Educação ruim para gente pobre. Por Dagoberto Alves de Almeida
… Quase metade dos alunos brasileiros não termina o ensino fundamental na idade certa, ou seja, aos 14 anos, com a evasão e a reprovação atingindo mais os negros e os mais pobres…
Quase metade dos alunos brasileiros não termina o ensino fundamental na idade certa, ou seja, aos 14 anos, com a evasão e a reprovação atingindo mais os negros e os mais pobres. Outro exemplo do nosso péssimo sistema educacional é propagado internacionalmente na vexatória 65ª posição do Brasil entre 81 países participantes na mais recente edição do PISA, o maior exame de avaliação da educação no mundo. Em 2022, um total de 73% dos estudantes brasileiros de 15 anos não conseguiram fazer as operações aritméticas mais básicas. Em leitura a capacidade do aluno brasileiro entender a ideia central de um texto piorou, assim como em ciência. Esse quadro desolador continua no ensino médio pela incapacidade do nosso sistema de educação pública preparar adequadamente os estudantes, seja para lhes dar uma ocupação via cursos técnicos de segundo grau, seja para prepará-los para disputar vagas na universidade pública, apesar da bem-sucedida política de cotas. O resultado tem sido o fato de que falhamos como nação ao comprometer o trabalho, renda e cidadania de 1 em cada 3 jovens brasileiros de 18 a 24 anos que não trabalham e nem estudam.
A raiz básica do baixo desempenho escolar da maioria dos estudantes das escolas públicas está tanto no descumprimento do Plano Nacional de Educação (PNE) quanto nas sofríveis condições socioeconômicas das classes D e E (renda mensal domiciliar até R$ 2,9 mil). Portanto, não se trata de meramente alterar o PNE para adicionar tolices como o homeschooling que nada mais fará do que alienar nossos jovens do convívio social e comprometer ainda mais a desigualdade de gênero pela imposição de carga adicional às mulheres que como mães ainda precisam trabalhar para o sustento de suas famílias, mas de implementá-lo com os recursos necessários para tal. Esse arranjo pernicioso de ineficácia na implementação do PNE e de excessiva desigualdade socioeconômica cobra um preço altíssimo que se traduz com o fato do Brasil ocupar a desonrosa 14ª posição como o mais desigual do planeta.
Desigualdade é o elemento singular mais impactante a impedir educação de qualidade. Qualidade que depende de instrumentos como, por exemplo, as escolas de educação integral e o programa Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa. Ambas, políticas que podem contribuir sobremaneira para minorar os males crônicos da educação brasileira.
Outra iniciativa, a reforma do ensino médio, embora bem-intencionada — já que do jeito que estava não podia continuar — não resolve a necessidade de aprendizagem nos conteúdos básicos tradicionais como ainda traz novos problemas, tais como o excesso de carga horária escolar exigida pelos novos conteúdos e a falta de preparo dos professores para neles se adequarem.
O que o país precisa, de fato, para um salto de desenvolvimento social e econômico é uma educação humanista que não desconsidere os conteúdos tradicionais para ampliar as possibilidades de entendimento e análise dos nossos jovens. Mais do que isso, educação que não está alheia ao mundo atual com suas oportunidades e desafios. Assim, por exemplo, biologia deveria incluir conteúdos de educação sexual de tal forma a permitir que nossos adolescentes saibam como se prevenir de doenças sexualmente transmissíveis e de gravidez indesejada. Da mesma forma, o ensino de ciências não pode desconsiderar o impacto das mudanças climáticas em um contexto de educação ambiental da mesma forma que matemática pode lançar mão de um básico de educação financeira.
Depois do desastre do governo anterior em que até recursos da educação foram desviados via propina em ouro, compra de bíblias e dinheiro vivo escondido em pneu, a esperança é que o governo atual que tem o MEC sendo dirigido por quem revolucionou a educação pública no Ceará, replique esse caso de sucesso para todo o ensino fundamental e médio do país.
Os recursos existem é só uma questão de priorização que esperançosamente poderia, por exemplo, reverter os bilhões das emendas parlamentares para a construção e manutenção de escolas, para equipá-las adequadamente e para a capacitação de professores nesses velhos e novos desafios. Simples assim!
O fato insofismável é que educação ruim contribui para a pobreza, a qual é decorrente da desigualdade. Então, faz sentido verdadeiramente patriótico investir na redução da desigualdade por meio da educação de qualidade para todos os brasileiros.
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– Professor Dagoberto Alves de Almeida – ex-reitor da Universidade Federal de Itajubá -UNIFEI – mandatos 2013/16 – 2017-20
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