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Perigo…Com o domínio das redes sociais e a utilização da Inteligência Artificial isso não será impossível. Prestes a completar um mês de governo, Trump, cujo comportamento já se assemelha ao de um ditador, não parece ter, até este momento, contra-poderes à altura…

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Diante da maneira como vem se comportando o presidente Donald Trump, muita gente começa a ficar com a pulga atrás da orelha nos Estados Unidos. A enxurrada de decretos sem consulta e aprovação do Congresso, as decisões tomadas ao arrepio da Constituição americana, as ameaças de demissão para quem se colocar na frente, tudo isso começa a preocupar jornalistas, analistas e políticos.

Mesmo porque as decisões autoritárias de Trump, principalmente as de expulsões de imigrantes e cortes de funcionários na máquina governamental, estão sendo bem recebidas pela população e aumentando sua popularidade.

Embora Trump tenha jurado sobre a Bíblia que irá preservar, proteger e defender a Constituição, isso não parece garantia suficiente contra a tentação de ter plenos poderes e de ignorar as restrições e entraves judiciais destinados a proteger o funcionamento normal da Democracia.

Como senão bastasse sua presença egocêntrica no comando do governo, Trump tem ao seu lado uma espécie de primeiro-ministro, o multimilionário Elon Musk, decidido a enxugar a máquina burocrática do país, no que poderia ser um esforço de economia orçamentária, mas, na verdade, com o objetivo real e principal de debilitar a estrutura orgânica para não haver reações a uma intenção programada de assumir o controle autocrático do país.

Com o domínio das redes sociais e a utilização da Inteligência Artificial isso não será impossível. Prestes a completar um mês de governo, Trump, cujo comportamento já se assemelha ao de um ditador, não parece ter, até este momento, contra-poderes à altura, seja na justiça, na sociedade e na imprensa, baseando-se na união oligarca de uma forte elite econômica.

Fator importante, Trump não reconheceu e não reconhece até hoje sua derrota frente a Joe Biden, em 2020. Além disso, foi Trump quem incentivou o ataque ao Capitólio em janeiro de 2021 contra o resultado das eleições. E, bastante sintomático e preocupante, Trump anistiou a todos os envolvidos no ataque ao Capitólio, onde houve cinco mortes e dezenas de feridos.

Ou seja, para ele não houve ataque à democracia na tentativa de impedir a posse de Joe Biden e, por tabela, para Trump não havia culpados mesmo se foram presos e condenados. Durante os últimos quatro anos, Trump não só repetia ter havido fraude nas eleições como deixava entrever seu desejo de vingança, agora consumado neste seu segundo governo, com a tentativa de demitir e processar todos os funcionários da Justiça envolvidos nos processos contra os invasores do Capitólio.

É muito pessoal seu conceito de “preservar, proteger e defender a Constituição”, jurado na primeira posse para desrespeitar, quatro anos depois, nos incentivos ao ataque do Capitólio. Com base nessa folha corrida de Trump – o primeiro presidente com uma condenação judicial – nos seus gestos autoritários e nas ameaças econômicas e mesmo de invasão a outros países desde sua posse, é difícil acreditar num Trump disposto a aceitar decisões judiciais anulando seus decretos ou do seu “primeiro-ministro” Elon Musk. E já surgem jornalistas perguntando se Trump vai querer mudar a Constituição para ter um terceiro mandato!

No momento, Trump procura saber até onde pode esticar seus poderes, sobre quem pode passar por cima, até onde pode assustar. No exterior, as reações variam do Hamas, países árabes, França, México, da Dinamarca e do Canadá ao Brasil.

Dentro dos Estados Unidos já existe alguma resistência por parte de alguns juízes federais. O presidente Trump parece tentado a ignorar as decisões judiciais tomadas por esses juízes e ameaça mesmo puni-los. Se isso realmente ocorrer, a democracia norte-americana  que, no passado, incentivou tantos golpes de Estado, inclusive no Brasil em 1964, poderá ver o feitiço virar contra o feiticeiro.

O sinal de alerta foi dado por um magistrado de Rhode Island que denunciou não ter sido respeitada pelo governo uma de suas decisões. Logo depois, um juiz federal, John McConnell, acionado por Estados democratas, bloqueou o corte pela administração Trump, pedido por Elon Musk, de bilhões de subvenções, sob o argumento de que tais pagamentos já haviam sido aprovados pelo Congresso. Houve reações contra esses cortes inclusive por deputados republicanos, Trump parecia ter cedido e anulado os cortes, mas uma parte dessas subvenções continua bloqueada. Assim como Trump parece querer fazer passar à força muitos decretos considerados ilegais.

A situação se complicou com uma declaração do vice-presidente J.D.Vance de que “os juízes não têm o poder de controlar o poder legítimo do executivo”. E a palavra “golpe de Estado judiciário” acabou sendo utilizada por Elon Musk, o multimilionário nomeado por Trump para enxugar as despesas governamentais, como se fosse um ministro com plenos poderes. Qualquer coincidência com o ataque dos golpistas bolsonaristas de que no Brasil existe uma “ditadura judiciária exercida pelo STF” seria mera coincidência.

Contra o chamado trio Trump, Musk e Vance já se mobilizou o senador democrata Chris Murphy, afirmando numa entrevista à CNN, estar havendo o fim potencial da democracia nos Estados Unidos. “Se o presidente está acima das leis, quem respeitará as leis no país?”, disse ele.

Diversos professores de Direito estão alertando quanto ao risco de uma crise institucional nos EUA. Entretanto, comenta o correspondente do jornal suíço Le Temps, “o país parece anestesiado”.

Trump poderia evitar o confronto com os juízes recorrendo de suas decisões junto à Suprema Corte. Ao contrário do Brasil, onde o STF defendeu a Constituição e impediu a realização de um Golpe, a Suprema Corte dos EUA tem maioria com os três ministros conservadores nomeados por Trump, que lhe são sempre favoráveis. No caso de litígio com juízes federais, Trump sairia sempre vencedor, porém haveria um longo prazo para julgamento.

Diante disso, na sua pressa, o mais provável é Trump passar seus decretos na força, sem se preocupar com as consequências para a democracia.


  • Rui Martins também está em versão sonora no Youtube, em seu canal –

https://www.youtube.com/@rpertins

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Rui Martins – Direto da Suiça – é jornalista, escritor, ex-CBN e ex-Estadão, exilado durante a ditadura. Criador do primeiro movimento internacional dos emigrantes, Brasileirinhos Apátridas, que levou à recuperação da nacionalidade brasileira nata dos filhos dos emigrantes com a Emenda Constitucional 54/07. Escreveu Dinheiro sujo da corrupção, sobre as contas suíças de Maluf, e o primeiro livro sobre Roberto Carlos, A rebelião romântica da Jovem Guarda, em 1966. Foi colaborador do Pasquim. Estudou no IRFED, l’Institut International de Recherche et de Formation Éducation et Développement, fez mestrado no Institut Français de Presse, em Paris, e Direito na USP. Vive na Suíça, correspondente do Expresso de Lisboa, Correio do Brasil e RFI

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