paz na palestina

É possível a paz na Palestina? Por Charles Mady

Sociedades cultas deixam se penetrar pelas piores irracionalidades, sem limites, que nossa pretensa civilização permite aflorar sem qualquer tipo de censura eficiente. Aqui, a força vence a razão.

Palestina - PAZ

A guerra que assistimos no Oriente Médio se estende há décadas, sem que a humanidade, e os habitantes da região, consigam pelo menos iniciar um processo em direção à paz. Sectarismos, racismos violentos e intolerâncias extremas chegaram a um nível poucas vezes atingido na história da humanidade.

Conflitos anteriores ao redor do mundo ainda não nos ensinaram os extremos que o ódio e a ambição atingem. Sentimentos perigosos e destrutivos, que podem nos levar à irracionalidade, que mostram o quanto as sociedades não estão preparadas para conviver com um mínimo de harmonia. Diálogos, que deveriam nos levar à compreensão e soluções, hoje são substituídos pela selvageria que assistimos diariamente.

Sociedades cultas deixam se penetrar pelas piores irracionalidades, sem limites, que nossa pretensa civilização permite aflorar sem qualquer tipo de censura eficiente. Aqui, a força vence a razão.

Assistimos guerras mundiais prévias, e tantas outras, que nos levam a pensar que guerra está atavicamente ligada ao animal humano, como muitos pensadores preconizam. É só abrir um livro de história para se chegar à essa conclusão, observando, tal e qual no Coliseu de Roma, matanças indescritíveis. Sempre se imaginou que a humanidade tivesse sido criada para aprender a evoluir. Não é o que observamos, apesar das inúmeras crenças e religiões existentes, que infelizmente não acompanham o crescimento das tecnologias.

Quando lemos reportagens, assinadas ou não, na imprensa leiga, que deveriam sempre dar espaço a todos os lados, notamos os malefícios de opiniões radicais, fanáticas, bem recebidas por segmentos sectários da sociedade, que se dedicam a difundir suas “verdades”, sem um mínimo de crítica construtiva. Algumas retratam palestinos como ratos. A mesma autora teria coragem em retratar israelenses como porcos?  São jornalistas mantidos para “ fazer as cabeças” dos leitores e aumentar as discórdias, e ódios. É um jogo sujo de interesses para destruir o “outro”.

Entendo perfeitamente que as divergências existem, e devem existir, para nos levar a entendimentos. Hoje, se as divergências se exacerbarem, são resolvidas com guerras. Compreendo a existência de algumas delas, mas o que assistimos hoje é consequência de ódios patológicos. Massacres, vinganças, selvagerias, bombardeios indiscriminados tornaram-se um lugar comum, muitas vezes estimulados de forma doentia.

Não adianta repetir que o ser humano é assim. É assim em sociedades que podem ser cultas, porém incivilizadas. Acredito na consciência universal, que ainda está latente nesta fase de nossa pretensa evolução, cuja função é domesticar esses sentimentos, presentes em todos nós. Isso tudo é dito para ilustrar o mau exemplo que nossos patrícios estão dando no Oriente Médio, que é o berço da civilização. Provam que é fácil fomentar sectarismos, que levam a guerras. Lendo as diferentes fontes de informação, podemos entender como chegamos a isso. Estudando a juventude hitlerista, notamos o quão fácil é “educar” a sociedade para o fanatismo. Quem nunca se empolgou na infância com um texto radical? Em nosso país, e no mundo todo, temos inumeráveis exemplos de tiranos que convenceram multidões, despertando o que de pior há no ser humano.

Hoje, o exemplo maior vem do Oriente Médio, que é o berço das religiões monoteístas, deturpadas a tal ponto que seus representantes aceitam as barbaridades que seus discípulos praticam. Textos, escritos por não sei quem, viram leis de vida e morte e, se contestados, levam a reações violentas com excomunhões, banimentos, fogueiras e massacres, praticados e tolerados em nome de “deus”. Se ele existir, e acredito nele, não deve estar satisfeito com as suas criaturas.

Como povos, que tanto fizeram pela humanidade, podem atingir esses níveis de desumanidade? Será que é tão difícil conviver com o diferente em crenças, cor de pele e hábitos? Não deveríamos ser nem santos, nem demônios. Mas será que é tão difícil abrir uma porta por meio do diálogo?

É o que seus livros preconizam, mas as lições estão sendo difíceis de serem aprendidas. E quanto mais passa o tempo, mais o problema se aprofunda, com interesses materiais e radicais cada vez mais presentes, envolvendo países os mais diversos pelo mundo. Será que essa dificuldade de diálogo e respeito é natural do ser humano? Nossa realidade se esforça para demonstrar que sim, indo contra qualquer tipo de intenção construtiva.

Não há otimismo em futuro próximo nessa região. Acredito que a única forma de solução esteja com a formação de dois estados, mesmo que o mundo seja obrigado a impor esse caminho. Talvez assim, esses povos aprendam a dialogar, a se entender, com o passar do tempo, antes que se destruam.

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–  Charles Mady,  Médico e Professor associado do Instituto do Coração (Incor) e da Faculdade de Medicina da USP

charles.mady@incor.usp.br

 

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