Cadeia pra quem xingar. Por José Horta Manzano
… É precipitado e desnecessário entrar com esse projeto imediatamente. O Brasil tem outros problemas mais sérios a resolver…
Essa história de o governo arquitetar projeto de lei aumentando para 40 anos a pena de prisão para quem for condenado por ter “atacado” o presidente ou algum ministro do STF ou o chefe de uma casa do Legislativo me deixou encafifado.
Em princípio, não se deve legislar na rabeira de um escândalo recente. Em geral, passado o clamor popular, percebe-se que a lei foi longe demais, por ter sido feita sob medida como resposta a um determinado delito. Nem sempre é adequada para todas as situações do mesmo espectro.
A recente agressão denunciada pelo ministro Alexandre de Morais contra sua família num aeroporto de Roma gerou uma onda de reprovação na República. Fica evidente o elo entre o projeto do Executivo e o desassossego criado pelo episódio do aeroporto. Não faz sentido propor uma lei no calor da emoção.
A impressão que me dá é que o lulopetismo está aproveitando o clima de indignação, já levantado pelo 8 de janeiro e agora reforçado pelo ataque ao ministro, para avançar algumas casas na implantação do projeto autoritário do partido.
Se há um ponto em que as ideologias petista e bolsonarista se dão as mãos, é exatamente este: a fantasia de um chefe supremo forte, autoritário, inatacável, seguido fiel e cegamente pela totalidade dos súditos. Me parece claro que o objetivo do projeto de lei é, em primeiríssimo lugar, blindar o presidente da República, o chefe soberano.
Com a nova lei, que o protege mesmo de ataques verbais, ele estará tranquilo durante todo o mandato e até depois. A extensão das mesmas garantias aos membros do STF e aos chefes do parlamento parece mero afago a essas instituições.
É precipitado e desnecessário entrar com esse projeto imediatamente. O Brasil tem outros problemas mais sérios a resolver.
A legislação que temos é suficiente para intimidar cidadãos que se dispuserem a atacar figurões de primeira linha. Basta aplicar a lei. Se os três agressores de Roma imaginassem qual seria a repercussão e quais seriam as consequências de seus atos, certamente teriam passado reto pelo ministro, sem ao menos fixá-lo nos olhos.
Esses comportamentos exaltados e incivis fomentados por Jair Bolsonaro estão em nítido declínio. Se ainda pipocam aqui e ali, é por inércia. Mais um pouco de paciência e irão para o baú do esquecimento, lá fazer companhia a seu criador.
Se nossos congressistas estiverem alerta, essa lei não passa. Suas segundas intenções são demais evidentes. Vamos ver se são espertos.
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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos, dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.
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