Hare Krishna é carro? Por Paulo Renato Coelho Netto
… – Ali, de alpargatas, bata e calça saruel laranja, cabeça raspada, rabo de cavalo meio punk, nariz riscado com tinta branca!…
Dois Hare Krishnas caminham sem pressa pela calçada, lado a lado, tipo Cosme e Damião, como eram chamadas as duplas de policiais militares que faziam a ronda a pé pelo centro da cidade. Falo para a minha filha:
– Que raridade. Hare Krishna, viu?
– Não vi. Cadê? Hare Krishna é carro?
– É gente!
– Onde?
– Ali, de alpargatas, bata e calça saruel laranja, cabeça raspada, rabo de cavalo meio punk, nariz riscado com tinta branca!
– Nunca ouvi falar. O que eles fazem?
– É uma religião, um tipo de seita. Algo na linha libertação pessoal, a eternidade da alma, reencarnação, Deus. Tem até um mantra bem conhecido.
“Hare Krishna, Hare Krishna,
Krishna Krishna, Hare Hare,
Hare Rama, Hare Rama,
Rama Rama, Hare Hare”.
– Se eu nunca vi um Hare Krishna, como conheceria o mantra?
– Tem uma música linda do George Harrison, My Sweet Lord, que no fim ele canta o mantra do Hare Krishna. É uma conversa dele com Deus. George Harrison, guitarrista dos Beatles!
– O Paul McCartney não envelhece. Impressionante!
– Sir James Paul McCartney, por favor, observo e continuo… Os Beatles tiveram uma fase Hare Krishna. Os anos 60 eram assim. Você precisa assistir Hair. Já falei para seu irmão assistir Hair. O mundo não começou no dia que vocês nasceram. Enfim, voltando, os Beatles tinham um guru Hare Krishna. Não lembro o nome. Foi mais ou menos nessa época que apareceu a Yoko e os Beatles começaram a deixar de ser uma banda para virar história. Quem ama os Beatles tem um pé atrás com a Yoko Ono.
– O Paul McCartney não envelhece por causa da música. A música faz isso com as pessoas, filosofa meu filho. E por falar em música, quem foi o maior músico da humanidade, o fera, pode ser a melhor banda, o maior irmão? pergunta do banco de trás do carro.
Silêncio total enquanto cada um pensa a resposta. Antes que eles falem eu digo em alto e bom som:
– Bach! Johann Sebastian Bach! Ninguém chega perto. Nem Beethoven, que era ranzinza. Bach é vida! É alegria! É transcendental. Foi o melhor compositor da humanidade. Já o melhor instrumentista foi o Paganini. Ninguém tocou um instrumento como Paganini tocou violino. Se estivesse vivo hoje seria um metaleiro, um bruxo, um cara que se tocasse em Woodstock faria o Jimi Hendrix colocar a guitarra num saco e ir para casa.
Minha filha solta uma gargalhada sonora e responde:
– Eu já ia falar One Direction.
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Paulo Renato Coelho Netto – é jornalista, pós-graduado em Marketing. Tem reportagens publicadas nas Revistas Piauí, Época e Veja digital; nos sites UOL/Piauí/Folha de S.Paulo, O GLOBO, CLAUDIA/Abril, Observatório da Imprensa e VICE Brasil. Foi repórter nos jornais Gazeta Mercantil e Diário do Grande ABC. É autor de sete livros, entre os quais biografias e “2020 O Ano Que Não Existiu – A Pandemia de verde e amarelo”.
