Suzane e a herança de sangue. Por Ivone Zeger
Suzane e a herança de sangue
Por Ivone Zeger
No caso de Suzane, o que ocorreu foi a declaração de indignidade – que é o que acontece quando alguém é excluído da herança sem que isso seja feito por meio de testamento.
A notícia de que, por decisão judicial, Suzane von Richthofen, condenada a 39 anos e meio de prisão pelo assassinato dos pais Marísia e Manfred von Richthofen, não terá direito à herança do casal – avaliada em mais de R$ 10 milhões – deixou algumas dúvidas no ar. Quer dizer que ela foi deserdada? E porque demorou tanto tempo, se o crime foi cometido em 2002? E se ela já tivesse posto a mão no dinheiro, nesse ínterim?
Bem, vamos por partes. Sob o ponto de vista jurídico, Suzane não foi deserdada. Ela foi declarada indigna de receber a herança. É fácil entender a diferença entre uma coisa e outra. A deserdação só ocorre quando um herdeiro necessário – termo que se refere aos pais ou avós, filhos ou netos e cônjuge da pessoa cujo patrimônio será herdado – é excluído da herança por meio de testamento. Ou seja, é preciso que a pessoa deixe um testamento no qual estabelece que fulano e beltrano não receberão nada por tais e tais motivos. Mas, que fique bem claro: os “tais e tais” motivos não ficam “ao gosto do freguês”. Eles só serão válidos se estiverem de acordo com as causas de deserdação listadas pelo Código Civil.
Essas causas não se restringem apenas à situações mais graves, como tentativa de homicídio, por exemplo, mas também incluem os chamados crimes contra a honra – calúnia, injúria e difamação – cometidos não só contra o autor da herança, mas também contra seu cônjuge, companheiro ou companheira, pais e avós, filhos e netos. Contudo, convém lembrar que os motivos para a deserdação, citados em testamento, devem ser comprovados. Do contrário, existe a possibilidade de que a deserdação seja anulada pela justiça.
Mais um lembrete: motivos fúteis não são legalmente válidos. Certa vez, fui procurada por um rapaz dizendo que o pai ameaçou deserdá-lo porque ele era gay. Isso, no entanto, abre uma brecha para que a deserdação seja contestada. Afinal, preconceito não é motivo para deserdação – ainda bem!
No caso de Suzane, o que ocorreu foi a declaração de indignidade – que é o que acontece quando alguém é excluído da herança sem que isso seja feito por meio de testamento. A demora, da qual tantos cidadãos estão se queixando, ocorreu porque, em primeiro lugar, era necessário que a sentença fosse promulgada, o que só aconteceu em 2006. E em segundo lugar, porque esse processo não é automático. É necessário que outro herdeiro – no caso, o irmão de Suzane – ingresse com uma ação solicitando a exclusão. Segundo consta, o irmão de Suzane tentou desistir da Ação de Exclusão da irmã no meio do processo, mas acabou voltando atrás.
…A única herança que restou a Suzane é o sangue dos pais em suas mãos…