FELIZ

Feliz Ano… antes de publicarem suas próximas postagens venenosas, tenham um pouco de bom senso e caráter, evitando incitar ódios e propagar preconceitos, deliberadamente colocando lenha na fogueira.

Anos atrás fui a inauguração do Museu Stefan Zweig em Petrópolis. Ele fica na casa em que o escritor austríaco se suicidou ao lado de sua esposa no dia 22 de fevereiro de 1942, deprimido com a guerra e a situação dos judeus em meio a esse trágico conflito. Me questionei o porquê de ato tão desesperado da parte desse autor reverenciado em todo o mundo.

Com o fim do ano de 2023, compreendo um pouco o fosso emocional em que Stefan se encontrava. Do alto de sua casinha, encarapitado num morro da minha adorada Petrópolis, ele vislumbrou o triste espetáculo da humanidade se dilacerando.

O tempo passou, mas o mundo pouco mudou. Continua sendo um planeta habitado por uma quantidade incomensurável de pessoas cegas de ódio e preconceito.

Há poucos dias comemorei meu aniversário e a única vantagem de se ficar mais velho é que a gente consegue olhar a nossa volta com olhos mais críticos e menos ingênuos. O que vemos não faz nossas noites mais tranquilas. Acordamos de madrugada, vítimas de uma lucidez assustadora.

Tem sido doloroso ler comentários e postagens de pessoas de quem gosto e de algumas que até admiro escrevendo sandices relativas à Israel, ao sionismo, aos judeus e a esse conflito trágico que está acontecendo por lá.

A falta total de objetividade e perspectiva histórica é o que mais dói. Gente bem-intencionada que resolve vociferar como arautos da justiça, sem se olhar no espelho e identificar a imagem dos padres medievais incitando a turba ignara a invadir o gueto e trucidar os judeus.

Não importa o quanto sejam “bem-intencionados”, o quanto estejam legitimamente compadecidos da sorte dos civis palestinos “massacrados pela sanha assassina dos israelenses”… Eles simplesmente e efetivamente estão repetindo o papel de todos os deflagradores de pogroms e massacres que os judeus sofreram nos últimos 2000 anos. E, como esses, cada gota de sangue judeu que foi e será derramado pesará inevitavelmente de forma carmática sobre eles.

O mais dramático disso tudo é que o mundo não judeu não compreende que Israel está lutando não somente contra o Hamas, ou o Hezbollah. Israel está lutando por sua própria existência. Qualquer conflito de Israel com seus vizinhos sempre foi e continuará sendo uma luta de vida ou morte.

Algum de vocês já se deram ao trabalho de olhar o mapa da região? Se não o fizeram, façam. Vejam o tamanho de Israel e dos seus vizinhos árabes, a maioria ainda sem nenhum tratado de paz oficial com Israel (Israel assinou somente com Egito e Jordania)…

Israel é um pouco maior do que o estado de Sergipe (o menor estado do Brasil). Imaginem os sergipanos tendo que enfrentar o resto dos brasileiros numa guerra. Dois milhões de sergipanos contra o resto dos duzentos milhões de brasileiros.

A noção de que os judeus são culpados por boa parte dos problemas do mundo antigo e moderno, é pra lá de estupida. É tão ridícula quanto achar que a terra é plana.

Hoje em dia existem apenas 15,2 milhões de judeus no mundo, 0,2% da população mundial, que gira em torno de 8,1 mil bilhões de pessoas. O equivalente de uma formiga ameaçando uma manada de elefantes…

Chegamos então na falácia de que Sionismo é sinônimo de colonialismo, a moda do momento.

O direito de um povo à autodeterminação é um princípio fundamental do direito internacional moderno, defendido como tal pelas Nações Unidas. O conceito aceito é que os povos têm o direito de escolher livremente a sua soberania e o seu estatuto político internacional, sem interferência. Esse conceito foi expresso pela primeira vez no século 19 e após a Primeira Guerra Mundial, foi encorajado tanto pelo primeiro-ministro soviético Vladimir Lenin quanto pelo presidente dos Estados Unidos Woodrow Wilson.

