PAC da Saúde: 181 mil agentes para atender os municípios
… É o PAC da Saúde, que não está nem aí para a alta das taxas de juros, a alta do dólar, as derrotas políticas no Congresso, o endividamento público, as turbulências no mercado financeiro. Os agentes atuarão diretamente nos territórios periféricos urbanos e rurais, “valorizando o protagonismo da sociedade civil organizada no desenvolvimento de ações de educação popular em saúde”…
Aylê-Salassié Filgueiras Quintão*
Alexandre Quintas Filgueiras Quintão**
Sua tese de doutorado, “Um Sertão Chamado Brasil’, conquistou o maior prêmio em Sociologia, no Instituto de Pesquisa do Rio de Janeiro (Iuperj), e sua publicação ganhou uma 2ª edição. Tem um currículo acadêmico e uma obra, como gestora, de fazer inveja a qualquer intelectual e governante. Foi diretora da Casa de Oswaldo Cruz (1998-2005), unidade da Fiocruz, voltada para pesquisa e memória em ciências sociais, história e saúde.
Esta é a nossa ministra da Saúde, Nísia Trindade, a quem está prometido R$30,9 bilhões, em 2024, para o chamado PAC da Saúde – recurso sobre o qual tem sido cogitado, entretanto, cortes orçamentários significativos – para atender 3.500 unidades de saúde em todo território nacional. Contudo, um dos programas considerados mais importantes do Ministério é a colocação em campo, via SUS – Sistema Único de Saúde: Governos Federal, estaduais e municipais – de 181mil agentes populares de saúde para atender diretamente a 87 por cento dos municípios brasileiros.
Trata-se do programas intitulado AgPopSUS – Agências Populares do SUS, cujos propósitos são: constituir uma rede nacional de Agentes Educadores Populares de Saúde, comprometidos com o apoio ao SUS; fortalecer a participação popular em saúde em comunidades periféricas urbanas e rurais; incentivar as práticas tradicionais e populares de cuidados, valorizar a comunicação e a educação popular em saúde
Os selecionados receberão treinamento de curta duração em saúde preventiva. São pessoas com atuação dentro de organizações não governamentais, a maioria “alinhado ao governo Lula”, como o MST, MTPS, Levante Popular, Instituto de Transmasculinidade, Juventude do Terreiro, Articulação Nacional de Pescadores da Bahia, Movimento Negro Unificado, Pastoral da Juventude Rural, Associação Nacional de Preservação do Patrimônio Bantú, Brigadas Populares, Movimento de Adolescentes e Crianças, Movimento de Luta da Casa Própria, Frente Nacional Antirracista, Diretório Central de Estudantes de José Pinheiro, Isoporzinho das Sapatão e outros – não propriamente ONGs . Ao todo estão sendo aprovadas 400 organizações não governamentais, com perfil aproximado ao dos citados.
Segundo o Ministério da Saúde, a formulação do programa foi inspirada na formação de lideranças comunitárias e de movimentos sociais populares, que durante a pandemia de Covid-19, atuaram como Agentes Populares de Saúde no campo e nas periferias das grandes cidades.
É o PAC da Saúde, que não está nem aí para a alta das taxas de juros, a alta do dólar, as derrotas políticas no Congresso, o endividamento público, as turbulências no mercado financeiro. Os agentes atuarão diretamente nos territórios periféricos urbanos e rurais, “valorizando o protagonismo da sociedade civil organizada no desenvolvimento de ações de educação popular em saúde”, para o fortalecimento do SUS, e deverão contribuir para uma maior efetividade no cuidado em saúde e a melhoria da qualidade de vida”.
A ideia de promover o SUS – um dos programas de saúde mais admirados no mundo -parece ser muito boa e oportuna. Lembra os “Médicos de Pés Descalços”, da China, e os “Médicos sem Fronteiras” que atuam na África. Contudo, em época de eleição municipal dá para questionar as intenções não explícitas do programa, assim como foi o “Mais Médicos”, realizado, em conjunto, com Cuba, também outro belo programa de atendimento à saúde das populações excluídas do interior, mas de sentido politicamente pouco explícito.
Provocou protestos da classe médica brasileira, em sua maioria titulada em escolas de Medicina públicas e gratuitas. A saída dos médicos cubanos obrigou o governo a criar uma programa similar de saúde preventiva para o interior do Brasil, com profissionais formados por aqui mesmo e um número pequeno de outros vindos do exterior. No Brasil, as universidades passaram a dar mais atenção à saúde coletiva.
Ora, a professora Nísia é uma figura respeitável. Descobriu a “doença”, como principal característica das populações do sertão, acompanhando já o pensamento de Euclides da Cunha, do marechal Rondon, Noel Nutels, Darcy Ribeiro e outros que também discutiram, sem grandes resultados, o problema: “O sertão é doente”. Para acelerar processos de apoio à saúde, teria defendido também o uso de medicamentos ainda em fase experimental.
Conduzido, entretanto, pela professora Nísia, há quem reconheça as virtudes do Programa AgPopSUS , mas, ao mesmo tempo, levante dúvidas sobre as intenções políticas do governo petista, já que os 181 mil agentes em fase de credenciamento não são obrigatoriamente pessoas com conhecimentos profissionais (técnicos) no campo da saúde para atuar junto as populações. Faz lembrar muitos enfermeiros, parteiras, curandeiros, dentistas (há uma carência enorme no Brasil) práticos que atendiam (e ainda atendem) as populações isoladas do interior do País, condenados na Justiça, sob a acusação do exercício ilegal das atividades de saúde. Aparentemente, trata-se de uma reserva de mercado.
Explicitamente, contudo, é carência mesmo de atendimento à saúde na maioria dos municípios brasileiros, onde esses práticos são reconhecidos e tratados pelas populações como “dotô”. Em tempos mais remotos, essas populações isoladas no interior tinham nos barbeiros da cidade o seu médico. Na China reconhecem-se e praticam-se dois tipos de medicina: uma, resultante dos conhecimentos adquiridos nas escolas de medicina e saúde e outro medicina tradicional, surgida da experiência da população.
Já que temos o modelo chinês como parâmetro, é provável que, a partir das revelações (e denúncias) da professora Nísia, o modelo chinês no campo da saúde pode estar vindo por aí como solução imediata. É, no mínimo, um nicho, político ou de mercado, que a bem da verdade só mesmo o Partido dos Trabalhadores sabe descobrir …e explorar.
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Aylê-Salassié F. Quintão – Jornalista, professor, doutor em História Cultural, ex-guarda florestal do Parque Nacional de Brasília Vive em Brasília. Autor de “Pinguela: a maldição do Vice”. Brasília: Otimismo, 2018
Autor, entre outros, de Lanternas Flutuantes:
Português – LANTERNA FLUTUANTES, habitando poeticamente o mundo
Alemão – Schwimmende-laternen-1508 (Ominia Scriptum, Alemanha)
Inglês – Floating Lanterns
Polonês – Pływające latarnie – poetycko zamieszkiwać świat
novo livro de Aylê-Salassiê: TERRITÓRIO LIVRE!
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Alexandre Quintas Filgueiras Quintão** – Fisioterapeuta, gerente de projetos serviços em saúde preventiva.