E a jararaca?
E A JARARACA?
Por Josué Machado
Alguns jornais classificaram a fala de Luiz Inácio na sede do PT depois do depoimento forçado à Polícia Federal de “discurso inflamado”.
“Inflamado” tem sido o cansativo, desgastado e desgostoso adjetivo usado para temperar discursos exaltados, ardorosos, excessivos, destemperados, exasperados, exaltados – aqueles em que o orador sempre se avermelha, se irrita, se altera, enrouquece e dá murros na mesa ou no púlpito na ânsia incontida de convencer. E parece que Luiz Inácio convence. Pelo menos os adeptos.
… Só que jararaca não é bicho dos mais simpáticos: trata-se de uma serpente da família dos viperídeos, extremamente venenosa…
Mas em seu “inflamado discurso” Luiz Inácio parece ter cometido uma envenenada impropriedade. Comparou-se a uma jararaca e disse que, quando quiserem acabar com uma dessas serpentes, como estão tentando fazer com ele, não basta acertar-lhe o rabo, como teriam acertado o dele com o depoimento forçado, mas, sim, a cabeça.
Só que jararaca não é bicho dos mais simpáticos: trata-se de uma serpente da família dos viperídeos, extremamente venenosa. E – pior –, em sentido metafórico, “pessoa má, traiçoeira ou geniosa (diz-se especialmente de mulher); peste, víbora”, como informa impiedoso o Houaiss.
Conclui-se, portanto, que nem seu mais aecioso, fernandino e viperino inimigo o teria brindado com tão jararacosa picada quanto a que deu involuntariamente em si mesmo.
É o que dá inflamar-se demais em discursos.
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Josué Machado – Jornalista, autor de “Manual da Falta de Estilo”, e “Língua sem Vergonha”, em que avalia, apesar de tudo com bom humor, os textos torturados de jornais, revistas, TV, rádio e publicidade. Trabalhou no Jornal do Brasil e em revistas da Editora Abril.
Muito verdadeiro, oportuno e divertido o “E a jararaca” , do Josué Machado.