O AI-5 do Século 21. Por Edmilson Siqueira
O AI-5 do século 21
Edmilson Siqueira
… a ação de Toffoli, primeiro instaurando um processo sem objeto definido, criando uma espécie de salvaguarda total para quem não pode tê-la (todo cidadão é igual perante a lei) e, depois, fazendo uso dessa espécie de AI-5 do século 21, para tentar calar uma imprensa…
O autoritário e despropositado ato da dupla Toffoli/Moraes conseguiu várias proezas. A principal é fazer chegar a milhões de leitores a reportagem que estava restrita aos assinantes da Crusoé, que não são poucos, mas, com certeza, menos dos que tiveram acesso ao texto após o ato, pois o mesmo acabou sendo compartilhado na íntegra nas redes sociais e toda a grande imprensa, ao noticiar a tentativa de intimidação da revista, reproduziu suas informações essenciais. Agora, o Brasil inteiro sabe o apelido de Toffoli no âmbito da Odebrecht e, claro, todo mundo sabe também que os apelidos dados pela empreiteira visavam a esconder alguma coisa. Na maioria das vezes, eram destinatários de propina, mas não há qualquer referência nesse sentido, na reportagem da revista, destinada ao então advogado geral da União do governo do PT.
Outro fato foi o STF, onde alguns membros se arvoram em querer ser os condutores e juízes da política e das operações contra corrupção no Brasil – o que não é, evidentemente, o seu papel – se tornar uma espécie de inimigo público Número Um das liberdades democráticas. Logo ele, que deveria ser o defensor dessas liberdades e da Constituição, garantidora do estado de Direito.
… Se o Brasil não conseguir afastar essa sanha ditatorial que ora se pronuncia a partir justamente do poder que deveria moderar e até impedir qualquer ato desse tipo, os horizontes podem se encher de nuvens negras prenunciando uma era de trevas.
Entidades, ligadas ou não ao exercício do Direito, têm se pronunciado condenando veementemente o ato dos ministros do STF; partidos políticos estão se posicionando firmemente a favor da liberdade de expressão, de imprensa e contra a tentativa de censura e intimidação aos jornalistas; ações estão sendo propostas por políticos de várias legendas no sentido de reverter a situação, tornando réus, ou pelo menos tentando barrar a sanha totalitária deles, que parecem estar abusando do poder que dispõem e usando-o de forma a conspurcar direitos, garantias e liberdades que constituem cláusulas pétreas da Constituição.
Só essas duas proezas já são mais que suficientes para concluir que a ação de Toffoli, primeiro instaurando um processo sem objeto definido, criando uma espécie de salvaguarda total para quem não pode tê-la (todo cidadão é igual perante a lei) e, depois, fazendo uso dessa espécie de AI-5 do século 21, para tentar calar uma imprensa que, na sua curta existência, já se tornou exemplo de correção, honestidade, coragem e qualidade no que produz e que tem milhões de leitores, frutos dessa preocupação em fazer Jornalismo como poucos no Brasil, foi um enorme tiro no pé que expõe o próprio tribunal a um vexame histórico com repercussões até além de nossas fronteiras.
Resta agora que o norte democrático que o Brasil precisa manter se quiser se tornar uma nação próspera e justa se sobreponha sobre as tentativas autoritárias que, depois de alguns esbirros petistas, julgávamos enterradas sob os ventos mais amenos que sopraram após a última eleição.
Se o Brasil não conseguir afastar essa sanha ditatorial que ora se pronuncia a partir justamente do poder que deveria moderar e até impedir qualquer ato desse tipo, os horizontes podem se encher de nuvens negras prenunciando uma era de trevas.
Não é o que o povo brasileiro merece.
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Edmilson Siqueira é jornalista