li em algum lugar

Eu li, em algum lugar…Por Antonio Contente

… Li, em algum lugar… qual, realmente, a real fonte desses, digamos, conhecimentos que alguns classificam como “cultura inútil”? Francamente, ainda estou tentando apurar…

LI E ALGUM LUGAR

         Faz algum tempo, no ano passado, publiquei crônica sobre o antigo Almanaque do Biotônico Fontoura e, francamente, tomei um susto com a repercussão. Vários e-mails, telefonemas e até oferta (para compra), de um colecionador de Jaguariúna, dono de coleção com todos, ou quase todos os números da desaparecida revistinha. Isso fora as pessoas que me abordaram nas ruas e leitores que escreveram para a seção de Cartas do jornal. Bom, mas a mim mesmo começaram a pintar na encanecida cachola várias lascas de coisinhas apreendidas não só na veterana publicação como também em outras, ou em livros.  Mas qual, realmente, a real fonte desses, digamos, conhecimentos que alguns classificam como “cultura inútil”? Francamente, ainda estou tentando apurar.

         “Morrer de amor”, por exemplo. Aí está um desenlace comum na literatura, por mim acompanhado de perto nos tempos em que fui repórter de polícia. Mas, sobre o tema, ficaram na minha memória três versos de “Noite de Reis”, de Shakespeare, que saquei em algum lugar e que diz assim: “Se a música for alimento para o amor, continuarei tocando/ de tal modo que, ouvindo-a em excesso/ possa saciar o apetite, adoecer e assim morrer”. Onde será que li a ponto de decorar?

         Já de alguma outra fonte guardo lembrança de nova informação. Nada relevante, talvez, mas que serve bastante bem se, numa roda de papo, alguém fala sobre o falecido presidente John Kennedy. Há quem diga que a atriz Marilyn Monroe teria morrido de amor por ele. E ficou célebre, a rodar continuamente pelos youtubes da vida, a cena em que ela canta o “Parabéns a Você” no dia em que o amado completava 45 anos, em 1962, com multidão no Madison Square Garden. Isso após um grande jantar. Pois sabem qual foi a entrada do bem servido ágape? Apenas uma, também comum no Brasil, “Casquinha de Siri”. Li em algum lugar…

         Agora, o alho. Quanta informação sobre ele se vai acumulando ao ler coisinhas aqui e ali. Plínio, o Velho (23 dC-79 dC), escritor e naturalista romano, dizia que o estrelado tempero evitava a loucura e repelia serpentes. Já mais recentemente, pós Bram Stocker,  autor de Drácula, o bulbo é apontado como o melhor remédio para espantar vampiros. Li também que o famoso “Macarrão Alho e Óleo” teria sido criado pelo imperador Nero. Pode ser, só que ninguém prepara um melhor do que o lendário repórter fotográfico Neldo Cantanti… Que certamente talvez nem saiba que nos idos de 1300 o rei Alfonso de Castela era taxativo: proibiu, através de decreto, a entrada na corte de qualquer pessoa que, nos últimos 30 dias, tivessem comido alho…

         Também na minha memória de conhecimentos nem tão inúteis assim cavei, dia desses, algo que provavelmente os filiados ao PSDB desconhecem. É informação que acabou virando item de vários almanaques de curiosidades pelo fato de que, na natureza, segundo garantem, não existiriam alimentos da cor azul. O que acabou desmentido por Peter Lund Simmonds, em “Curiosities of Foods”, publicado na Inglaterra no século XIX. Pois lá está escrito, só que não foi onde captei, que um famoso chef de Trinindad, uma das centenas de ilhas do Caribe, tinha num “ensopado de tucano” sua principal iguaria. A exibir, nos pratos,  carne da bicuda ave; completamente azul…

         Como no meu universo de amizades há alguns bons companheiros que, mesmo sofrendo eventuais ataques de gota não dispensam os aperitivos diários, recordo sempre duas coisas que, como as outras já citadas, li não sei onde. Uma foi que Ambrose Bierce, no seu “Dicionário do Diabo”, definiu a doença como o nome que os médicos dão ao reumatismo do paciente rico. Outra é uma historinha que tem como personagem o famoso Lorde Chesterfield, que sofria terrivelmente com os constantes ataques da citada enfermidade. Assim, um dia, querendo agradá-lo, um fabricante de vinhos lhe enviou uma garrafa de xerez garantindo que seria tiro e queda para acabar com os sofrimentos. Dias depois, porém, o vinhateiro recebeu um bilhete do nobre: “Senhor, provei seu xerez, e, francamente, entre ele e a gota prefiro ficar com ela”…

         Mas se tudo isso, afinal, pode ser capitulado como “cultura inútil”, vale, nesta altura, dizer que não é tanto assim. Pois, ao fim e ao cabo, serve muito bem para tema de crônica dedicada a aliviar os leitores numa segunda-feira. Que alguém já definiu, também li não sei onde, como sendo o mais terrível dos dias…

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Antonio ContenteANTÔNIO CONTENTE – Jornalista, cronista, escritor, várias obras publicadas. Entre elas, O Lobisomem Cantador, Um Doido no Quarteirão. Natural de Belém do Pará, vive em Campinas, SP, onde colabora com o Correio Popular, entre outros veículos.

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