Verdades inoportunas. Por Charles Mady
… o mundo observa quieto essas verdades inoportunas, de forma hipócrita, por se tratar de um povo que sofreu, e que se tornou inatacável, acima de qualquer crítica.
Punições coletivas. Demolições de residências. Pogroms. Limpeza étnica. Incêndio proposital de vilas. Supremacismo. Racismo. Apartheid. Deir Yasin. Tantura. Jenin. Hawara, assassinatos seletivos. Indiferença às leis internacionais. Termos, palavras, frases, situações comprovadas por diferentes órgãos de direitos humanos, mas raramente escritas ou comentadas por nossa imprensa .
Durante décadas, lemos e ouvimos informações detalhadas sobre o terrorismo palestino, condenável em todos os sentidos. Pouco se lê sobre o terrorismo israelense. Mas, até hoje, todos os palestinos são tratados como terroristas, desde o nascimento. Políticos israelenses se referem a eles, em discursos oficiais no Knesset, com esses termos. São todos terroristas, e não palestinos. Será que nascem terroristas, ou encontram um caldo de cultura próprio para se tornarem violentos? Não desculpo seus atos, que já condenei em textos anteriores. Mas entendo a gênese de suas atitudes, baseada em desespero e desesperança. Daí nasce o ódio. Esses sentimentos levam o ser humano a praticar qualquer tipo de violência, mesmo as mais condenáveis. Há razões para isso? Acordar de madrugada vendo um soldado encostar um fuzil na cabeça de um filho é suficiente para transformar o mais pacífico dos pais em indivíduos extremamente agressivos. E os filhos nunca mais se recuperarão do trauma psicológico. Noites de cristais todas as noites. Enterrar uma criança vítima de um tiro “acidental”,e ver suas casas destruídas, suas terras serem confiscadas, suas plantações e fontes de água arrasadas, sofrer humilhações em postos policiais, várias vezes ao dia, e todos os dias, sofrer segregação até em estradas e meios de transporte, não são toleráveis por qualquer ser humano. Isto deve ser chamado de terrorismo de estado. E o mundo observa quieto essas verdades inoportunas, de forma hipócrita, por se tratar de um povo que sofreu, e que se tornou inatacável, acima de qualquer crítica. O Holocausto não deveria, de forma desrespeitosa, ser utilizado como justificativa.
Não gostam de comparações, mas na segunda grande guerra os nazistas aplicavam punições coletivas em zonas ocupadas, fuzilando muitos, escolhidos de forma aleatória, quando um soldado era morto ou atacado, caso o responsável não se entregasse. Hoje, demolem-se casas caso alguém da família pratique um ato terrorista. Será que a família é toda culpada e terrorista? Ou expulsar e deportar os seus ocupantes, colocando em seus lugares fanáticos armados até os dentes, com liberdade para matar, em nome de um “deus”, que não é o meu, e que seguramente não aprovaria essas atitudes? Em um país pretensamente civilizado, se um criminoso for capturado, e a família pagasse esse preço, qual seria a reação geral? Tratam-se de crimes contra a humanidade. Intimidam todos os habitantes da região, que se refugiam, temendo ter o mesmo fim.
Será que alguém tem o direito de expulsar famílias que moram há décadas, ou séculos em suas casas, para simplesmente ocupá-las e entregá-las a outras que mal conhecem a região? Pogroms realizados à noite, por assentados (“colonos”) protegidos pelo exército, destruindo tudo que encontram pela frente, filmados e denunciados por jornalistas que são mortos “por acidente” por “snipers”. Isto faz parte de um processo chamado limpeza étnica, que a imprensa israelense comenta diariamente, mas a nossa não. É uma realidade sem contestação, comprovada, mas que gera profunda agressividade quando colocada em pauta. E utilizam o termo antissemita a quem apontar esses crimes indefensáveis. Ficam acima do bem e do mal, julgando as ações “necessárias” a seus fins. O mal, quando “necessário”, justificaria o nazismo e o estalinismo? Detestam essas comparações, mas matar é matar, racismo é racismo. Não importa a coloração religiosa, política ou social. O “meu mal” não é menor que o “seu mal”, independentemente de quem o tenha perpretado. Hitler e Stalin pensavam assim. Um certo ministro de “segurança” disse, a quem quisesse ouvir, que “precisamos demolir prédios, precisamos de mortes seletivas”. Ele representa o pensamento do atual governo de Israel. Geraria inveja nos dois tiranos citados.
Nas Escrituras, há trechos que preconizam a morte em determinadas situações, em nome de um pretenso supremacismo e exclusivismo, que são as raízes de um racismo, que chega a extremos de não respeitar até os seus. Rabin foi assassinado com base nesses preceitos, assim como as vítimas das chamadas mortes seletivas. Seu assassino diz ter orgulho do que fez, recebendo frequentes homenagens. São as religiões aprovando a morte. Elas têm cada vez mais seguidores. Escolas em ambos os lados ensinam crianças a odiar e, consequentemente, a matar.
A situação se deteriora a cada dia. Estão se destruindo em nome de “deus”, tendo perdido completamente a capacidade de dialogar, sempre se acusando mutuamente dos crimes cometidos. Enquanto julgarem que “tudo é meu”, serão levados a um nada existencial. Os dois lados deveriam se aceitar, mas está cada vez mais difícil. É a única forma de solucionar o problema. O mundo sabe que um acordo passa pela criação de um estado palestino, conforme disse recentemente, com toda propriedade, na ONU, o anterior primeiro ministro de Israel. Assim que deixou o poder, suas palavras foram levadas pelo vento, e acredito que ele tenha arriscado sua vida por ter dito isso. Ou disse para atenuar a situação política de seu país perante o mundo, sabendo que iria ser sucedido por um tirano radical mais criminoso que os déspotas anteriormente citados. E boa parte da população daquele país o admira, como Hitler e Stalin eram adorados em seus países.
Tristes ironias do destino.
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– Charles Mady, Médico e Professor associado do Instituto do Coração (Incor) e da Faculdade de Medicina da USP
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Sr. Mady, sugiro que estude história do Oriente Médio. Vai descobrir verdades. Vale a pena. Não leia panfletos ou declarações políticas ou interesseiras. Estude história seriamente.História dos Palestinos. História do Império Otomano. História do Mandato Britanico. História da Segunda Guerra Mundial. História de Israel. E do Egito, Síria, Jordania, Libano, Iraque.