Conectadas, “startups” suprapartidárias prometem viralizar a política. Por Aylê-Salassié F. Quintão*
Conectadas, “startups” suprapartidárias prometem viralizar a política
Por Aylê-Salassié F. Quintão*
Houve tempo em que empresário falar com o Presidente da República era fato inédito. Tornou-se rotina no Palácio do Planalto.
São mais de 150 pequenas iniciativas entre comitês, associações, start ups políticas, movimentos de rua e cidadãos conectados na internet com 4 a 5 mil seguidores. Esses grupos, surgidos espontaneamente na sociedade civil, em diversos lugares no Brasil, reúnem, em pequenos encontros presenciais ou pela internet, pessoas com idade de até 40 anos, para discutir pautas sociais e econômicas inovadoras. Organizados viralmente, é muito provável que irão desembocar nas eleições de 2018, com preocupações bem mais próximas da realidade do que as dos 35 partidos em atividade e dos 60 que tentam registro no Tribunal Superior Eleitoral.
Voltados para o futuro e identificados como suprapartidários, esses grupos ignoram os partidos convencionais e os políticos. Os citados na Lava Jato são desprezados pelos jovens eleitores, que representam o mundo de maneira muito diferente daquelas veiculadas nos discursos ainda hegemônicos. Reverbera entre essas gerações a afirmação do patriarca Emílio Odebrecht de que “a compra de políticos é uma prática institucionalizada há mais de trinta anos no Brasil”. E a de que “Não há um político nesse País que não tenha se beneficiado do Caixa Dois”, visto como dinheiro espúrio que financia a permanência eterna das castas familiares no Poder, instrumento de enriquecimento ilícito e da concentração da riqueza.
Ao invés de ajudar o desenvolvimento do País, os políticos tem imobilizado a gestão do Estado com as ramificações dos seus interesses no campo privado.
A prática banalizou a saudável representação democrática da cidadania, de tal maneira que mais de 80 mil indivíduos apresentam-se nas eleições para concorrer aos milhares de cargos em disputa. ”Político” passou a ser visto como uma profissão rentável, tão atraente que só no pleito municipal de 2016, 48.085 prefeitos, vice-prefeitos e vereadores tentaram a reeleição, número que, segundo o TSE, representa um acréscimo de aproximadamente 418% em relação ao de 2012.
Ao invés de ajudar o desenvolvimento do País, os políticos tem imobilizado a gestão do Estado com as ramificações dos seus interesses no campo privado. Dentro do orçamento da União está embutida a destinação de perto de dez bilhões para serem aplicados diretamente pelos 594 deputados e senadores em seus projetos pessoais locais e regionais, sob a forma de emendas ao Orçamento Federal. É dinheiro que alimenta as trocas de favores dentro dos estados e municípios. Aparece diluído em pequenas rubricas, e terminam tornando mesmo invisíveis à “vista grossa” dos tribunais de contas.
Correndo fora dessa raia, vem aí o que foi chamado por um jornal paulista de startups políticas suprapartidárias, pequenos grupos da sociedade civil, que tomam a iniciativa de se reunir em torno dos interesses públicos para, na ausência do Estado, desenvolverem projetos locais. São diferentes das velhas ONGS…
O país tem hoje 35 partidos políticos registrados no TSE, e mais 60 pedindo o reconhecimento. Tudo recebendo ou pretendendo desfrutar também do dinheiro público. A exceção de dois ou três, nenhum deles tem claramente explicitada sua visão de mundo, seu programa partidário e um projeto para o Brasil. Flutuam confusamente conforme as conveniências. Tem partido dos aposentados, da mulher, dos militares, da solidariedade. No Parlamento engrossam espertamente bancadas também chamadas de suprapartidárias. Somados, os legislativos brasileiros – o Congresso, as 27 assembleias e as 5.500 câmaras de vereadores – custam anualmente ao País cerca de R$ 20 bilhões, correspondendo ao consumo de 13,9 milhões de famílias da classe C .
Há quem afirme que o desenvolvimento brasileiro nunca passou mesmo pelos partidos, e que ele advém milagrosamente da troca constante de oportunidades e privilégios entre os grandes empreendedores, o que acontece muito longe das urnas e dos espaços institucionais. No Congresso aprovam-se medidas discricionárias, que estimulam as aventuras na área privada. A ponto de o empresário Marcelo Odebrecht admitir, segundo seus críticos, que “Eu sou o Estado”. Houve tempo em que empresário falar com o Presidente da República era fato inédito. Tornou-se rotina no Palácio do Planalto.
O país tem hoje 35 partidos políticos registrados no TSE, e mais 60 pedindo o reconhecimento. Tudo recebendo ou pretendendo desfrutar também do dinheiro público
Correndo fora dessa raia, vem aí o que foi chamado por um jornal paulista de startups políticas suprapartidárias, pequenos grupos da sociedade civil, que tomam a iniciativa de se reunir em torno dos interesses públicos para, na ausência do Estado, desenvolverem projetos locais. São diferentes das velhas ONGS, que chegaram a ter 300 mil espalhadas pelo País sobrevivendo, a maioria, com dinheiro público. Cooptadas para a política, perderam muito da sua expressão transformadora.
A expressão startup é usada para indicar o aparecimento de empreendedores políticos novos e originais, um grande número deles de base digital. Inspiram-se nas mobilizações de rua, e pregam a reforma política, o Estado mínimo, até a legalização da maconha. Não tem propriamente ideologias. São conduzidas por teses genéricas, apelos e estigmas panfletários: “Quero Prévias”! “Acredito!”, “ Agora!” , “Nova Democracia”, etc…
Similarmente, aparecem ainda nesse cenário o MBL (Movimento Brasil Livre), que organizou nas ruas o impeachment; o Partido Novo, o Instituto Millennium da área de economia . Vem aí o “Pátria Livre”, de caráter nacionalista, o “Agora” defensor do equilíbrio entre o Estado e a iniciativa privada, e até o partido do Luciano Huck, publicitário apresentador de programas de televisão.
__________________________
Aylê-Salassié F. Quintão* – Jornalista, professor, doutor em História Cultural