CEMITÉRIOS

Conversas de 1/2 minuto(37) – Cemitérios (I de II)

CONVERSAS DE ½ MINUTO (37) ‒ CEMITÉRIOS (I de II) – por JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO

 Mais conversas, hoje só os cemitérios e afins, em livro que estou escrevendo (título da coluna).

CEMITÉRIOS

BLAISE PASCAL, filósofo. Cristão assumido, no leito de morte, um amigo disse

‒ Você, finalmente, irá encontrar o Pai.

‒ E tomara que eu esteja certo.

 EÇA DE QUEIROZ, escritor. Em Túmulos, disse

‒ Durante a vida o egípcio tendo por pensamento, por consciência, por fim supremo do ser a ideia da morte, construía casas de barro e túmulos de granito!

 FELIPA ALMEIDA MENDONÇA, jornalista.  Começou entrevista, ao jornal Público, dizendo

‒ O tempo perguntou ao tempo quanto tempo o tempo tem.

O que lembra belo soneto do frei António das Chagas (António Fonseca Soares), no Século XII, Conta e tempo

 ‒ Deus pede estrita conta de meu tempo.

E eu vou, do meu tempo, dar-lhe conta.

Mas como dar, sem tempo, tanta conta

Eu que gastei, sem conta, tanto tempo?

Para dar minha conta feita a tempo,

O tempo me foi dado, e não fiz conta.

Não quis, sobrando tempo, fazer conta

Hoje, quero fazer conta, e não há tempo.

 

Oh vós, que tendes tempo sem ter conta,

Não gasteis vosso tempo em passatempo.

Cuidai, enquanto é tempo, em fazer conta.

Pois aqueles que, sem conta, gastam tempo,

Quando o tempo chegar, de prestar conta

Chorarão, como eu, o não ter tempo…

 FERNANDO PESSOA, poeta. Em caderno de viagem (hoje guardado com zelo) está texto inédito seu que começa dizendo

‒ Cada palavra dita é a voz de um morto.

* * *

E, em O marinheiro, disse

‒ Por que é que se morre?

Talvez por não se sonhar bastante.

 GEORGES CLEMENCEAU, presidente do Conselho da França na Primeira Guerra. Um jornal belga noticiou sua morte. Clemeceau respondeu, a seu editor,

‒ Li no jornal, que Vossa Excelência tão superiormente dirige, a notícia de minha morte. Como é uma fonte geralmente bem informada, tenho de concluir que deve ser verdade. Sendo assim, e estando agora no outro mundo, não necessito mais da leitura de seu conceituado jornal e por isso peço-lhes a fineza de riscar meu nome da sua lista de assinantes.

HENRIQUE DE RESENDE, advogado. No Cemitério de Cataguazes (MG) está esse epitáfio, em seu túmulo, escrito pelo próprio

                        ‒ Contra sua vontade, bem se entende,

Sempre amando a vida como outrora

Aqui repousa Henrique de Resende

Que preferia repousar lá fora.

 INSCRIÇÕES TUMULARES. Seguem algumas de pessoas famosas

* CONAN DOYLE. No Cemitério de Minstead (Inglaterra)

‒ Verdadeiro aço. Lâmina afiada.

* DOROTHY PARKER, atriz americana. Disse à revista Vanity Fair, em 1925, qual seria seu epitáfio

‒ Desculpe a minha poeira (o meu pó).

* EDGAR ALLAN POE. Na parte de trás do cemitério de Westminster (Estados Unidos), uma referência a seu mais famoso poema

‒ Disse o corvo, nunca mais.

* EVITA PERON. No cemitério da Ricoleta (Buenos Aires), longa citação que começa dizendo

‒ Não chores por mim.

* FRANK SINATRA. No Desert Memorial Park da Califórnia (Estados Unidos)

‒ O melhor ainda está por vir.

 * KARL MARX. No Cemitério de Highgate (Londres)

‒ Os filósofos têm interpretado o mundo de várias maneiras. O ponto, contudo, é mudá-lo.

* STHENDHAL. No Cemitério de Montmarte, Paris (França), está o que escreveu para ser posto em seu epitáfio

‒ Escreveu, amou, viveu.

Na verdade queria também que constasse, e não foi atendido, “adorava Cimarosa, Mozart e Shakespeare”.

 * WILLIAM SHAKESPEARE. Na Igreja da Santíssima Trindade, em sua cidade natal Strafford-upon-Avon (Inglaterra)

‒ Abençoado seja o homem que poupar essas pedras e maldito o que mover meus ossos.

Por fim, não está no seu túmulo mas foi a última frase que disse HUMPHREY BOGART,

‒ Nunca deveria ter trocado scotch por martini.

 LULA ARRAES, médico (e filho do governador Miguel Arraes). Anotou esse epitáfio escrito por um poeta de Timbaúba (Pernambuco)

‒ Aqui jaz

Para seu deleite

Sebastião Uchoa Leite.

 MANUEL BANDEIRA, poeta. Escreveu esse Último poema

‒ Assim eu quereria o meu último poema

Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas

Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume

E a paixão dos suicidas que se matam sem explicação.

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________________________________________________JOSÉ PAULO CAVALCANTI FILHO

José Paulo Cavalcanti FilhoÉ advogado, escritor,  e um dos maiores conhecedores da obra de Fernando Pessoa. Ex-Ministro da Justiça. Integrou a Comissão da Verdade. Vive no Recife. Eleito para a Academia Brasileira de Letras, cadeira 39.

jp@jpc.com.br

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