A outra goleada

No primeiro semestre
deste ano a produção industrial brasileira caiu pouco mais de 2,5% segundo
dados divulgados pelo IBGE e o consenso dos analistas aponta para queda
superior a 1% em 2014 (acredito que será pior, mas fiquemos com o consenso). Dado
este desempenho, o crescimento do PIB este ano talvez não chegue a 1%,
implicando expansão média no período 2011-2014 inferior a 2% a.a., a mais fraca
em um quadriênio desde 1999.
A resposta oficial aponta
para a conjuntura internacional como a responsável. Recentemente, por exemplo,
a presidente admitiu ter “minimizado
os efeitos da crise externa sobre a economia brasileira
”, ao
atribuir a ela a culpa pelo crescimento medíocre durante sua gestão.
Parece um bom
argumento, exceto, é claro, por não fazer qualquer sentido à luz dos números
disponíveis. A valerem as projeções do FMI para a economia global este ano
(crescimento de 3,4%), a média da expansão do PIB mundial nos últimos 4 anos aceleraria
a 3,3% a.a., comparado a 3,0% a.a. observado no quadriênio anterior. Por outro
lado, o desempenho nacional revelaria desaceleração expressiva no mesmo período,
de 4,5% a.a. para 1,8% a.a..
Posto de forma mais
delicada, apenas um exercício delirante de imaginação poderia atribuir a piora
do desempenho brasileiro à conjuntura internacional, que, longe de ser
brilhante, apresentou melhora modesta, embora visível, no mesmo período. Não
bastasse isto, a diferença entre o crescimento mundial e o nosso (1,5 ponto percentual)
é a maior em pelo menos 12 anos, outro recorde a se somar à maior goleada
sofrida pelo país.

O caso pode ser
ilustrado em maior detalhe pelo gráfico que compara a produção industrial brasileira
à mundial. Como se vê, a indústria nacional seguiu sua contraparte global até o
final de 2010, em que pesem alguns desvios pontuais, refletindo momentos de crescimento
um tanto mais forte ou mais fraco.
Em particular, é aparente
a recuperação mais rápida do país em seguida à crise de 2008-2009, pois demoramos
apenas 2 anos para atingir o pico anterior (de outubro de 2008 a outubro de
2010), enquanto a indústria global precisou de quase 3 anos para isto.
No entanto, a partir de
2011 o Brasil “andou de lado”, situação que ainda perdura: nos 12 meses
terminados em maio deste ano a produção nacional era 1% inferior à registrada
em 2010 e indistinguível do pico que antecedeu à crise. Já a produção global no
mesmo período era 10% superior à observada em 2010 e cerca de 7% maior que o
pico pré-crise.
Qualquer que seja a métrica
adotada, a verdade é que o mundo, mesmo combalido, não só cresceu bem mais que
o Brasil, mas também o fez a uma diferença de velocidade jamais vista na história
deste país.
Por tudo que foi dito,
deve ficar claro que a origem do problema de baixo crescimento tem raízes
locais. Da forma como entendo a questão relaciona-se essencialmente ao aumento
dos salários muito à frente da expansão insignificante da produtividade, em
particular no setor manufatureiro.
Ao contrário do que
ocorre no caso dos serviços, este aumento do custo do trabalho encontra
dificuldades de repasse para preços em face da concorrência externa. Assim, as
margens industriais se contraem, limitando a expansão do setor, ao mesmo tempo em
que a inflação de serviços segue vigorosa (acima de 9% nos 12 meses até junho).
A nota curiosa da
desculpa (esfarrapada) para o baixo crescimento é que seus autores não parecem
ter notado que, se fosse verdadeira, implicaria concluir que a aceleração
observada no período 2004-2010 também resultaria do mundo mais forte, e não de
méritos do governo de plantão. Não sei se o presidente Lula se deu conta da crítica
de seus aliados a seu desempenho à frente do país. Provavelmente não, mas, em
nome da verdade, seria bom alertá-los para achar uma justificativa mais sólida
para o desempenho lamentável dos últimos anos.
(Publicado 6/Ago/2014)

15 thoughts on “A outra goleada

  1. Alex, vi atualmente que há um debate em torno de quais países poderiam ser comparados com o Brasil em termos de desempenho econômico. Do seu ponto de vista, quais seriam os países "mais comparáveis" ao Brasil?

  2. Esse link acima (brasildebate) merece um post detalhado do O. É uma das analises mais lixo que ja pude ver ao longo da minha carreira como economista. Os caras mostram um unico dado (escolhido a dedo e, por sinal, ruim), adicionam paragrafos e paragrafos de bla bla bla e concluem (cientificamente) que o os ultimos governos foram fantasticos!!!

  3. Bom dia Alexandre!
    Ainda nao creio que eles acreditem no que falam. Creio que eles querem que seus aliados e eleitores acreditem. Se ha quem acreditam sao histericos. O histérico vive em um mundo fictício composto inteiramente de autopersuasão.

  4. Simples estatísitcas como essa é que me encorajam a continuar a acreditar em alguns, poucos, muito poucos economistas brasileiros. Parabéns !!

    Aproveitando a oportunidade, sugiro que vejam essa entrevista (e embate a partir dos 30min) do economista Thomas Sowell, em 1980(!!!) na qual ele desmascara tudo o que a ortodoxia de pesquisa economica prega.

    https://www.youtube.com/watch?v=Y021WAdUlW8

    Precisamos de mais pesquisas sem viés; precisamos de mais ecomistas sérios na TV e em programas de rádio. Precisamos nos tornar um povo que aprecie a evidencia empírica em detrimento de teorias vazias e vontades intelecualmente desonestas de burocrátas esquerdistas.

  5. Quanto mais estudamos economia e nos inteiramos da situação do nosso país, menos esperança temos em alguma mudança.

    É triste testemunhar uma argumentação política tão rasteira, amparada por uma população incapaz de interpretar os fatos e, consequentemente, à mercê de discursos e ações populistas. Infelizmente isso não é exclusividade do governo atual, o Brasil sempre foi assim, e tudo indica que ainda será por um bom tempo.

    Enquanto o povo não mudar e evoluir, pode entrar o governo que for e o resultado será sempre o mesmo: A exploração abusiva de povo submisso.

  6. Sr. Alex,

    O gráfico mostra:

    1- Faz quase 3 anos, a produção industrial está abaixo do máximo obtido em Jul/2011.

    2- Uma diminuição da produção entre Jul/2001 e Out/2012.

    Este dois fatos empíricos não vão contra a sua tese de restrição de oferta.

    Abs,

  7. O artigo do site 'Brasil Debate' é equivocado. A base do argumento é um gráfico, que joga na conta do período liberal os dois primeiros anos do governo Collor, mas retira o período até o início do segundo mandato do governo Lula, em que boa parte da política econômica foi mantida e desmantelada sob o pretexto da crise de 2008.
    Assim eles inflam o gráfico ao mudar o período base de acordo com a conveniência.

    Eles usaram dados do FMI, que estão neste link (World Economic Outlook) e lá você pode ver que em poucos momentos o Brasil teve desempenho melhor que a economia mundial ou mesmo dos países emergentes.

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