Basta aprender com “Los Vecinos”… Por Alexandre H. Santos
Los Vecinos…enquanto país, podemos aprender muito com erros e acertos de outros países. Por exemplo, a maneira como os argentinos civis lidaram com militares criminosos. A lição foi exemplar. Desafios assim nunca são fáceis; mas são possíveis.
“Há uma maneira de contribuir para proteger a humanidade;
é não se resignar.”
Julio Cortázar
Foi inesperado. Comecei a ler a mensagem do WhatsApp de Dinha, êpa, o texto na terceira pessoa? Algo tinha acontecido… “Informo aos contatos da minha mãe que…” Sim, a mãe dela, foi hospitalizada por um mal-estar e não conseguira resistir às sequelas decorrentes. Fiquei meio que congelado no ar. Tínhamos planejado um encontro na semana seguinte. Pois é, minha querida prima partiu. Eu era fã dela. Sigo sendo. Dinha era daquelas pessoas completamente, como hoje se diz, da Turma do Bem; uma alma do lado da Luz. E tinha apenas dois anos a mais do que eu. Um choque. A morte passou perto.
Nessas horas sou tomado por elucubrações existenciais-filosóficas. Ato contínuo, penso no que já li e ouvi de inúmeras mestras e mestres: que estamos nessa vida para aprender. Só pra isso e para tudo isso. Aprender pra quê? Não sei. Talvez para evoluir. Quiçá depois ir para outro lugar. O certo é que aprendemos uns com os outros, sejamos pessoas, grupos, tribos, nações, estados, blocos ou multipolos. Daí o título do artigo: enquanto país, podemos aprender muito com erros e acertos de outros países. Por exemplo, a maneira como os argentinos civis lidaram com militares criminosos. A lição foi exemplar. Desafios assim nunca são fáceis; mas são possíveis. E nós, brasileiras e brasileiros, podemos aprender e seguir los hermanos argentinos, mandando os fardados que cometeram crimes contra a população e o Estado Democrático de Direito para o xilindró.
Então, se você ainda não assistiu ao filme 1985, assista; vale a pena. Nossos vizinhos aproveitaram a oportunidade do momento e fizeram História. Assim, com agá maiúsculo! Afirmaram perante o Estado e a Nação, em alto e bom som, que militares não são figuras intocáveis. Os militares são servidores dos civis e da democracia – uma missão grandiosa! Almejar mais que isso não é apenas inadequação ou, na melhor das hipóteses, fantasia, mas uma burrice descomunal. Tanto é que pagamos até hoje o preço do pecado original: o que chamamos aqui de “Proclamação da República” nunca deixou de ser o que foi – a escancarada tutela dos militares sobre a sociedade civil.
O próprio lema “Ordem e Progresso” estampado em nossa bandeira republicana, nos ensina sobre nós mesmos. Essas palavras vêm do ideário positivista de Auguste Comte, da primeira metade do século XIX; e apesar do empenho maçônico, logo se tornaria um tremendo freio de mão. É que “ordem” e de “progresso” são conceitos datados; e antes mesmo de 1900 já tinham sido questionados e superados pela filosofia e pela ciência. Hoje, em 2023, podemos considerá-los obsoletos e ultrapassados.
…O que há são crimes cometidos versus o império da Lei. Nuestros vecinos mandaram generais e demais militares criminosos para a cadeia. Nossa justiça terá coragem de proteger o Brasil e punir exemplarmente os planejadores, financiadores e executores dos atos terroristas antidemocráticos?…
O exemplo dos hermanos argentinos pode nos estimular a enfrentar o corporativismo dos fardados sem ódio e sem medo. E usar a ocasião para extinguir por completo a falsa crença de que as fardadas e os fardados constituem uma espécie de Poder Moderador da República. NÃO SÃO! E JAMAIS SERÃO! Militares e policiais são servidores do Estado Iaico e defensores da Constituição e da Democracia. Repito: uma missão de altíssima necessidade e relevância!
Mas vejamos o cenário atual. Como cidadão pagador de impostos, estou ansioso e curiosíssimo para ouvir as pérolas do general Augusto Heleno. Também irá dizer “foi mau, tava doidão”? E Braga Neto, vai desdizer as barbaridades que proclamou abertamente, aos quatro ventos, contra nossa democracia? Quer dizer, também vai argumentar “falei sem querer”?
O país sabe que a lista de fardados criminosos é grande. Tomara que haja investigação isenta, julgamento justo, punição e cadeia comum para todas e todos que forem considerados culpados. Insisto: cadeia comum. Vou ressaltar no meio dessa tropa de militares e policiais criminosos, por mera circunstância do momento, o caso Anderson Torres. O que resta do gado bolsonarista de plantão se empenha em transformar o ex-Ministro da Justiça em um pobre coitado. Alguém que desde que está preso perdeu mais de 10 quilos, tem crises de choro e ameaça se suicidar. Ora, os bolsominions parecem ter memória curta, muitíssimo curta. Se dependesse da vontade do Torres, eu, você (provavelmente) e todo brasileiro/a progressista estaríamos agora em maus lençóis; tendo de encarar mais quatro anos de desgoverno autoritário, machista, corrupto e violento…
É importante e urgente a desbolsonarização das Forças Armadas e das Polícias Civil e Militar. Essa imprescindível assepsia exigirá das respectivas lideranças um exemplo grandioso de amor pelo país. Algo como a consciência plena da responsabilidade e das consequências da livre escolha entre servir a Sociedade Civil, a Nação Brasileira ou aos interesses próprios da Corporação. Aqui está o nó da questão; e simples de resolver: militares e policiais que queiram fazer política devem deixar a caserna e abandonar de forma definitiva suas fardas.
Para concluir, a sociedade civil argentina não caiu nessa conversa fiada de “vingança” e de “revanchismo”. Não havia lá, como não há aqui, vingança ou revanchismo algum. O que há são crimes cometidos versus o império da Lei. Nuestros vecinos mandaram generais e demais militares criminosos para a cadeia. Nossa justiça terá coragem de proteger o Brasil e punir exemplarmente os planejadores, financiadores e executores dos atos terroristas antidemocráticos? Eu tenho esperança e quero acreditar que sim!
__________________
*Alexandre Henrique Santos – Atua há mais de 30 anos na área do desenvolvimento humano como consultor, terapeuta e coach. Mora em Madri e realiza atendimentos e workshops presenciais e à distância. É meditante, vegano, ecologista. Publicou O Poder de uma Boa Conversa e Planejamento Pessoal, ambos editados pela Vozes..
Acesse: www.quereres.com
Contato: kari1954kari@gmail.com