Cronista: artista das palavras. Por Adilson Roberto Gonçalves

… Espaços plurais não deveriam se preocupar com o cronista, que reflete seu tempo dentro do espaço que lhe é concedido. Deixem o trabalho com os investigadores literários que, muitas vezes, não encontram a distinção entre crônica e conto…

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Magistral, ainda que curta, a entrevista que Mário Prata concedeu ao caderno Ilustrada, da Folha de S. Paulo, em 15/11. Bom saber do novo livro que está em curso, e a forma como ele analisa do trabalho do filho Antonio, também cronista. Mas fica a dúvida naquilo que ele classificou como cronistas clássicos, pois dali ficaram de fora alguns nomes importantes, que parecem não ser assim entendidos pelo escritor: Machado de Assis e Lima Barreto foram excelentes cronistas de um tempo em que o rótulo talvez nem existisse. E olha que há muito material inédito deles sendo descoberto, assinados sob pseudônimos. Falei um pouco sobre esse assunto em palestra sobre Lima Barreto na Academia Campineira de Letras e Artes, mencionando que a crônica pode estar em desuso.

O artigo de opinião, como este aqui, é bem diferente da crônica. Ainda que falando de crônica, é um artigo de opinião por não se limitar aos acontecimentos cotidianos. Espaços plurais não deveriam se preocupar com o cronista, que reflete seu tempo dentro do espaço que lhe é concedido. Deixem o trabalho com os investigadores literários que, muitas vezes, não encontram a distinção entre crônica e conto. A opinião, por vezes, é perigosa, especialmente se propalada por quem não possui lastro ou que se baseia na comprovada mentira. Ou então no negacionismo. Aquele mesmo jornal já mencionado abriu espaço para o criminoso ambiental, que foi ministro da área no governo passado, discorrer sobre o mercado de carbono. Pluralidade tem limites! Dar espaços para um criminoso ambiental falar de política e economia do setor é um acinte! Tudo para defender uma desastrosa e devastadora administração da qual nos livramos por estreita margem. Daqui a pouco, neonazistas terão espaço junto aos racistas.

O artista às vezes decepciona, nem tanto pela mudança de estilo, se varia da crônica ao artigo ou ao conto, mas pela traição à constituição moral em que acreditávamos ele estava erigido. A mesma Folha de S. Paulo perguntou recentemente a seus leitores qual tinha sido essa decepção. Para mim, a maior decepção foram os artistas brasileiros que aparentavam ser progressistas, vanguardistas, defensores de boas causas sociais, e se revelaram negacionistas e adeptos da extrema direita. Citar algum nome é deixar muitos de fora da lista, que, infelizmente, é grande.

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Perfil ambiental e político – Adilson Roberto Gonçalves –  pesquisador da  Universidade Estadual Paulista, Unesp, membro de várias instituições culturais do interior paulista. Mantém o Blog dos Três Parágrafos. Vive em Campinas.

 

 

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