“Cala-te, boca!”
Por Silvia Zaclis*
…Passado o ímpeto juvenil, devo dizer que contei até dez tantas vezes, nos anos seguintes, que daria para completar alguns ábacos. Daqueles grandes. Sugiro a técnica – que é simples, prática, e não implica custos – a algumas figuras públicas do nosso Brasil e além…
Raras vezes na vida me arrependi por contar até dez antes de responder a alguém. Tem hora que dez é pouco, eu sei, mas se contar mais do que isso, você perde o ritmo da conversa, o que não é nada bom. Fica parecendo que você não sabe o que responder, quando na verdade você sabe, mas muitas vezes não pode.
Certa vez – não me julguem tão mal, eu tinha menos de 30 anos – o chefão da empresa em que eu trabalhava disse que estava muito nervoso (parte por minha causa) e, ato contínuo, começou a bater a cabeça na parede. Logo percebi a chantagem emocional, já que ele dava cabeçadas na divisória, que era bem fininha. Ao que eu disse “se é para bater a cabeça mesmo, melhor usar a parede”.
Lembrei essa história hoje – há séculos não pensava nisso – e fiquei espantada com a ousadia, a falta de educação e a temeridade do conselho. Tenho certeza de que não contei nem até dois antes de produzir tal pérola.
Passado o ímpeto juvenil, devo dizer que contei até dez tantas vezes, nos anos seguintes, que daria para completar alguns ábacos. Daqueles grandes.
Sugiro a técnica – que é simples, prática, e não implica custos – a algumas figuras públicas do nosso Brasil e além.
Se o atual primeiro-ministro Israelense, Benjamin Netaniahu, tivesse contado até dez, quem sabe não teria falado aquele absurdo sobre a influência de um xeque árabe nas ideias de Hitler.
Em análise transacional – conforme aprendi há décadas em um curso rápido – a melhor relação é aquela em que os dois lados ganham.
Eu estou OK, você está OK. Qualquer alternativa é ruim. Eu estou OK, você não; você está OK, eu não; ou nenhum dos dois está OK. Com sua declaração, Bibi conseguiu ampliar o conceito, pois saíram perdendo ele (criticado até por aliados), os israelenses (que também se irritaram), nós, o público (pelo desgaste de ouvir tamanho despautério). Ah… E ele ainda conseguiu levar felicidade a adversários e inimigos.
O conselho de contar até dez – que afinal garante um tempinho para pensar – devia estar na agenda de todos os assessores de nossa presidente Dilma. Em política, o divertido e o patético são separados por uma fina película de boa ou má-vontade. No atual estágio de popularidade, não creio que a vontade esteja muito boa, não.
É uma lista de dar medo, e começou logo com a invenção esdrúxula da palavra “presidenta”; saudou a mandioca nativa como se fosse uma conquista do engenho brasileiro; lamentou ainda não haver uma tecnologia capaz de estocar vento… e agora diz que não há corrupção no seu governo! E essas frases são apenas as que me vieram à memória, assim, nem precisei pesquisar. Faça-me o favor…
Ainda por cima a presidente discursa todos os dias – o que amplia sobremaneira a probabilidade de falar o que não deve – e tem sempre grande cobertura da mídia.
Outro dia ouvi no youtube uma gravação feita pelo saudoso Ariano Suassuna em que ele comentava a afirmação de um jornalista de que “a banda Calypso é a verdade do Brasil”. Revoltado, o professor se declarou ofendido como brasileiro. “Então a realidade do Brasil é uou, uou, uou?“
A referência a esse pobre refrão musical me fez pensar. Em terra de Ferreira Gullar, Chico Buarque, Helio Bicudo, Fernando Henrique Cardoso, Jarbas Vasconcelos, Pedro Simon, Cristóvam Buarque, Clovis Rossi, Miriam Leitão, dos ministros Joaquim Barbosa e Carmen Lucia, só para citar alguns…ter de aguentar as falas de Dilma, Eduardo Cunha, Renan Calheiros et caterva é um insulto ao país.
E não dá para evitar o mal estar, não tem contagem até dez que resolva.
Silvis Zaclis* – É Jornalista