barboooosa, o malandro. Por Alexandre Schwartsman
barboooosa, o malandro
Por Alexandre Schwartsman
Artigo publicado originalmente na Folha de S. Paulo, coluna do autor, edição de 19 de abril de 2017
Confesso que leio alguns (não todos) textos de nelson barbosa e até coisa bem pior, como, por exemplo, o manifesto de “intelectuais” brasileiros defendendo o retorno da Nova Matriz Econômica. Paro também para ver acidentes. Curiosidade mórbida, mas nada que exija tratamento psiquiátrico mais sério, quero acreditar.
Pois bem, o inesquecível ministro quer se defender após ter sido pego em flagrante contradição, ao criticar o contingenciamento de gastos proposto pelo atual governo, enquanto há cerca de um ano se vangloriava de ter perpetrado o “maior contingenciamento da história do país” em 2016 (não em 2015, como malandramente escreve). Aqui não há o que discutir: quem fez a afirmação foi ele; não eu. Viva com isso.
Malandragens à parte, barbosa quer nos convencer que a estabilidade da despesa em termos reais (isto é, deduzida a inflação) seria contracionista porque implicaria queda do gasto como proporção do PIB. É engraçado.
Em primeiro lugar porque, se o gasto do governo cresce mais do que a inflação, deveria ser óbvio que isto equivale a um consumo maior de bens e serviços reais, isto é, uma política de expansão da demanda.
Mas o engraçado mesmo é ler barbosa, um economista que acredita que R$ 100 adicionais de gasto aumentam o PIB em mais de R$ 100 (o tal “efeito multiplicador”), não perceber que, segundo sua própria teoria, se o gasto tivesse sucesso em elevar a demanda, teria necessariamente que cair relativamente ao PIB. Não entende sequer as consequências daquilo que professa…
Da mesma forma é curioso que barbosa em momento algum mencione a queda da taxa de juros, que se tornou possível depois da promessa de ajuste fiscal, na forma do teto para despesas públicas. Parece que para ele apenas o gasto público tem a capacidade de estimular o crescimento; por algum motivo misterioso, o juro mais baixo não teria este poder. Tal argumento poderia caber em economias que apresentem taxa de juros perto de zero, mas eu diria este não parece ser o caso do Brasil, certo?
Posto de outra forma, barbosa ignora toda literatura macroeconômica que sugere que a contração fiscal pode ser compensada (ou, no caso, mais do que compensada) pela redução da taxa de juros, desde que a taxa nominal de juros não se encontre próxima a zero. Deixa de lado também que o crescimento que resulta da combinação de austeridade fiscal e (consequente) juro mais baixo tende a ser mais forte do que o decorrente de gasto e juro mais elevados, precisamente porque o investimento privado é maior no primeiro caso, em resposta ao juro mais baixo. Já se a omissão é intencional ou não, não sei dizer.
Não vejo, para ser sincero, nenhum problema em mudar de ideia. barbosa poderia ter refletido melhor e concluído que contingenciamento é uma má política. Assim como poderia ter caído em si e notado que sua proposta de teto para o gasto público seria contracionista e negaria à população acesso a serviços indispensáveis. Ou ainda, depois de muita investigação, decidido que a proposta de reforma previdenciária não mereceria seu apoio.
Isso dito, suas bruscas mudanças de opinião parecem fortemente correlacionadas a fazer ou não parte do governo. A correlação pode, é claro, ser mero acaso, mas é bem mais provável que seja pura desonestidade.
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* ALEXANDRE SCHWARTSMAN – DOUTOR EM ECONOMIA PELA UNIVERSIDADE DA CALIFÓRNIA, BERKELEY, E EX-DIRETOR DE ASSUNTOS INTERNACIONAIS DO BANCO CENTRAL DO BRASIL É PROFESSOR DO INSPER E SÓCIO-DIRETOR DA SCHWARTSMAN & ASSOCIADOS
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(O Blog A MÃO VISÍVEL, de Alexandre Schwartsman, integra o Site Chumbo Gordo, no http://www.chumbogordo.com.br/categorias/a-mao-visivel/