Em 1920 existiam cinquenta países independentes. Hoje, são quase duzentos. Uma das forças motivadoras por trás desta onda de criação de países foi autodeterminação – o conceito de que nações (grupos de pessoas unidas pela etnia, língua, geografia, história ou outras características comuns) deveriam ser capazes de determinar o seu futuro político. Todos os povos têm esse direito, não? Mas os judeus não. Ao fazer valer esse direito, são acusados de colonialistas e invasores…

FELIZOs judeus são um grupo unido por etnia, língua, história e outras características comuns. Ah, mas faltava geografia… Os detratores de Israel acusam os judeus de não ter laços reais com o território que “escolheram” para sua terra prometida. Será que eles não tem mesmo?

Que outro povo tem a sua história contida no maior bestseller de todos os tempos, cujo conteúdo fala de como eles surgiram e viveram nessa terra de seus antepassados? Um livro que serviu de base as duas mais importantes religiões do mundo atual – o cristianismo e o islamismo. O tal livrinho chama-se a Bíblia. Pode ler, está tudo lá.

Mas os judeus saíram de lá há mais de 2 mil anos… Saíram? O fato é que judeus permaneceram em Israel mesmo depois da destruição do segundo templo em 70 E.C. Depois de suprimir as últimas revoltas judaicas, os romanos permitiram que um centro judaico permanecesse na Galileia. Foi nessa região que importantes decisões rabínicas e literárias judaicas aconteceram ainda na idade média, indo até meados de 400 E.C.

Historiadores atuais garante que os judeus constituíam a maioria da população até a conquista muçulmana do século VII em 638. Conquista esta feita na ponta de espada – quem não se convertia, morria.

Em 1099 os cruzados reconquistaram Jerusalém e no processo massacraram muitos habitantes, tanto muçulmanos como judeus. Os que sobreviveram, envolveram-se no comércio das cidades costeiras. Nessa época havia comunidades judaicas espalhadas por todo o país.

Em 1187 o sultão Saladino derrotou os cruzados retomando Jerusalém e convidou os judeus a retornarem.

E, em 1517, o Império Otomano conquistou a região e houve imigração judaica em massa. A comunidade judaica era composta tanto por descendentes de judeus que nunca haviam deixado a terra, quanto por migrantes judeus da diáspora.

Em 1610 a Sinagoga Yochanan Ben Zakai em Jerusalém tornou-se a principal sinagoga dos judeus sefarditas e em 1714, o pesquisador holandês Adriaan Reland publicou um relato de sua visita à região e registrou diversos centros populacionais judaicos por lá.

Ao longo do século XIX até a década de 1880, judeus asquenazes da Europa Oriental, bem como grupos de judeus sefarditas da Turquia, Bulgária e Norte da África imigraram para a lá e no início do século XX, dezenas de milhares de imigrantes judeus começaram a chegar. Noventa mil acres de terra foram comprados (não roubados) por judeus e começou o renascimento da língua hebraica na região.

Em 1917 foi o fim do Império Otomano e a região ficou sob o domínio dos britânicos até 1948, quando o Estado Judeu foi proclamado e os Palestinos abriram mão de proclamar o seu, como havia sido combinado com a ONU.

Detalhe: até Fake-News foram postadas recentemente afirmando que os judeus que foram viver no estado de Israel a partir de 1948, não descendiam dos judeus originais. Como se a falta de um DNA judaico ancestral fosse mais importante do que o direito desses judeus se autodeterminarem como tais… O fato é que as pesquisas de DNA atuais mostram exatamente o oposto. Os judeus de hoje são os mesmos de ontem.

