Palco iluminado. Por José Horta Manzano
Palco estranho… Ao centro, com ar compenetrado, está o presidente da mesa. O resto são figuras cuja presença naquele exato lugar é difícil de explicar.
O distinto leitor e a graciosa leitora já devem ter visto foto tirada durante uma sessão parlamentar no exterior. Tirando republiquetas folclóricas, o palco onde se fazem as leis de um país costuma respirar dignidade. Os personagens exalam aquela sensação de comprometimento com o que está acontecendo, de apego aos ritos e à solenidade da hora.
Em nossas terras tropicais – e bonitas por natureza –, funciona assim não. Deputados e senadores vestem paletó e gravata por imposição do regulamento. Não fosse isso, veríamos eleitos do povo adentrar o recinto de bermudão e chinelo de dedo. Com exceção daquele jovem que um dia vestiu peruca amarela pra “lacrar”, nossos parlamentares costumam respeitar a indumentária exigida.
No entanto, se o regulamento fala do modo de vestir, é mudo quanto às atitudes admitidas. Observem a foto que reproduzo acima. Mostra uma sessão da Câmara Federal.
Ao centro, com ar compenetrado, está o presidente da mesa. O resto são figuras cuja presença naquele exato lugar é difícil de explicar.
…Não sei você, mas eu não aprecio que alguém se apoie sobre a poltrona em que estou sentado, mormente quando é cadeira de escritório, com molejo que chacoalha quando alguém encosta…
Uma senhora está à esquerda na foto. Na verdade, ela está sentada à direita do presidente, sinal de que exerce cargo importante. Enquanto fala o chefe, lá está ela grudada no celular, pouco interessada no discurso.
Atrás do presidente, estão plantados seis indivíduos. (Talvez sejam mais numerosos, mas a foto só mostra essa meia dúzia.) Três deles dão as costas para o plenário, desinteressados dos debates, mas interessadíssimos em algo que a foto não mostrou. Será uma bíblia? Uma foto de mulher pelada? Um jacaré?
Outros três personagens estão voltados para a plateia. Esses tampouco parecem fazer parte do conjunto de representantes do povo. Dois deles se apoiam, displicentes, no espaldar da poltrona do presidente da Câmara. Todos os três parecem interessadíssimos em espiar o papel onde está escrito o discurso do chefe.
Não sei você, mas eu não aprecio que alguém se apoie sobre a poltrona em que estou sentado, mormente quando é cadeira de escritório, com molejo que chacoalha quando alguém encosta.
Talvez esses chacoalhões expliquem certas decisões esquisitas de nosso Congresso. De fato, certas leis parecem ter sido escritas de cabeça pra baixo.
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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos, dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.
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Bem lembrando.
A displicência e a sem-cerimônia fazem parte do ritual tupiniquim.
Vergonhoso, aliás.
Vergonhoso, sim.
Caro Manzano,
Uma tomada aérea do nosso Congresso mostrará as ilustres excelências em rodinhas, andando de lá para cá, conversando, rindo ou aboletados nas costas do presidente da mesa, como bem comentou.
Que será que falam tanto?
Assuntos de grande interesse nacional?
Não parece…
As belas poltronas servem apenas para decorar o recinto, para assessores, ou tirar um cochilo entre uma passeada e outra.
Clodovil, em sua passagem pelo local, chegou a chamar a atenção dos “colegas” – vídeo https://youtu.be/iKHLXiMeWK8 – pela falta de respeito e atenção.
Mas, infelizmente nada mudou ou mudará.
Um abraço.
Inté!
Nada mudará, não. Falta berço.