Posse do vice
POSSE DO VICE
Por JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO
( A História, contada por quem participou da História)
Abril de 1985. Fernando Lyra, saudades do amigo, chama para uma conversa reservada. “O Presidente Tancredo vai morrer e é preciso evitar confusão. Por favor, acerte como vão ser as formalidades de sua substituição por Sarney”. Fizemos reunião com o Consultor Jurídico do Ministério, Marcelo Cerqueira; o Chefe do Gabinete, Cristóvam Buarque; o assessor especial, Joaquim Falcão; o Procurador Geral da República, José Paulo Pertence; e, mais, algumas autoridades ligadas a Tancredo.
Expliquei a situação, em nome do Ministro. E sugeri cumprir a Constituição (de 1969). O Vice-Presidente sucede o Presidente (art. 77) e toma posse “em sessão no Congresso Nacional” (art. 76). Prestando seu compromisso. Não mais o de antes, como Vice. Agora, o de Presidente da República. Consenso. O roteiro foi entregue a cada um dos presentes.
… Perplexo, pedi ligassem para o dr. Afonso. Estava em Petrópolis. Fazendo a sesta. Falei com sua secretária, que se recusou a acordar o patrão. Disse que se tratava de assunto importante, para o país. Ela respondeu que mais importante era seu emprego. E desligou. Não havia jeito…
Morre Tancredo Neves. Um jornalista ligou, perguntando como seria a posse do Vice. Recitei o dito roteiro. Ele disse que não era essa a posição de Afonso Arinos – presidente da Comissão que, logo depois, redigiria o projeto da Constituinte. E que dr. Afonso falava por Sarney. Segundo ele, o Presidente já havia tomado posse. Nada mais precisaria ser feito. Perplexo, pedi ligassem para o dr. Afonso. Estava em Petrópolis. Fazendo a sesta. Falei com sua secretária, que se recusou a acordar o patrão. Disse que se tratava de assunto importante, para o país. Ela respondeu que mais importante era seu emprego. E desligou. Não havia jeito. Solicitei, à Polícia Federal, subir a serra para acordar o homem. E, à secretária do Ministério, que ligasse a cada 5 minutos. Ele acordou antes que a Federal chegasse, ainda bem.
Conversamos por dez minutos. Defendeu sua posição. E, eu, a que definimos na reunião. Ele, afinal, reconheceu que estávamos certos. Com uma frase antiga. Usando palavra que ouvi pela primeira (e última) vez na vida: “Sua interpretação é escorreita”. Prometeu que reconheceria isso, publicamente. Mas pediu para acertar, antes, com Ulisses Guimarães (presidente da Câmara) e “aquele menino” (Pimenta da Veiga, líder do governo). Se estivessem de acordo, mudaria de opinião. E Sarney tomaria posse, então, perante o Congresso.
… E deu conselho que ainda hoje guardo: “Não se meta em barulho que você não for capaz de resolver”. Fim da conversa. E assim foi.