Semelhanças, não simples coincidências. Por Edmilson Siqueira
SEMELHANÇAS, NÃO SIMPLES COINCIDÊNCIAS
EDMILSON SIQUEIRA
As semelhanças entre os métodos trogloditas de fazer política têm a fonte comum do autoritarismo que, se der certo, desemboca no totalitarismo. A classe política brasileira nunca foi flor que se cheire. Mesmo quando os milicos mandavam no país, muitos deputados e senadores se enriqueceram muito além dos proventos oficiais. Inclusive alguns de oposição…
Bolsonaro, tal qual Lula, quando acuado, mente descaradamente. Os bolsonaristas, quando atacam, tal qual o PT, tentam destruir reputações ilibadas, na impossibilidade de desmentir a denúncia.
As semelhanças entre os métodos trogloditas de fazer política têm a fonte comum do autoritarismo que, se der certo, desemboca no totalitarismo.
A classe política brasileira nunca foi flor que se cheire. Mesmo quando os milicos mandavam no país, muitos deputados e senadores se enriqueceram muito além dos proventos oficiais. Inclusive alguns de oposição, como Orestes Quércia. Ulysses Guimarães também. Ganhava 10% do salário de todo servidor que fosse contratado em prefeituras do MDB a pedido dele.
… Bolsonaro precisaria ter um pouco da capacidade de Getúlio de concordar com os antagônicos, um pouco da perspicácia de Tancredo de agradar a gregos e troianos, alguma coisa do discurso de Moura Andrade que encantava a todos e uns dez por cento da cultura de um Fernando Henrique…
O partido tinha umas 300 prefeituras só no Estado de São Paulo e que prefeito se recusaria a atender um pedido do “Senhor Diretas”? A fonte dessa informação foi uma servidora que amava o deputado pelo emprego conseguido em Campinas e depositava todo mês, fiel e alegremente, a “rachadinha” do presidente do MDB.
O atual Congresso tem no tristemente famoso Centrão sua maior bancada. Os presidentes das duas casas só se elegeram porque assinaram, com sangue, a vampiresca agenda dessa turma. Ele, o Centrão, sabe o poder que tem. Se o presidente não fizer suas vontades, não passa projeto nem MP no Congresso. Para passar, o preço é alto, não só em cargos – já são mais de dez mil distribuídos a partidos – mas também em mudanças nos textos que chegam do Planalto. Moro e Guedes têm sofrido na carne essas deturpações de suas boas intenções.
Para enfrentar essa batalha, depois de ser eleito pregando intolerância zero à corrupção e uma economia liberal, Bolsonaro precisaria ter um pouco da capacidade de Getúlio de concordar com os antagônicos, um pouco da perspicácia de Tancredo de agradar a gregos e troianos, alguma coisa do discurso de Moura Andrade que encantava a todos e uns dez por cento da cultura de um Fernando Henrique para se colocar acima daqueles que quisessem conspirar para derrubá-lo.
Convenhamos, o capitão reformado está longe, muito longe de qualquer um deles. Por seus atos e atitudes até aqui, mais se assemelha a um Lula sem sua esperteza malandra e assessoria de velhas raposas, mais a uma Dilma que consegue formar duas frases com sentido, mais a um Itamar Franco sem o topete moral que se desmanchava ao vento das sem calcinhas.
As promessas de campanhas, diga-se, não eram tão difíceis de cumprir caso a massa encefálica do eleito estivesse alguns pontos acima da que ora se apresenta. Um economista liberal radical, um ex-juiz digno e cumpridor da lei e louco para impor ordem no galinheiro, alguns outros ministros prenhes de boas intenções (nem todos, infelizmente) e outros que poderiam ser devidamente detidos em suas fanfarronices tão logo chegaram ao centro do poder e nele se lambuzaram, era um time que, com pequenos acertos, ganharia o campeonato e o capitão poderia levar 2002 com um pé nas costas. E o Brasil agradeceria por voltar a crescer e, talvez, de modo sustentável.
Mas a política é a arte da conversa, do convencimento, da astúcia e de saber usar o poder. Sem conseguir convencer ninguém com sua conversa, sem ter astúcia suficiente e usando poder sem saber do que se trata, Bolsonaro foi se desconstruindo a cada embate criado por ele mesmo ou por seus filhos, embates esses completamente desnecessários e que redundaram em perdas irreparáveis tanto de quadros quanto de prestígio. O trio de zeros à esquerda passou mais tempo se defendendo das próprias asneiras do que pensando no futuro do país que, vejam só, é comandado pelo pai deles.
… o governo Bolsonaro navega em águas turbulentas, mesmo que a meteorologia insista em dizer que o mar está calmo. As semelhanças entre o que se vê e o que se viu recentemente no Brasil chegam também à criação de uma máquina de destruir reputações, que tanto dano causou a pessoas íntegras durante os governo petistas. Os bolsonaristas, tal como os petistas, não têm qualquer receio de criar mentiras…
As encrencas que surgiram do nada causaram feridas que dificilmente cicatrizarão a tempo da campanha de 2022. A briga pelo butim partidário é uma – e talvez a mais notória – delas. O partido pelo qual Bolsonaro foi eleito, que saiu do nada para ser a segunda força da Câmara, hoje está dividido em dois: o próprio partido que não sabe o que fazer, reduzido a menos da metade, e um novo – criado por Bolsonaro, mais que anda não nasceu – que não sabe para onde ir. De um partido que poderia ser forte, fizeram dois nanicos. E rivais.
Por essa e outras, o governo Bolsonaro navega em águas turbulentas, mesmo que a meteorologia insista em dizer que o mar está calmo.
As semelhanças entre o que se vê e o que se viu recentemente no Brasil chegam também à criação de uma máquina de destruir reputações, que tanto dano causou a pessoas íntegras durante os governo petistas. Os bolsonaristas, tal como os petistas, não têm qualquer receio de criar mentiras e espalhar pelas redes sociais ou pela imprensa amiga que, aliás, rapidamente, mudou de dono e senhor e agora lambe as botas do novo guardião do cofre público. Não têm qualquer receio até de falsificar imagens de cinco anos atrás para apresentá-las como se de agora fossem, como aquela de Paulo Ricardo convocando para manifestações em 2015, devidamente editada para parecer que o cantor está ao lado de Bolsonaro na aventura atual. Não sei se está, mas o vídeo que recebi é o mesmo de cinco anos atrás, com a data que ele pronuncia devidamente cortada.
Assim, de tropeço em tropeço, caminha um governo que tinha tudo para mudar o Brasil. Ainda há alguma esperança, claro, pois a equipe econômica é boa, Moro é bom e há alguns generais por ali que talvez contenham a fúria destruidora de um troglodita que, a partir de alguma coragem e o aproveitamento de um flanco deixado aberto pela covarde oposição à esquerda que por aqui sobrevive, acabou sendo eleito presidente do Brasil.
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Edmilson Siqueira– é jornalista