Alckmin Irã

… Na cerimônia, Alckmin foi instalado entre o chefe da facção guerrilheira Hamas,  Ismail Haniyeh (morto horas depois); o porta-voz do  grupo iemenita Houtis, também guerrilheiro, Mohammed Abdulsalam; o vice-líder do Hezbollah, general Nai M Assem; o líder da Jihad Islâmica, Ziyhad Al Nakhalyah , todos em plena atividade insurrecional…

Alckmin Irã

Geraldo Alckmin, vice-presidente da República e ministro da Indústria e do Comércio do governo petista, com uma  longa carreira política entre liberais progressistas,  dá mostras, às vezes,  de estar vivendo uma adolescência tardia, numa revelação  de que fazer  política  pode até ser para quem faz dela um meio de vida mas, nele, para sobreviver, não  pode  comportar-se  como amador.

O ex-candidato à Presidência da República no Brasil e ex-governador de São Paulo, acaba de ser fotografado no Irã (República Islâmica do Golfo Pérsico), representando o governo brasileiro na posse do novo Presidente, Masoud Pezeshkian (eleito com 53,7% dos votos). Na cerimônia, Alckmin foi instalado entre o chefe da facção guerrilheira Hamas,  Ismail Haniyeh (morto horas depois); o porta-voz do  grupo iemenita Houtis, também guerrilheiro, Mohammed Abdulsalam; o vice-líder do Hezbollah, general Nai M Assem; o líder da Jihad Islâmica, Ziyhad Al Nakhalyah , todos em plena atividade insurrecional.

Era um encontro quase litúrgico daqueles que pregam a democracia e a liberdade segurando nas mãos um fuzil kalashnikov, usado nas guerras regionais. Alckmin parece ter sido induzido a andar na direção contrária da história diplomática brasileira – “…negociação e diálogo como instrumentos de resolução de conflitos” – dando, com sua presença (por que não outro?)  legitimidade para aquelas lideranças religiosas guerrilheiras.

O Brasil sempre se manteve equidistante de conflitos que não lhe diziam respeito, evitando meter-se em brigas alheias. Ultimamente está sendo vagarosamente “jogado às feras”, por obra de meia dúzia de sujeitos ensimesmados no Poder. É uma insensatez   que se espalha pelo mundo, e o Brasil vai sendo imprudentemente envolvido. O modelo de eleições digitais, ditas “livres e democráticas” surge para   instrumentalizar o processo.

Na América Latina, entre os explicitamente coniventes, estão Daniel Ortega, da Nicarágua, Nicolás Maduro, da Venezuela e os cubanos. O atual presidente do Brasil (50,83%), sem convicção visível, vem fazendo ensaios para entrar no grupo. São pessoas aparentemente doentias, não se expõem com armamentos para tomar o Poder. Usam terceiros: milícias civis, forças armadas, cooptação de juízes e a mídia, aparelham o Estado e agenciam pessoas, partidos, conveniências e   sociais e políticas.

Flacidamente compromissados com a democracia, mantêm um clima latente de promessas e expectativas de um fluído bem estar, acompanhado pela   perseguição aos opositores.  Interferem cinicamente nas liberdades civis e de pensamento, mesmo sob a desconfiança da sociedade.

Nesse meio, estão sempre lembrados como a origem de fraudes e do ódio. Suas ameaças atingem, às vezes, altos níveis de destempero como o de Maduro antes do pleito venezuelano – “Pode correr sangue nas eleições da Venezuela”, e até o sumiço de atas e urnas eleitorais. É um tipo bolivarismo de consistência etérea, radical, herdado de Chávez.

Esse tipo de liderança, que se diz revolucionária, protege-se atrás de uma retórica vazia em defesa da democracia, acusando opositores de fascistas e nazistas, quando são eles que usam aqueles métodos hitlerianos, himlerianos, mussolinistas. De Stálin e Putin, com o mesmo perfil, não se fala. Procura-se antecipar essa estigmatização abusiva e pejorativa, confundindo a massa de desavisados. Assim, por meios frequentemente adulterados, tomam o Poder, cerceiam as liberdades, as oposições, oprimem e agridem as populações.

