trem

Se o investidor for uma empresa particular, o trem será obviamente de direita, coisa de capitalista; já se o investidor for o governo, o trem fica mais à esquerda. Na medida que beneficia o trabalhador, proporcionando-lhe transporte de boa qualidade por preço módico, estrada de ferro é certamente de esquerda; mas se trouxer bom lucro à empresa que construiu, será de direita…

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Estrada de ferro é de esquerda ou de direita? Numa época de polarização, em que todo detalhe tem de levar uma etiqueta, gostaria de saber de que lado fica o transporte ferroviário.

Se o investidor for uma empresa particular, o trem será obviamente de direita, coisa de capitalista; já se o investidor for o governo, o trem fica mais à esquerda. Na medida que beneficia o trabalhador, proporcionando-lhe transporte de boa qualidade por preço módico, estrada de ferro é certamente de esquerda; mas se trouxer bom lucro à empresa que construiu, será de direita.

Bom, acho que podemos ficar até o Natal alinhando argumentos pró e contra sem chegar a uma conclusão. Antes de perder o fio da meada, vamos ao fato concreto.

O governador de São Paulo, personagem cada dia mais difícil de classificar no espectro político, acaba de tomar decisões importantes, que apenas tangenciaram o crivo dos analistas. Doutor Tarcísio de Freitas, verdadeiro Dionísio gestado na coxa de Júpiter (aliás Bolsonaro), decidiu impulsionar o transporte sobre trilhos, modalidade que tem andado em baixa entre nós nos últimos setenta anos.

A construção de uma linha de metrô ou de uma ferrovia, por mais curta que seja, leva anos. Em geral, leva mais que um mandato de governador. Vai daí, o mandatário que inaugura a obra pronta dificilmente será o mesmo que iniciou a construção. Talvez esteja aí a principal razão do desinteresse oficial por esse modo de transporte. Embora a via férrea fosse mais interessante para o país, interesses de curto prazo levam à escolha da rodovia.

É admirável ver um governador em meio de mandato assinar contratos para 13 linhas de transporte sobre trilhos cobrindo 890 quilômetros no total. Pode-se apostar que nenhum desses projetos estará terminado antes do fim de seu atual mandato.

Não posso deixar de lembrar de um certo Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, que se aventurou a construir o primeiro trecho de ferrovia do território nacional, inaugurado no longínquo ano de 1854.

Se o Brasil tivesse tido, 170 anos atrás, um empreendedor com ideias semelhantes às do atual governador de São Paulo, talvez o Brasil tivesse se empenhado em construir uma malha densa de vias férreas, que teriam alavancado nosso desenvolvimento. Não aconteceu assim, paciência. Não adianta chorar.

Vamos torcer para que esse novo projeto siga adiante e chegue um dia ao fim. Até lá, quem sabe descobriremos se trem é de esquerda ou de direita.

Mas primeiro vamos ver se as obras terminam antes do dia de São Nunca.

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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos,  dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.

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