As latrinas de Pio II. Por Marcelo Kahns
AS LATRINAS DE PIO II
por Marcelo Kahns
… Se para eleger um papa os cardeais se reuniam em latrinas, onde é que os nossos “cardeais” da política se reúnem em tempos mais democráticos?
Aeneas Sylvius Piccolomini, o humanista de Siena que se tornou o Papa Pio II, no século 15, descreve a eleição que o levou ao poder de uma maneira fria e sarcástica, que antecipa os tempos modernos:
“Os mais ricos e mais influentes membros do colegiado de cardeais convocavam os outros à sua presença. Procurando o papado para si mesmos ou para seus amigos, imploravam, faziam promessas, ameaçavam às vezes. Alguns deixavam toda a decência de lado, não se enrubesciam e pleiteavam em causa própria, afirmando que o papado era de seu direito. Entre eles estavam Guillaume, cardeal de Rouen; Pietro, cardeal de San Marco;Giovanni, cardeal de Pádua e nem o cardeal de Lerida negligenciou os seus interesses. Cada um tinha muito a dizer de si próprio.As rivalidades eram extraordinárias, as suas energias sem limites.Não descansavam durante o dia nem dormiam à noite…Um grande grupo de cardeais encontrava-se nas latrinas. Lá, como se fosse um lugar de encontro secreto e particular, urdiam um plano para eleger Guillaume papa…”
Pelo visto Guillaume não levou a eleição e sabe-se lá o que o nosso Piccolomini teve de fazer para ser eleito.
Isso é para mostrar que de lá para cá, mesmo antes de existir o que hoje chamamos de Brasil, as eleições já se davam de uma maneira, digamos, particular, onde o que valia mesmo, era suplantar o adversário com todos os golpes possíveis.
Se para eleger um papa os cardeais se reuniam em latrinas, onde é que os nossos “cardeais” da política se reúnem em tempos mais democráticos? O mau odor deveria chegar aos eleitores mas, por enquanto, tudo é apenas ao vivo e em cores.
Portanto continua valendo a máxima francesa :”plus ça change, plus ça reste le même”.
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(*) Marcelo Kahns, paulistano, é jornalista.