Hawilla, o menino pobre que ficou milionário. Coluna Mario Marinho – EXTRA!
EXTRA
Hawilla, o menino pobre que ficou milionário
COLUNA MÁRIO MARINHO
Conheci J. Hawilla em 1968 quando ele era repórter de campo da rádio e da TV Bandeirantes e tinha um Fusquinha vermelho.
Mais de 30 anos depois, prestei serviços de Assessoria de Imprensa à Traffic e até dirigi a sala de Imprensa da Copa da América de 2000, na Colômbia.
Conheci bem o Hawilla e a sua história.
Chamado de Jotinha pelos mais chegados, José Hawilla nasceu em Rio Preto, onde começou os primeiros contatos com o esporte e o rádio.
No começo dos anos 60, se mudou para São Paulo e pouco depois começou a trabalhar na rádio Bandeirantes. Um pouco mais adiante, também na TV.
Na TV Globo, anos depois passou de repórter a apresentador do Globo Esporte.
Em 1979 aderiu à greve dos jornalistas e acabou demitido. Vinte anos depois, ele me dizia.
– Tenho que agradecer ao Juca Kfouri que comandou aquela greve maluca: eu aderi, fui demitido e vi o quanto instável era nossa profissão.
Com o dinheiro da indenização Hawilla montou uma rede de carrinhos que vendia cachorro quente. Ele mesmo dirigia o caminhãozinho que levava os carrinhos aos seus pontos.
Era muito trabalho e pouco lucro.
Foi nessa época que conheceu a Traffic, empresa que comercializava placas de publicidade nos pontos de ônibus.
– Ela estava à beira da falência. Entrei como sócio, mantive a sociedade durante algum tempo, depois comprei a parte do meu sócio.
Dos pontos de ônibus, Hawilla vislumbrou um negócio chamado marketing esportivo que praticamente não existia no Brasil. Naquela época, as placas de publicidade nos campos eram cedidas a troco de material esportivo, a almoços e jantares, enfim, sem nenhum profissionalismo.
Hawilla viu grandes possibilidades e caiu de cabeça no negócio.
Em 1987, Hawilla tinha sob o seu domínio o comércio de placas nos 26 dos principais estádios de futebol do Brasil.
O segredo do negócio era simples. Ele comprava o espaço e pagava aos donos dos estádios uma quantia fixa, independente de vender o não as placas. Ou seja: os times passaram a ter uma renda fixa e certa.
Foi também nessa época que Hawilla entrou nos negócios dos direitos de transmissão televisados de jogos de futebol.
Seu primeiro grande negócio foi a Copa América que ele não só comprou da Conmebol como deu novo formato de disputa à competição que persiste até hoje.
Em 1989, ele levou para a CBF o primeiro patrocinador oficial e profissional para a Seleção Brasileira: a Pepsi Cola.
A subida, às vezes vertiginosa, não parou. A Traffic estendeu seus braços às Américas do Norte e Central. Chegou também à Europa.
No final dos anos 90, levou para a CBF a Nike com patrocínio milionário.
Com a perda da Copa do Mundo em 1998, instaurou-se no Brasil um sentimento de revolta e de busca dos culpados.
Criou-se a CPI da Nike que deveria encontrar culpados pela derrota na França e esmiuçar o contrato da fabricante de material esportivo com a CBF.
Hawilla foi chamado a depor na CPI.
Apresentou todos os documentos e até mesmo a declaração de imposto de renda. Tomou-se conhecimento, então, que J. Hawilla foi o segundo maior pagador de imposto de renda naquele ano. Com 11 milhões de reais pagos ao Leão, ele ficou atrás apenas de Silvio Santos.
Explica-se tamanho imposto de renda: naquele ano, Hawilla havia vendido 49% da Traffic para a norte-americana Hiks Muse.
Parceria que foi desfeita algum tempo depois.
Hawilla comprou o Diário de S. Paulo, mas ficou com ele pouco tempo por não conseguir fazer o jornal dar lucro.
Em Rio Preto fundou o jornal impresso Bom Dia Rio Preto que deveria se transformar numa cadeia de jornais que abrangeria todo o interior de São Paulo.
Na mesma época, fundou a TV Tem, afiliada da Globo (que detém 10% das ações) e, com sede em Rio Preto, cobre cerca de 300 municípios do rico interior paulista.
Assim, Hawilla tornou-se um miliardário empresário do ramo da comunicação e do esporte.
Até que no final de 2013 ele foi denunciado ao FBI por lavagem de dinheiro, corrupção e obstrução da Justiça.
Claro que não há que se falar em injustiça cometida contra Hawilla, já que ele é réu confesso e concordou em pagar multa de 150 milhões de dólares à Justiça norte-americana. Não apenas isso, como também vem colaborando nas investigações num esquema de delação premiada.
O menino pobre de Rio Preto ficou rico, muito rico. Tão rico que achou que não tinha limites.
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Escrevi essa coluna no dia 06/05/2015, em meu antigo blog
http://mariomarinho.blog.uol.com.br/
J Hawilla morreu ontem, sexta-feira, 25/05/2018, em São Paulo, ao 74 anos, em decorrência de complicações respiratórias.
A última vez que falei com ele foi há quase um ano, no mês de agosto, quando ele cumpria pena de prisão domiciliar nos Estados Unidos.
Ele me disse que tinha esperanças de voltar ao Brasil no mês de outubro.
– Não vejo a hora, disse-me ele.
Na época, contou-me também que o jornalista Carlos Maranhão o estava entrevistando para publicar sua biografia. Não sei se o Maranhão teve tempo de concluir sua tarefa.
Hawilla deixou três filhos e seis netos.
Republico esse texto em homenagem ao profissional que conheci. Também como homenagem e solidariedade à sua família.
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Mario Marinho – É jornalista. Especializado em jornalismo esportivo, foi durante muitos anos Editor de Esportes do Jornal da Tarde. Entre outros locais, Marinho trabalhou também no Estadão, em revistas da Editora Abril, nas rádios e TVs Gazeta e Record, na TV Bandeirantes, na TV Cultura, além de participação em inúmeros livros e revistas do setor esportivo.
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