Em décadas passadas reconheciam-se e se respeitava na América Latina grupos guerrilheiros revolucionários. Mas, na “modernidade líquida”, diria que os herdeiros desses grupos ideologicamente confusos, convergem para algo escuso, muito longe de uma propalada revolução.   Governam por meio de do exercício de uma ditadura, sob a capa sociológica de um autoritarismo. São poucas essas lideranças narcisistas, todas há mais de dez anos no Poder, protegidas por um aparelhamento pleno do Estado, como fez Maduro na Justiça do seu país. Os propósitos se assemelham entre eles.

 É para esse tipo de ambiente, num mundo pouco conhecido por aqui, que Alckmin terminou sendo cooptado e silenciado. “Ele mente” – quem denunciou isso, num debate na televisão, para todo o Brasil fraudado ouvir, foi o Alckmin, hoje com postura de servidor público submisso e bem remunerado. Na ocasião, o oponente riu da sua ingenuidade ao ser chamado por ele de mentiroso. De fato, quem se elegeu foi o acusado, conseguindo depois dissolver o “picolé de chuchu”: “tudo que é sólido desmancha-se no ar”, destruindo praticamente o seu partido, o PSDB, uma centro-esquerda pequeno burguesa.

  A escorregada de Alckmin conspurca os esforços diplomáticos históricos do Brasil   de se manter distante de conflitos amparados por estereótipos e ortodoxias cheias de contradições, longe das tradições cristãs, pacíficas e democráticas. A maioria dos brasileiros não compreende os conflitos no Oriente Médio. Fica tudo ainda mais confuso quando se quer meter no meio o Irã, que (não é árabe desde a Grécia Antiga, e vive em guerra pelo domínio do Ocidente). Aliás, naquela região sempre um quer engolir o outro.

Mas, tão ridícula quanto a violência contra a imagem de Alckmin representando o Brasil entre guerrilheiros árabes – uma “casca de banana”, um sorvedouro de caráter -, é ele concordar em ser usado para dar legitimidade a tão nocivas companhias e guerras para a configuração iconográfica da história contemporânea do Brasil e do planeta.

De 2023 para 2024, o mundo está realizando eleições em pelo menos 70 países, oito deles na América. Alguns enquadram-se perfeitamente no perfil traçado. Lá está a figura dantesca do Nicolás Maduro, acusado de ter fraudado a eleição presidencial, inviabilizado uma Oposição, e eleito com supostos 51,2% dos votos, contrariamente aos resultados contabilizados, nos quais ele teria perdido por mais de 70 % dos votos.

“Deus colocou nas minhas mãos as eleições, para que seguisse na direção da Venezuela, governando com amor”. O que se chama aqui de “modelo de gestão político eleitoral” parece amparado numa “matriz digital eleitoral, “hackeadora”, que circula pelo mundo, tentando apropriar-se do coração e da mente dos homens.

Não há revolução nenhuma. O teórico inspirador de tudo isso é George Sorel (1847-1922), um anarquista que valorizava o caos. As duvidosas urnas brasileiras, “impossíveis de serem auditadas”, segundo Maduro, foram também proibidas na Colômbia.

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Aylê-Salassié F. Quintão –  Jornalista, professor, doutor em História Cultural, ex-guarda florestal do Parque Nacional de Brasília Vive em Brasília. Autor de “Pinguela: a maldição do Vice”. Brasília: Otimismo, 2018

Autor, entre outros, de Lanternas Flutuantes:
Português –   LANTERNA FLUTUANTES, habitando poeticamente o mundo
Alemão – Schwimmende-laternen-1508  (Ominia Scriptum, Alemanha)
Inglês – Floating Lanterns  
Polonês – Pływające latarnie  – poetycko zamieszkiwać świat  
novo livro de Aylê-Salassiê: TERRITÓRIO LIVRE!

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