começou a ser discutido, no distante 1988, um “projeto de Código Deontológico dos Jornalistas Portugueses”. Uma “propositition for an International Code of Ethics” teve suas basic guidelines aprovadas, em 1991, no Simpósio de Estocolmo do Cyprus Press Council. E um Código Deontológico foi aprovado na ISPA, para a Internet, em 1996. Sem contar que códigos similares foram adotados por numerosas organizações internacionais de jornalistas (como FIJ e OIJ), de Editores de jornais (FIEJ e American Society of Newspaper Editors), de ombudsmen (ONO). Até no Brasil temos um arremedo de Código de Ética para consumo interno aprovado, em 1986, pela XV Conferência Nacional dos Jornalistas.
Claro que os exageros permanecem, especialmente em alguns jornais privados. O Grupo Gannett (92 jornais nos EUA, inclusive o USA Today), por exemplo, exige dos jornalistas que começam a trabalhar um compromisso de isenção representado por declaração, em papel com a marca do Grupo, dirigida aos jornalistas que serão seus companheiros de trabalho, começando por “Dear Gannett Colleague …”. O News-Jornal de Wilmington (Delaware) publica seu Código, a cada ano, nos primeiros dias de janeiro. Em 1994, os Editores de Jornais da Suíça (URJ) publicaram uma diretiva enorme só com respeito a “Nomes em Processos Judiciais”, em regras como a do art. 2º: “O nome do acusado não é, salvo exceção, publicado e a designação utilizada pelo jornalista não pode permitir a identificação do acusado”. Faltando, agora, só ser lido com cuidado por aqui. Que o teor de democracia das seis primeiras páginas, e das colunas sociais de todos os jornais brasileiros, continua substancialmente mais elevado que o das páginas policiais. Onde pessoas simples são sempre arrombadores, maconheiros ou marginais, ainda quando seus processos não tenham sido sequer iniciados. E vigente uma Constituição (art. 5, LVII) que lhes garante “presunção de inocência, até prova em contrário”.
Na Inglaterra (NUJ), uma das regras é “resistir à tentação de dramatizar os casos”. Nos Estados Unidos, “artigos, fotos e ilustrações nunca devem ser publicados com a intenção de ganhar prêmios”, sugerindo não ocorra “confusão entre jornalismo e espetáculo” (Wall Street Journal). Na Suécia (AEPS), não se pode ir nem a “cafés da manhã com a imprensa”. No Japão (Nihon Shinbun Kyokai) recomenda-se, ao jornalista, nunca dar sua opinião pessoal. Em 1993, o Conselho de Imprensa de Quebec condenou, formalmente, o “reality show” em que se teria convertido o jornalismo americano. Mais recentemente, no começo deste ano, o New York Times, maior jornal do planeta, demitiu a editora Lauren Wolfe que, no seu twitter pessoal, postava mensagens de apoio a Joe Biden. Para evitar o risco de que o leitor considerasse não ser isento, o jornal, nas matérias sobre o presidente.
Em resumo, por toda parte, jornalismo é profissão que merece cuidado, atenção, respeito. E por aqui?, nos dias de hoje. Como estamos?
José Paulo Cavalcanti Filho – É advogado e um dos maiores conhecedores da obra de Fernando Pessoa. Integrou a Comissão da Verdade. Vive no Recife.
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