Sina. Por José Horta Manzano
… Esse estreitamento dos canais de informação dificulta o aparecimento e a ascensão de novos candidatos, enquanto favorece a reeleição dos nomes mais conhecidos. Para as presidenciais de 2022, o quadro se delineia cada dia com maior nitidez.
Internet e redes sociais têm seu lado bom. Se assim não fosse, não teriam conquistado tantos adeptos. A informação instantânea (que hoje convém dizer “em tempo real”) é bom exemplo dos benefícios.
Nos tempos de antigamente, um meio muito utilizado de transmitir informação era o “telefone sem fio” ou “boca a boca”. Não era sofisticado, mas tinha sua graça. Logo após ter se inteirado de uma notícia, a gente corria pra informar algum conhecido.
– Você soube da novidade?
– Não. O que é que foi?
Neste ponto, o bom da coisa era contar o que tinha ocorrido e parar pra observar a cara de espanto do interlocutor. Era uma sensação impagável.
– Noooossa! Não diga!
– Digo, sim. E digo mais.
E aqui se acrescentava algum comentário pessoal. Como se sabe, quem conta um conto aumenta um ponto.
E assim seguia. Terminada a conversa, cada um seguia seu caminho pra continuar a espalhar a notícia.
Diálogos assim, hoje, são mais raros. Com o celular sempre no bolso, (quase) todos ficam sabendo de (quase) tudo ao mesmo momento. Não tem mais graça perguntar “– Soube da novidade?”. Normalmente, a resposta será “– Soube, sim.”
Nem tudo, porém, é cor-de-rosa. Há gente que exagera na dose e tem nas redes sociais seu único canal de informação. Não é o caso do distinto leitor, naturalmente, visto que chegou a este blogue caminhando com as próprias pernas. Está ficando cada vez mais raro ver gente que usa as próprias pernas para andar; muitos por aí andam caminhando com as pernas alheias. Parece cômodo, mas pode ser nocivo a longo prazo. Massa cinzenta pouco utilizada acaba se atrofiando.
Essa dedicação exclusiva e em tempo integral às redes pode causar distorções em certos momentos. Em política, na hora de escolher candidato para eleição majoritária (presidente, governador, prefeito), esse hábito trabalha contra o eleitor, visto que limita sua liberdade de escolha.
A frequentação permanente das redes acaba por fagocitar outros canais de comunicação que costumavam ser usados entre candidatos e eleitores. Debates, por exemplo, em que cada pretendente tem ocasião de expor as próprias ideias, estão em processo de rápida perda de importância.
Esse estreitamento dos canais de informação dificulta o aparecimento e a ascensão de novos candidatos, enquanto favorece a reeleição dos nomes mais conhecidos. Para as presidenciais de 2022, o quadro se delineia cada dia com maior nitidez.
Um terceiro candidato, fora do binômio Lula x Bolsonaro, tem pouca chance de se fortalecer eleitoralmente. Esses dois personagens são tão conhecidos, que um terceiro será naturalmente menos popular do que eles. E terá menos espaço nas redes, o que limitará suas chances de sucesso.
Salvo acontecimento extraordinário, os dois nomes que o país inteiro conhece – o do ex-presidente (e ex-presidiário), e o do atual presidente (e futuro presidiário?) – têm todas as chances de aparecer na cédula do segundo turno.
Eta carma pesado, o nosso!
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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos, dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.
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