macaca

Estadão, 15 outubro/ 2024

Uma aluna, dotada de espírito refinado, chamou uma colega de macaca…O mundo mudou, minha gente. As porteiras estão abertas. Sinais inquietantes pipocam aqui e ali, a todo momento…

macaca
Estadão, 15 outubro/ 2024

Imagine só. Um dia, na escola, você comete uma enormidade. Não digo uma besteirinha, não, você lança uma tremenda ofensa verbal a uma colega. Se, em outros tempos, tal “deslize” poderia passar batido, hoje não é mais assim: é ato criminoso.

Pois aconteceu. Não foi no Parquinho Infantil da Dona Mariquinhas, mas num conhecido instituto de ensino superior. Uma aluna, dotada de espírito refinado, chamou uma colega de macaca.

Imagino o rebuliço causado pela injúria racial. Orientação, diretoria, conselho de disciplina se concertaram e deram o veredicto: expulsão da aluna raivosa.

O auê deveria terminar aqui, mas estamos no Brasil, o que é que há? Sem vergonha do ridículo, a expulsada recorreu à justiça, obteve uma decisão liminar favorável e… retornou às aulas na faculdade. Tremenda cara de pau!

O primeiro pensamento que me ocorreu foi que o comportamento arrogante da expulsanda decorria, em linha direta, do ambiente que se instalou em nosso país desde que Bolsonaro assumiu a Presidência. É um incômodo caso em que ignorância e prepotência se mesclam numa espetacular carteirada.

Presume-se que a formação educacional da expulsanda esteja sendo financiada por sua família, o que significa que, além de apoiar a jovem em sua atitude, ainda cobrem o custo do advogado e as custas do processo. Sinal evidente de que concordam com a atitude da herdeira.

Em seguida, num segundo momento, me pareceu que unicamente o apoio da família não seria suficiente para fazer a jovem voltar aos cursos na cara dura.

Se, entre os colegas de classe, prevalecesse um sentimento de indignação, a expulsanda com certeza não cometeria o despeito de voltar às aulas, com receio de ser massacrada pelas demonstrações de repulsa da classe inteira.

E concluí que o afago da família não é o único esteio do espírito soberbo da aluna. Tudo indica que parte significativa dos colegas de classe estão com ela e concordam com o xingamento.

O mundo mudou, minha gente. As porteiras estão abertas. Sinais inquietantes pipocam aqui e ali, a todo momento. Preparem-se porque no futuro vem mais.

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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos,  dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.

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