trabalhadores e máquinas

Ai de vós trabalhadores. Por Paulo Renato Coelho Netto

Trabalhadores? …As máquinas e a robótica não vieram para substituir humanos em troca de qualidade de vida, o que seria maravilhoso. Chegaram com tudo para promover desemprego, fome, aumento da pobreza e da precarização da mão de obra disponível.

trabalhadores - padeiro

Padaria sem padeiro. Leio o anúncio de franquia oferecendo o estabelecimento sem, o que até então sempre imaginei, fosse o coração de qualquer empresa do ramo: o profissional que faz pão.

O pãozinho francês é entregue congelado, produzido em maquinários que só precisam adicionar a farinha de trigo. O restante do processo é feito sozinho até o congelamento do produto para a entrega.

Tirando o padeiro e o confeiteiro, como serão as panificadoras do futuro?

Vou ao cinema no dia 16 de julho e, pela primeira vez, noto que não há mais caixas para atender ao público na bilheteria.

Os ingressos, assim como água, pipoca e doces, são comprados em máquinas de autoatendimento.

Restaram na entrada, por enquanto, somente os funcionários que entregam os pedidos na lanchonete. Provavelmente, terceirizados ou horistas.

Mais à frente, apenas dois jovens para recolher os ingressos e indicar qual das dez salas ir para assistir ao filme escolhido.

Do cinema, resolvo comprar um sanduíche e o mesmo acontece: pedidos feitos entre humanos e máquinas.

Da última vez que fui neste mesmo shopping, não faz muito tempo, havia uma moça no caixa. Foi substituída por três geringonças modernas.

Em uma só tacada, literalmente, sumiram trabalhos no atendimento no cinema e na lanchonete.

Para pagar o estacionamento já havia me acostumando. Há alguns anos isso é feito em máquinas. As moças que faziam este trabalho também foram demitidas.

Alguém, certamente, vai defender que precisa ser assim.

A modernidade é isso aí, tipo Coca-Cola é isso aí, um slogan da década de 80 do fabricante que dizia que o refrigerante mais consumido do mundo é isso aí.

Até hoje não faço ideia do que seja isso aí.

Táxis-robôs, ou robotáxis, já são realidade em algumas cidades do mundo, principalmente nos Estados Unidos.

O discurso, de sempre, é que prometem revolucionar a mobilidade urbana. Conversa. Táxis autônomos vão garantir mais desemprego para taxistas e motoristas de Uber em escala global.

Os táxis-robôs são equipados com câmeras, sensores e radares que permitem trafegar sem o motorista. O usuário vai chamá-lo por aplicativo, sem falar com um humano.

Há estudos adiantados para fazer o mesmo com ônibus urbanos e caminhões autônomos para transporte de cargas nas rodovias.

Daqui a pouco a novidade deverá chegar aos trens e metrôs.

No campo planejam máquinas robóticas que tomem decisões próprias na plantação, pulverização e colheita, a partir de câmeras, sensores e GPS.

Aviões sem pilotos já são usados em guerras e fiscalização de fronteiras. São chamados de VANT [Veículo Aéreo Não Tripulado].

Máquinas não adoecem, não recolhem impostos trabalhistas, não tiram férias ou descanso semanal remunerado, licença-maternidade ou licença-paternidade.

São isentas de receber o 13º salário, não têm jornada de trabalho restrita a horas limitadas do dia, não exigem horas extras, não param para lanches e refeições e não estão sujeitas a alteração de humor, a doenças pessoais ou de alguém da família.

Máquinas não têm sentimentos. Não vão deixar de funcionar porque o pai morreu ou ficaram presas no trânsito por causa de um temporal daqueles.

Trabalhei como repórter na sucursal em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, no jornal econômico Gazeta Mercantil. Era o início da década de 90.

Recebo uma pauta para uma entrevista na superintendência local do Banco do Brasil sobre novidades que “revolucionariam a relação cliente/banco assim que implantadas”.

A revolução era o início da operação de máquinas de autoatendimento que iriam fornecer lâminas com folhas de cheques, dinheiro com cédulas diferentes e que poderiam agendar operações futuras, solicitar cartões de crédito e débito, liberar e registrar senhas, entre outras maravilhas do mundo moderno.

Com os caixas eletrônicos e o Pix, quem precisa ir ao banco hoje em dia? Quando muito, o telefone resolve, ou e-mail, ou WhatsApp.

Ainda não sei como não acabaram com o trabalho dos frentistas nos postos de combustível no Brasil, entre tantas outras atividades na mira do autoatendimento e do desemprego iminente em massa.

Em junho deste ano a cidade de São Paulo atingiu o total de 80.369 pessoas vivendo em situação de rua, de acordo com levantamento do Observatório Brasileiro de Políticas Públicas com a População em Situação de Rua da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).

Em todo o Brasil já são 300.868 pessoas dormindo em calçadas e sob viadutos, incluindo famílias inteiras, mulheres e crianças.

Os dados apontam aumento de 23,9% em relação a dezembro de 2023, tanto na capital paulista como no Brasil.

Desconsiderando os adictos, questão de saúde pública, como alguém pode pensar que mais de trezentos mil brasileiros moram nas ruas porque querem? Com emprego e renda, ninguém faz do relento a moradia.

As máquinas e a robótica não vieram para substituir humanos em troca de qualidade de vida, o que seria maravilhoso. Chegaram com tudo para promover desemprego, fome, aumento da pobreza e da precarização da mão de obra disponível.

O ser humano tornou-se um grande inconveniente para si mesmo.

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Instagram: @paulorenatocoelhonetto

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paulo rena

Paulo Renato Coelho Netto –  é jornalista, pós-graduado em Marketing. Tem reportagens publicadas nas Revistas Piauí, Época e Veja digital; nos sites UOL/Piauí/Folha de S.Paulo, O GLOBO, CLAUDIA/Abril, Observatório da Imprensa e VICE Brasil. Foi repórter nos jornais Gazeta Mercantil e Diário do Grande ABC. É autor de sete livros, entre os quais biografias e “2020 O Ano Que Não Existiu – A Pandemia de verde e amarelo”. Vive em Campo Grande.

 

capa - livro Paulo Renato

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