Lula… ambíguo? Por José Horta Manzano
… O dicionário esclarece que “ambíguo” é o que desperta dúvida, que admite interpretações diferentes e até contrárias. O comportamento de Lula com relação a qualquer ditadura não é nada ambíguo – é constante, claro e cristalino…
Li ontem um artigo que discorria sobre a relação mantida por Lula com ditaduras mundo afora, em especial com as latino-americanas. Não contesto o pensamento do autor, o que me incomoda é o título: “Lula é ambíguo com ditaduras”. Não é descrição adequada.
O dicionário esclarece que “ambíguo” é o que desperta dúvida, que admite interpretações diferentes e até contrárias. O comportamento de Lula com relação a qualquer ditadura não é nada ambíguo – é constante, claro e cristalino. Desde quando ele fundou o Foro de São Paulo, trinta anos atrás, sua posição não se moveu nem um milímetro. Todo regime ditatorial desperta sua simpatia.
Há que partir do princípio de que ditadura é ditadura, sem essa de “ditadura de esquerda” ou “ditadura de direita”. Quando se suprimem os direitos dos cidadãos a escolher seus representantes de forma justa, quando a imprensa livre é cerceada ou suprimida, quando a liberdade de ir e vir é entravada, tanto faz que o ditador se proclame de “direita” ou de “esquerda” – sempre ditadura será.
Lula nunca deu o menor sinal de ambiguidade nesse sentido. Nunca escondeu suas simpatias. Com grande desenvoltura, ele outro dia recebeu em palácio o mandachuva da Venezuela.
Ao regressar do Vaticano, pediu, com indisfarçada hipocrisia, que o ditador da Nicarágua libertasse “o bispo”, transmitindo assim um recado do papa. Digo que foi atitude hipócrita porque o mundo inteiro está sabendo que dezenas de membros do clero estão atrás das grades naquele país, todos perseguidos por serem religiosos. Lula, o falso humanista, só falou do “bispo”, com certo enfado, como se os demais não existissem.
A admiração que Luiz Inácio sente por autocratas é forte. Se ainda não foi visitar meia dúzia deles – Putin, Maduro, Ortega, os sucessores dos bondosos irmãos Castro – é porque assessores devem tê-lo retido pela manga.
Não é possível perceber ambiguidade na simpatia que nosso presidente demonstra por ditadores e autocratas em geral. Os Estados Unidos, por seu lado, são o fantasma que vem assombrando sua vida desde a juventude. A forte antipatia que Lula sente pelo grande irmão do norte é palpável, impregnada, inalienável.
Talvez seu cérebro ressentido veja, na proliferação de ditadores ao redor do mundo, uma forma de afrontar e abalar o país detestado.
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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos, dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.
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