Acerte seu relógio. Por José Horta Manzano
Ideias havia, já desde a antiguidade. Mas a precisão não era lá muito confiável. Há controvérsia quanto à invenção do relógio tal como o conhecemos hoje. Os ingleses são reconhecidos por sua importante contribuição para aperfeiçoar o aparelho. Grandes navegadores, tinham necessidade crucial de uma medida confiável.
No tempo dos romanos, não havia relógio. Nem precisava. A passagem do tempo era marcada pelo sol, pelo canto do galo, pelo mugir das vacas. Sabia-se que era meio-dia porque o sol estava no ponto mais elevado. E isso bastava.
Assim continuou na Idade Média. Os viventes, em maioria analfabetos, não sabiam sequer em que ano estavam. E isso não tinha a menor importância. O tempo era ritmado pelo calendário litúrgico que os clérigos não deixavam de recordar.
Todos sabiam que era tempo de Quaresma, que domingo que vem é Pentecostes, que estava para chegar a festa da Ascensão, de São José, ou a da Imaculada. A hora do dia pouco importava.
Media-se a passagem de um tempo específico. Para os gregos, a clepsidra preenchia essa função. Seu parente, a ampulheta, continuou a satisfazer o mundo medieval. Para quem fizesse questão de ter uma ideia mais precisa das horas do dia, havia o relógio solar ― esse mesmo que ainda se pode observar no frontispício de antigos edifícios europeus. É verdade que só funcionava em dias de sol. Mas não havia outro jeito, que a técnica da época não permitia voos mais altos.
O problema começou a se agravar com as grandes navegações. Para medir latitudes, o sextante era suficiente. Mas como medir longitudes? Na falta de um relógio razoavelmente preciso, como saber que distância havia percorrido o barco e quanto faltava para chegar ao destino?
Ideias havia, já desde a antiguidade. Mas a precisão não era lá muito confiável. Há controvérsia quanto à invenção do relógio tal como o conhecemos hoje. Os ingleses são reconhecidos por sua importante contribuição para aperfeiçoar o aparelho. Grandes navegadores, tinham necessidade crucial de uma medida confiável.
Durante alguns séculos, o relógio embarcado nos navios resolveu o problema dos navegantes. E o mostrador redondo encravado na torre das igrejas foi suficiente para ritmar o dia a dia de vilas e vilarejos.
Lá por meados do século XIX, quando começaram a aparecer as primeiras ferrovias, a coisa se complicou. Antes disso, cada localidade era regulada pelo relógio de sua igreja. Contudo, os horários dos trens careciam de marcação uniforme da hora. Era impossível estabelecer horários se cada vilarejo seguia uma hora diferente.
Para encurtar a história, digamos simplesmente que o problema acabou sendo resolvido. A precisão cada vez maior dos relógios e o telégrafo ajudaram. A humanidade chegou ao século XX com uma hora, se não universal, pelo menos bem mais generalizada do que 50 anos antes.
Guerras são acontecimentos terríveis, sem sombra de dúvida. Mas são também períodos que favorecem avanços nas artes médicas, nas comunicações e na vida prática.
A Grande Guerra 1914-1918 trouxe penúria para os beligerantes. O petróleo, que já então começava a substituir o vapor e a mover o mundo, fez-se raro. A Alemanha, envolvida até o pescoço no conflito, não produzia uma gota sequer do precioso líquido. Medidas tiveram de ser tomadas para reduzir seu consumo doméstico, a fim de que sobrasse para uso militar.
Foi quando surgiu a ideia de instituir o horário de verão. A defasagem artificial entre a hora solar e a hora oficial seria benéfica para poupar combustível. A economia de eletricidade significaria, naturalmente, diminuição do gasto de petróleo.
Em 1916, os alemães foram os primeiros a oficializar o avanço dos relógios durante o período estival. Outros países apreciaram a ideia e, pouco a pouco, adotaram o sistema. Dois anos depois, os Estados Unidos já fariam sua primeira experiência.
A França discutiu, tentou, tergiversou, torceu o nariz, hesitou. A partir de 1940, ocupada pelas tropas alemãs, não teve como escapar. Enquanto durou a presença estrangeira, a cada verão os relógios tiveram de ser adiantados em uma hora. Depreciativamente, os franceses diziam que aquela era a heure allemande, a hora alemã.
O Brasil fez sua primeira experiência em 1931, quando Getúlio mandava no País. De lá para cá, houve outras tentativas esporádicas. A partir de 1986, a hora de verão foi oficializada. Tornou-se medida rotineira até ser abolida alguns anos atrás.
A Europa generalizou a medida em meados dos anos 1970. Desde então, às 2h da madrugada do último domingo de março, «perde-se» uma hora, ou seja, os relógios têm de ser adiantados. Essa hora nos é devolvida às 3h da madrugada do último domingo de outubro, a noite mais longa do ano.
A partir deste 31 de março, portanto, a Europa está um pouquinho mais distante do Brasil. Brasília está a quatro horas de Lisboa e a cinco de Madrid, Paris, Berlim, Roma.
Voltaremos a nos reaproximar no fim de outubro.
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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos, dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.
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Bom dia,Sr.Manzano no ano de 1080,aChina construiu o primeiro relogio mecanico.Obrigado.
Agradeço a meu culto e atento leitor!
Meu abraço