Anais da imbecilidade – hors concours

Ainda outra dica de um outro amigo. Quem for checar a apresentação do nosso bravo ministro vai achar a seguinte afirmação: “IPCA acumulado em 12 meses estaria em 4,76% sem combustíveis e alimentos”

Eu já explorei esta questão aqui e não vou aborrecê-los com este assunto novamente (mentira minha, como vocês sabem: até parece que algum dia eu vou poupá-los das minhas obsessões). O legal da história é o seguinte.

Para chegar a este número, quem quer que seja que tenha montado esta apresentação simplesmente deduziu da inflação cheia a contribuição de alimentação no domicílio (isto é, a inflação de alimentação multiplicada pelo seu peso) e a contribuição dos combustíveis. Se P é a inflação cheia, a conta foi:

Px = P – (Alimentação x peso alimentação) – (Combustíveis x peso combustíveis)

Ou seja, produziu um índice cuja soma dos pesos não alcança 100% (fica perto de 80%). A forma correta entre economistas alfabetizados requer que o índice acima seja reponderado (isto é,  dividido por aproximadamente 0,80 no caso) para que os pesos voltem a somar 100%. Matematicamente:

Pxx  = Px/(100% –  peso alimentação – peso combustíveis)

Esta medida mostra quanto subiram, em média, os demais preços da economia. A média ponderada destes preços, combustíveis e alimentos deve gerar o IPCA.

Além da barbaridade acima descrita, alguém se esqueceu de avisar que a inflação obedece às regras da juro composto (isto é, se os preços sobem 10% num mês e 10% no mês seguinte, os 10% do segundo mês incidem sobre o que ocorreu no primeiro). De fato, se somarmos o índice mensal (errado) calculado pela Fazenda, achamos 4,76% nos últimos 12 meses. Se acumularmos como se deve, já chegaria a 4,86%.

Enfim, usando o índice correto e geometricamente acumulado calculamos que a inflação em 12 meses sem alimentos e combustíveis está em… 6,08%! (Até março; se usarmos o IPCA-15 de abril vai a 6,19%).  A inflação cheia até março era 6,30%…

Abaixo está a decomposição da contribuição da inflação preparada pela Fazenda.

E no slide seguinte a brilhante conclusão (quem somar as barras irá encontrar 4,76% nos últimos 12 meses)

Que os conhecimentos de Economia são parcos, a gente já sabia. Mas que não sabem sequer calcular uma média ponderada, bom, é quase uma surpresa.

24 thoughts on “Anais da imbecilidade – hors concours

  1. O jogo já mudou desde o segundo mandato do Lula, havia um saldo de ortodoxia no BC mas o Meirelles não era lá muito confiável, pois por mais de uma vez tomou decisões políticas e não técnicas, mas o mercado fazia vista grossa. Agora chora neném…

    M.

  2. Realmente, caso fossem excluídos os setores de alimentos e transportes, a inflação em doze meses seria de mais de 6%, boa sacada. Já tinha pensado nisso em outras afirmações dessa natureza. Talvez o slide quisesse dizer – e está mal escrito – que a inflação geral seria menor que 5% caso fosse zero a inflação de alimentos e transportes. Ou seja, caso continuasse a se incluir os setores de alimentos e transportes, mas com inflação zero para eles. Nesse caso, não se mudaria a média ponderada, né? Penso que muita gente, principalmente do Governo, tem trabalhado com esse raciocínio, que é diferente, mas não é errado.

  3. Só não entendi a frase "A forma correta entre economistas alfabetizados requer que o índice acima seja reponderado (isto é, dividido por aproximadamente 0,80 no caso) para que os pesos voltem a somar 100%." Existe economista alfabetizado?

  4. Sarneyrização do governo à vista. Como funciona? Faz voto de fé na estabilidade econômica e, "por descuido ou fantasia", por incompetência ou achismo, deixa a vaca ir pro brejo. Depois… chamam o Bresser…

  5. Que tal tambem colocarmos nos anais da imbecilidade o economista autor de certo estudo que provava que a politica fiscal do Serra no governo de SP era pior que a do Governo Lula ?
    Foi apenas um equivoco ou problema de alfabetização econõmica?

  6. Me faltou tempo para postar, mas a imagem ficou muito boa!

    Alex, se você continuar expondo nosso ministro assim, ele não passa do 1S…

    The Anchor

  7. Situação 1
    ———————————–
    Inflação Peso Ponderação
    ———————————–
    5 0,278 1,389
    6 0,333 2,000
    2 0,111 0,222
    5 0,278 1,389
    ———————————–
    18 1,000 5,000
    ———————————–

    Situação 2
    ———————————–
    Inflação Peso Ponderação
    ———————————–
    0 – –
    0 – –
    2 0,286 0,571
    5 0,714 3,571
    ———————————–
    7 1,000 4,143
    ———————————–

    Situação forçada porque improvável. Entretanto o raciocínio mantegão está correto.

  8. e eu achando que o analfabeto tinha saido do governo…

    nao saber fazer as 4 operacoes eh demais.
    (nao ver que o peso somado de cada componente do indice nao da 100% eh dose).

    esse Pombini tem PhD mesmo?

  9. Agora fiquei tranquilo com o controle da inflação feito pelo BC.
    Com inflação acelerando o presidente do BC recomenda postergação de consumo (?).
    O glorioso Mantega já pediu aos empresários pra não subirem os preços. Piada.
    Com essa política econômica estamos bem arranjados, talvez nem as NTN-Bs aguentem tanto desaforo.

  10. É o controle da inflação pela teoria do megafone de feira: a) srs. empresários, não subam os preços!!!; b) srs. consumidores, ao invés de gastar, poupem!!! c) vocês foram uns idiotas em acreditar na gente!!!

  11. Mais claro, só se cantasse:

    "É o bonde do Mantegão sem freio,
    tô sem freio, tô sem freio.

    A inflação está sem freio,
    tá sem freio, tá sem freio".

  12. + Fluxo de capital > Maior oferta de crédito > Menor juro no mercado > Aumenta demanda > Maior inflação

    entretanto, o fluxo de capital tambem aprecia a taxa de cambio, reduzindo a inflação

    qual força prevalece?

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