(ou A morte da perua). Por Marcelo Kahns

(ou A morte da perua)

(*) Marcelo Kahns

“Quando morrer quero que minhas cinzas sejam espalhadas no Shopping Iguatemi,
pois assim sei que minha filha e minhas netas virão me visitar”

(último desejo de uma perua paulistana)

Está passando desapercebido no Brasil, especialmente na maior cidade do interior do mundo, isto é, São Paulo, o cinquentenário de uma das maiores invenções do homem, desde que inventaram o iglu.

Trata-se nada mais do que o aniversário do “shopping center”, ou “shopping mall”, que este ano completa meio século de vida (parece quarenta, de tanto lifting , mas vamos deixar isso de lado).

Um belo dia, em 1954, um arquiteto americano, Taubman, talvez por não ter nada melhor para fazer, se inspirou em um antigo mercado de Isfahan – e seus belíssimos arcos e abobadas – terra dos famosos tapetes e da escola de miniaturas persas, para criar um centro de compras em um subúrbio de Minneapolis.

… E com isso vem a morte da cidade: quando se troca o espaço público pelo privado não existe mais a possibilidade de inter-relacionamento, de troca de informações, de novos conhecimentos.

E a proposta era essa mesma: reunir grandes e pequenas lojas para que o consumidor americano, que começava a deixar o centro das cidades, tivesse onde se abastecer. E não é que essa ideia, quando chega em solo paulistano, como a maior parte das ideias que aqui chegam, já vem errada da cabeça aos pés: o que era uma solução para os suburbanos americanos acabou caindo no agrado da elite econômica local e dos especuladores imobiliários.

E o resultado disso? O que todos conhecemos- a morte do comércio de rua, a degradação da malha urbana, o caos no trânsito e uma vida inteira passada entre os pisos de um imenso mercado. Existe toda uma geração brasileira que não sabe que existia vida antes do shopping; sem um shopping, as pessoas ficariam perdidas, sem saber se localizar.

E com isso vem a morte da cidade: quando se troca o espaço público pelo privado não existe mais a possibilidade de inter-relacionamento, de troca de informações, de novos conhecimentos.

Mas isso pouco importa, hoje em dia: quem nunca conheceu o que era isso, não sente falta. Tudo isso devemos ao sr. Taubman, que nunca iria imaginar que sua invenção fosse chegar ao sul do planeta, destruindo as cidades à sua volta.

Que tal uma estátua homenageando o sr. Taubman que, sem o saber, acabou por ajudar a destruir uma cidade que antes tinha até o seu charme e hoje é apenas desolação?

IMAGEM ABERTURA: SHOPPING CENTER IGUATEMI, DE SP, EM 1971

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(*) Marcelo Kahns, 55, paulistano, é jornalista.Resultado de imagem para Marcelo Kahns

 

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