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PUBLICADO ORIGINALMENTE EM O GLOBO E NO SITE DO AUTOR, www.gabeira.com.br, EDIÇÃO DE 30 DE AGOSTO DE 2021
Todos tememos um pouco as pessoas a quem perguntamos se está tudo bem e que respondem com longas reclamações, recheadas de detalhes.
Eu arrisco ser uma dessas pessoas, quando volto de algumas viagens pelo interior do Brasil. Não está tudo bem. O inverno foi duro, e as geadas em algumas regiões destruíram cafezais, milharais e até bananeiras.
Nem sei se vi tudo bem, porque me desloquei no meio de nuvens de poeira que a seca trouxe para as estradas secundárias do Sudeste. As cachoeiras, em grande número, tornaram-se discretos filetes de água, como é o caso da Rasga Canga, no Parque Nacional da Serra da Canastra.
A seca me pareceu uma realidade tão nítida, e a crise hídrica tão evidente, que não posso me calar sobre ela, embora saiba que nem sempre esses problemas interessem.
Acontece que, além da escassez de água, caminhamos para a falta de energia. Na verdade, a escassez de água não é apenas um dado conjuntural: perdemos 15,8% de nossa água doce nas últimas três décadas.
Por que menciono algo tão áspero como seca, nuvens de poeira, cachoeiras minguantes? Porque é preciso fazer campanhas de uso racional de água e energia e, se dependermos do governo, isso não sairá. Assim como não saiu a vacinação antes que fizéssemos uma tremenda gritaria.
A mesma tendência a negar está presente agora. O governo considera o voto impresso o principal problema do Brasil. O desmatamento progressivo só interessa na medida em que possam faltar árvores que dão o papel para imprimir os votos.
Menciono a insistência oficial em negar a realidade, mas queria vê-la sob outro ângulo também. O ministro da Educação afirmou que o governo não quer saber de inclusivismo, de integração nas escolas de pessoas com deficiência, porque atrapalham o ritmo dos trabalhos.
Sempre acreditei em incluir essas pessoas nas escolas. Sei que não basta a vontade, mas também a criação de condições para que isso aconteça com eficácia.
Minha filha é psicóloga e professora. Ela vê a inclusão como um dos aspectos mais importantes de seu trabalho.
Entre outras características, temos essa que nos coloca como indesejáveis para o governo Bolsonaro.
Gostaria de lembrar um grande nome da cultura alemã: Nietzsche. Foi um brilhante filósofo preocupado em libertar as pessoas de consolos em outro mundo, para que vivessem alegremente sua vida terrena.
… Sigamos em frente. Eles não querem o inclusivismo, não queremos o exclusivismo. Estamos empatados. Veremos adiante para quem a História sorrirá…
Mas Nietzsche foi um pouco longe, na medida em que afirmava que, quanto mais solitária, mais forte seria a pessoa para suportar sua liberdade. Ele achava a comunidade uma ilusão, e sua filosofia tornou-se um risco ecológico e político. Vivemos num mundo que precisamos proteger e entre pessoas com quem precisamos colaborar.
A empatia era uma lacuna na filosofia de Nietzsche, e ele acabou inspirando algumas ideias do nazismo. O governo Bolsonaro foi também atingido por alguns dos humores dessa ácida concepção. O pavor de uma política de inclusão não o iguala ao nazismo, mas revela que pertence à mesma família política.
Nesse diálogo, lembro também apenas que não podemos seguir o caminho dos adversários e excluí-los da humanidade porque seu coração secou. Isso não significa que devamos deixar de responsabilizar essas ideias quando se apresentam numa visão de pandemia que acabou contribuindo para a morte de milhares de pessoas.
Sei que é difícil explicar que um governo com vontade de exclusão tenha apoio de muitos grupos religiosos. Mas essa contradição, trabalho num outro momento.
Não só pela empatia, como pela própria eficácia, a política de inclusão deve seguir sendo nosso horizonte na vida social. Sigamos em frente. Eles não querem o inclusivismo, não queremos o exclusivismo. Estamos empatados. Veremos adiante para quem a História sorrirá.
Um robusto PARABÉNS pelo artigo, F. Gabeira! Beligerancias distintas: a dos mais fortes, pela água que mata a sede de sua família, de seu gado, de sua roça. A dos mais fracos e nocivos, para ameaçar a democracia e, expor-nos a toda sorte de intemperies, social, físico e, familiar .
Muito obriy.
talvez esteja na hora de revermos o que vimos chamando de negacionismo. eles não negam, apenas não se importam. 600.000 mortos? eles sabem disso, só não estão nem aí, é a vida. o povo está passando fome? eles também sabem disso, só que acham que mesmo assim esse povo não deve comprar feijão, mas fuzis. Inclusão de deficientes que atrapalham? talvez incluí-los dentro de um ônibus com o cano de descarga virado para dentro, para matá-los por intoxicação por CO2 (já foi feito, a gente sabe – e se não forem detidos vão chegar lá).
São psicopatas, desprovidos de empatia e culpa. Sabem muito bem o que é considerado certo e errado pelo consenso da sociedade. Se isso não corresponde às suas vontades, azar.
são felizes assim, acham que estão sempre certos, e nem lhes passa pela cabeça mudar. não há possibilidade de conversar, negociar, acordar. Acordar só em outro sentido, o de acordarmos enquanto é tempo.