E mais. Certo dia em Israel, nos anos 70, quando morava lá e trabalhava como correspondente, ouvi uma interessante reportagem na ‘Kol Israel’, rádio pública israelense que era bastante intelectualizada. O programa contava dessa aldeia palestina cujos pesquisadores achavam interessante a forma como eles se referiam aos judeus. Em árabe esses palestinos chamavam os judeus de primos. Os pesquisadores entrevistaram os residentes. Queriam saber se o costume deviasse ao fato de que, segundo a Bíblia, árabes e judeus descendiam de Abraão. Ao que os habitantes da tal aldeia responderam: “Não, nós somos primos porque no passado fomos judeus”. Quando a ‘gentil’ onda islâmica varreu a região nos anos 600 E.C. convertendo todo mundo a força, eles deixaram de ser judeus e passaram a ser mulçumanos, mas guardaram a memória de seu passado “genético”.

Seja como for, se deixarmos passar sem comentários o slogan de “do rio ao mar”, teremos então que assumir que os judeus que não forem nadar no mediterrâneo a caminho da Europa (engrossando os milhares de refugiados que já assolam a região), terão que, de um jeito ou de outro, abandonar Israel porque não passam de um bando de “invasores colonialistas”.

Quem assinar embaixo dessa noção, deve também, por uma questão de justiça e ética, avisar a toda a população brasileira que veio da Europa, Asia, África e demais regiões após o descobrimento do Brasil, que eles terão que partir e devolver a terra a seus legítimos e originais moradores, os índios.

O mesmo será exigido do resto dos países latino-americanos, assim como do Estados Unidos e Canada. Certo? Não importa quantas gerações já passaram desde a inominável invasão colonialista desses territórios. A turma da África do Sul também não vai ficar feliz com isso.

Deixando as ideias idiotas de lado e a falta de noção das turbas vociferantes e sanguinárias, o maior problema dessa situação toda é a dificuldade de uma perspectiva clara.

Apesar da realidade ser transparente, as pessoas parecem estar – de ambos os lados – olhando para ela através das lentes distorcidas da emoção. Uma emoção, em boa parte, envenenada por mentiras e conceitos falsos de que o judeu é um ser pernicioso por natureza. Com isso os palestinos em oposição acabam ficando com o papel maniqueísta dos ‘bonzinhos’. Ninguém é santo, nem demônio nessa história.

A verdade é que, os palestinos têm seus motivos e suas demandas são justas. Mas os judeus também têm as suas. Ambos os povos não almejam a posse daquela região por ser plena de petróleo, ouro ou qualquer outra riqueza que não seja seu amor a aquela terra.

Existem lugares pelo mundo cujos governos ficariam satisfeitos de ver populados. Tanto que oferecem toda sorte de incentivos econômicos para quem quiser se mudar para lá. Além de que o contribuições bilionárias aos palestinos (cujos líderes do Hamas usam para viver nababescamente longe de Gaza) e a capacidade comercial e criativa de Israel também gera bastante capital. Esses dois grupos nacionais poderiam facilmente comprar terras em inúmeras partes do planeta. Mas ambos os povos querem porque querem aquela nesga de terra seca, maltratada e mal localizada que é Israel/Palestina. Então antes de dizer asneiras sobre “colonialismo” e “invasores”, pensem nesses fatos.

E, por favor, antes de publicarem suas próximas postagens venenosas, tenham um pouco de bom senso e caráter, evitando incitar ódios e propagar preconceitos, deliberadamente colocando lenha na fogueira. Admita as limitações de seus conhecimentos sobre a complexidade do assunto e deixem os envolvidos buscar um caminho de negociações e, quem sabe, paz.

Se puder, ajude a termos realmente um maravilhoso e fraterno ano novo.

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WLADIMIR WELTMAN – é jornalista, roteirista de cinema e TV e diretor de TV. Cobre Hollywood, de onde informa tudo para o Chumbo Gordo

_________________________(DIRETO DE LOS ANGELES)

2 thoughts on “Feliz (?) Ano Velho. Por Wladimir Weltman

  1. Texto excelente e muito esclarecedor para quem não conhece a verdade sobre o assunto. Parabéns pela clareza e precisão. Espero que seja bastante lido e divulgado, pois estamos num momento triste e complicado, no qual ninguém ouve mais nada.

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