Estamos fritos. Por Antonio Contente
O que acontece é que, por qualquer ângulo que você pegue nossas vidas, estamos fritos. Em alguns casos, como no político, por exemplo, apenas mais ou menos metaforicamente. Porém, no que se refere à violenta degradação do meio ambiente, com o mundo apodrecendo de forma apressada, segura e inapelável, literalmente. Sinto que estamos no meio de uma enorme frigideira que se equilibra sob densas labaredas que começaram bruxuleantes; mas hoje crepitam com vigor de fazer gargalhar um carnavalesco bloco de capetas.
A deterioração ambiental começou há tempos, e até recordo a famosa frase do poeta, talvez Paulo Mendes Campos, que garantiu estar no princípio do mundo o fim do mundo. Da mesma forma que o fim do amor também estaria no seu começo. Apesar de não ser nenhum dinossauro, testemunhei tempos em que aqui por Campinas ainda havia invernos. Lembro: em anos não tão remotos, início dos setenta, atravessei o Largo do Rosário por inúmeros junhos a envergar grossos sobretudos, sob frios glaciais como fiapos do iceberg que mandou o “Titanic” para a sua agora devassada sepultura. Hoje o nosso inverno está completamente desmoralizado a ponto de saber de amigos que, na estação que terminou faz pouco, fritaram ovos no asfalto sob o sol que lambe a aprazível Chácara da Barra.
Mas o calor, amigos, é tão somente um dado, do qual os muitos que morreram assados no verão europeu tendem a se tornar apenas detalhes. Muitos rios já estão podres, outros apodrecem a passos largos, a floresta amazônica caminha para o espaço, e quem pensa que o mar permanece incólume às agressões cai em ledo engano – as sujeiras atiradas às suas águas estão a envenenar a vida submarina, isso sem falar que a pesca predatória vem acabando, de forma veloz, com vários tipos de pescado. Logo logo atuns e bacalhaus, apenas para citar dois exemplos, serão nada mais do que retratos nas paredes. Igualmente aos versos de Drummond, doerão sim. E doerão muito.
Para encerrar essas simples e simplórias reflexões sobre o fim que nos espera, não para daqui a 70 ou 100 anos, mas para já, parece que estou vendo a sisuda figura do meu amigo Edney Bueno curvado sobre as águas do rio Atibaia, em cujas margens vive, a catar, lata de cerveja numa das mãos, e um puçá na outra, algum remoto, longínquo, improvável lambari. Antes de colocar estas palavras no computador, disse a ele que o faria.
— OK – respondeu — fale do que quiser quando estiver escrevendo, mas não esqueça do lixo.
É verdade, onde depositam as muitas toneladas do que sobra já não diria de metrópoles como São Paulo ou Nova York, mas aqui mesmo de Campinas? Você sabe? Olha, eu, sinceramente, não sei. Todavia, o fedor do chorume dentro em pouco começará a bailar nos nossos ventos para penetrar em nossas ventas. Francamente, me desculpem, mas eu não dou um tostão furado pela posteridade.
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ANTONIO CONTENTE –
Jornalista, cronista, escritor, várias obras publicadas. Entre elas, O Lobisomem Cantador, Um Doido no Quarteirão. Natural de Belém do Pará, vive em Campinas, SP, onde colabora com o Correio Popular, entre outros veículos.
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