Meu corrupto é mais bonito
POR SILVIA ZACLIS
Dada a polarização chatíssima instalada aqui na terrinha e, consequentemente, no Facebook, é previsível que as novas brincadeiras não cheguem a ser estimulantes, mas têm um certo colorido folclórico…
Ciranda, cirandinha, vamos todos cirandar. Vamos dar a meia volta, volta e meia vamos dar! Ah, nosso folclore, as crianças na roda, a alegria tão pura…
Parece que a turma que brincava de cirandinha, barra manteiga, pegador, amarelinha e caracol no século passado anda com saudades desses passatempos pueris, e vem criando sucedâneos para os novos tempos.
Dada a polarização chatíssima instalada aqui na terrinha e, consequentemente, no Facebook, é previsível que as novas brincadeiras não cheguem a ser estimulantes, mas têm um certo colorido folclórico…
Jogo 1 – O meu corrupto é melhor que o seu – Essa versão da cirandinha exige um grupo em roda, de mãos dadas; aí, enquanto giram, os participantes contam, um a um, alguma escorregada do seu corrupto. Quando um rodante não lembrar de nenhuma corrupção para citar, é desclassificado, e o último a permanecer na roda é o campeão. Essa atividade é a preferida dos amigos que defendem o PT; parece que eles se sentem aliviados em deixar claro que “os deles” não são os únicos corruptos. Como se isso fizesse alguma diferença já que, como diria a minha avó, corrupto ió, corrupto nicht, somos nós que nos estrepamos;
Jogo 2 – Caça à bandeira – São três grupos: os vermelhos, os auriverdes e o pessoal da república de Curitiba. As equipes se posicionam a certa distância uma da outra, cada uma com sua bandeira. Quando o juiz apita, os jogadores saem em disparada para rasgar a bandeira do outro. Quem mantiver sua bandeira intacta é o campeão.
Cito só como obrigação jornalística; espero que não haja muita gente com disposição para jogar esse jogo cretino; essa divisão é estúpida, defendida por quem não percebe que, afinal, somos todos a soma dessas bandeiras. Me irrito com os amigos curitibanos que tentam se distinguir, com os amigos petistas que se consideram donos da cor vermelha, e até com alguns dos verde-amarelos porque se acham mais brasileiros que os outros. Ora, ora, que coisa mais arrogante…
Jogo 3 – Ideal para o lazer em salas de espera de dentistas, viagens para a praia em dias de comboio ou filas no relógio de ponto (se é que ainda existem filas nos relógios de ponto…)
Funciona assim: um participante pergunta para outro: “Quem, no governo ou na respectiva família, tem a boca mais suja”? Parece fácil, mas não é! O jogador não responde, apenas; ele precisa justificar sua escolha, repetindo algumas das pérolas gravadas pela Polícia Federal ou por alguma deputada desatenta. Ao fundo, Vinícius e Toquinho cantam “na tonga da mironga do cabuletê”.
No mesmo estilo lúdico, que tal adivinhar a palavra escondida pelo “plim!” no rádio e na TV ou por *#$*&@#! na mídia impressa? Quem acertar o maior número de palavrões ganha uma pasta de dentes. A trilha sonora é um clássico na voz de Ataulfo Alves, “laranja madura, na beira da estrada, tá bichada, Zé, ou tem marimbondo no pé”.
Brincadeiras à parte, essas são minhas contribuições ao catálogo de néo- passatempos em tempos de crise. Se vocês tiverem alguma sugestão para enriquecer esse registro, aceito e agradeço.
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Silvia Zaclis– É jornalista
O artigo reflete bem a infantilização da política nacional. As solenes afirmações de “otoridades” são mais pueris que as ouvidas em rodas de cirandas. Mas parece que, apesar dessa excrescência, é assim que o povo vai substituindo o tema das discussões, do futebol para a política!