Escritura pública: para quê serve? Por Ivone Zeger
Escritura pública: para quê serve?
Por Ivone Zeger
… Comprar, juntar, separar, partilhar, inventariar: as escrituras têm mil e uma utilidades…
No mundo jurídico, há nomes e documentos que todo mundo conhece. Mas poucos sabem exatamente o que significam ou para quê servem. “Escritura pública”, por exemplo, é denominação de um desses documentos que certamente você já ouviu falar ou até já assinou. Mas o que ela representa?
A Escritura Pública é a interpretação, no papel e de acordo com os preceitos da lei, de um ato ou negócio jurídico, escrito por um tabelião, a pedido das pessoas interessadas e que deve conter, justamente, a assinatura dessas pessoas. A responsabilidade formal e legal de se “lavrar” – ou seja, elaborar -, a escritura pública é do tabelião.
O trabalho do tabelião não é somente escrever um documento. Primeiramente, ele se acerca da legalidade da negociação a ser feita; posteriormente identifica as pessoas – por meio dos documentos pessoais tais como carteira de identidade, CPF, e outras certidões necessárias, de acordo com o objetivo da escritura –, avalia a capacidade civil das pessoas envolvidas e “lavra” de tal modo que o documento seja fiel à vontade dos envolvidos na questão.
Há uma infinidade de escrituras, para as mais variadas finalidades. Entre elas, destaco a escritura de Cessão de Direitos Hereditários; Inventário e Partilha de Bens, Reconhecimento de Paternidade; escritura de Declaração de União Estável, escritura de Divórcio, de Inventário e Partilha de Bens e para realizar o Pacto Antenupcial. Sobre inventários e partilha de bens, assim como os divórcios, podem ser realizados também pela via judicial. A via notarial, como se diz quando se opta pela escritura, que será realizada em cartório eleito pelas partes, pode não ser possível em alguns casos, como veremos a seguir.
As duas primeiras escrituras da lista que destaco acima, como os próprios nomes indicam, estão estreitamente vinculadas a questões sucessórias. A Escritura de Cessão de Direitos Hereditários pode ser realizada nos casos em que um ou mais herdeiros pretendem doar seus direitos sucessórios em favor de um outro herdeiro, dentro do mesmo inventário. Escrituras de inventário e partilha de bens podem ser realizadas no tabelião, sem processo judicial, quando o falecido não deixou testamento e quando “as partes” são maiores, capazes e estão totalmente de acordo. Assim, pela via notarial, resolve-se a partilha com mais rapidez e a um custo frequentemente mais acessível.
Lembrando ainda: não há o que a lei chama de “competência territorial”, ou seja, nos casos de partilhas e inventários, as escrituras não precisam ser lavradas necessariamente na mesma cidade em que houve o falecimento e nos casos de divórcio, realizados em cartório, também seguem o mesmo procedimento.
Para além de ser a prova de uma negociação ou transmissão de bens, a escritura pública também se destina a comprovar atos da vida civil. Entre elas está a escritura de Reconhecimento de Paternidade que, como o próprio nome revela, é o documento que propiciará a alteração no registro de nascimento do filho menor ou maior, que requereu, através de provas e ou exame de DNA, o reconhecimento da filiação.
Na escritura de Declaração de União Estável, também realizada pelo tabelião, as pessoas declaram sua convivência pública contínua e duradoura com o objetivo de constituir família. É com esse documento que o casal pode, por exemplo, comprar um imóvel financiado, um pode colocar o outro como dependente em planos de saúde, associações como clubes, previdência social, entre outros. Essa escritura pode ser feita a qualquer tempo, quando o casal julgar necessário e nela constam tanto a data do dia em que foi lavrada, quanto o tempo que o casal declara que está convivendo. Também se estabelece a partir daí o regime de bens que será adotado.
Com relação ao divórcio consensual – portanto, como o próprio nome mesmo diz, quando os dois cônjuges estão de acordo com aquilo que pretendem estabelecer – pode ser realizado por meio de escritura pública. No entanto, para fazer uso desse instrumento bastante facilitador, a lei determina que, no caso de haver filhos do casal, que não sejam menores ou incapazes. Nessa escritura, constará a descrição e a partilha dos bens comuns, se eles existirem. Também, se for o caso, será estabelecida a pensão alimentícia e a cláusula acerca da retomada do nome de solteiro ou a manutenção do nome que foi adotado a partir do casamento.
Se há restrições quanto a se lançar mão das escrituras públicas nos processos de separação e divórcio, com o pacto antenupcial é o contrário: por força da lei, ele deve ser feito no tabelionato, por meio de escritura pública e após o casamento deve ser encaminhada ao Registro de Imóveis da 1ª residência do casal. Na escritura, constam as determinações do futuro casal quanto ao regime de bens e outras cláusulas que julgarem necessárias. O pacto só se faz necessário quando o regime adotado não é o de comunhão parcial de bens.
As escrituras públicas de divórcio e inventário são obrigatoriamente acompanhadas por advogados que devem comparecer por ocasião da assinatura do ato. Os demais atos mesmo sendo elaborados por profissionais tabeliães altamente qualificados podem, se assim desejarem as partes, ser assessorados por advogados de sua confiança. De forma geral, elas são realizadas com rapidez e especialmente nos casos de divórcio, inventário e partilha de bens, o procedimento, denominado também de extrajudicial, têm facilitado muito a vida das pessoas.
E agora você deve estar se perguntando: e a escritura de Compra e Venda de Imóveis, a tão comemorada “escritura definitiva” da casa própria?
É justamente esse o assunto do próximo artigo.
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Ivone Zeger é advogada especialista em Direito de Família e Sucessão. Membro efetivo da Comissão de Direito de Família da OAB/SP é autora dos livros “Herança: Perguntas e Respostas”, “Família: Perguntas e Respostas” e “Direito LGBTI: Perguntas e Respostas – da Mescla Editorial www.ivonezeger.com.br