PAZ

Educar para a Paz. Por Alexandre Henrique Santos

…a minha antiga convicção de que somente processos educacionais focados na paz, à exemplo do CCA, podem frear e extinguir a onda de ódio e violência que aparenta se expandir nos mais diversos lugares e direções…

PAZ

“Não há caminho para a paz. A paz é o caminho.”

Mahatma Ghandi

No final do século passado, a curiosidade levou-me ao Centro de Cura das Atitudes – um movimento pacifista internacional criado e liderado pelo psiquiatra norte-americano Gerald Jampolsky. Seu principal objetivo era praticar atitudes interpessoais baseadas no respeito, tolerância, solidariedade e, sobretudo, no amor ao próximo. Minha militância no CCA foi relativamente breve, mas intensa e muito marcante. Tanto assim que mergulhei de cabeça; e não me privei de ir conhecer o próprio Jampolsky no encontro mundial dos CCAs; que, naquele ano, se realizou no México.

O parágrafo acima ilustra a minha antiga convicção de que somente processos educacionais focados na paz, à exemplo do CCA, podem frear e extinguir a onda de ódio e violência que aparenta se expandir nos mais diversos lugares e direções. Porém, nem todos os movimentos pacifistas do planeta, somados e multiplicados, poderão produzir transformações sociais positivas e duradouras, sem que as causas do ódio e da violência sejam devidamente estudadas, combatidas e devidamente inoculadas. É como nos adverte a política e ativista birmanesa Aung San Suu Kyi: “A paz não só consiste em pôr fim à violência ou a guerra; senão a todos os demais fatores que ameaçam a paz, como a discriminação, a desigualdade e a pobreza.”

Embora a violência e o ódio sejam velhas e conhecidas manifestações da natureza humana – portanto, atendam a impulsos biológicos não freados por fatores como o comedimento e a civilidade –, podem ser e com frequência são estimulados por lideranças políticas e meios de comunicação que comungam e propagam uma visão agressiva, intolerante e belicosa da vida social. Não é segredo para ninguém que, em 2022, na comemoração do seu natalício, o deputado federal Eduardo Bolsonaro – notório lobista da indústria armamentista – teve como decoração do bolo de aniversário a reprodução de um revólver calibre 38!

Não há fenômeno psicossocial que se explique através de uma causa única e exclusiva. Pois bem, aqui entre nós, brasileiras e brasileiros, os fundamentos do ódio e da violência, mesmo que múltiplos, são quase 100% estruturais. Se no século XVI os povos originários davam variadas demonstrações de agressividade e até de crueldade, foi com os portugueses e europeus que se deu um salto quântico. O verniz de legalidade dado então à escravidão de indígenas e africanos, expõe a raiz da abjeta naturalidade com que o Brasil atual lida com nossos mais profundos preconceitos de raça e de classe. Preconceitos hoje estendidos às questões de gênero, que fazem do país do Carnaval o lugar do planeta onde mais se assassinam (e impunemente) transexuais.

… a urgência de todas e todos – crianças, jovens, adultos e idosos – sermos educados para a paz. Precisamos formar cidadãs e cidadãos que encarnem o respeito e a tolerância para com o singular e o diverso…

O professor Janpolski elencou 12 princípios que direcionam os comportamentos e as dinâmicas dos Centros de Cura das Atitudes, os CCAs. Reproduzi-los aqui tem o propósito de divulgar ações que, se seguidas à risca, favorecem ambientes empáticos e inclusivos, pacíficos e solidários. Não tenho a mínima dúvida de que as atitudes que refletem essas orientações são poderosas o suficiente para criar relações interpessoais fraternas e pacíficas.

1º) A essência do nosso ser é amor.

2°) Saúde é paz interior. Curar é abandonar o medo.

3º) Dar e receber são a mesma coisa.

4º) Podemos nos desprender do passado e do futuro.

5º) O agora é o único tempo que existe, e cada instante é para nos doarmos.

6º) Podemos aprender a amar a nós mesmos e aos outros perdoando, ao invés de julgando.

7º) Podemos nos transformar em pessoas que veem o amor e o que une, em lugar de pessoas que veem o erro e o que desune.

8º) Podemos escolher nos direcionar para a paz interior, independentemente do que está acontecendo no exterior.

9º) Somos alunos e professores uns dos outros.

10º) Podemos nos concentrar na totalidade da vida, e não nos seus fragmentos.

11º) Sendo o amor eterno, não existe razão para temer a dor e a morte.

12º) Podemos sempre ver a nós mesmos e aos outros como seres que ou oferecem amor ou suplicam ajuda.

Quanto mais escuto pessoas longevas que considero inteligentes, sensíveis e sábias, mais me sinto seguro para afirmar que a maior missão existencial dos humanos nesse planeta é construir uma rede mundial de convivência colaborativa. Desde tal perspectiva, ressalta a urgência de todas e todos – crianças, jovens, adultos e idosos – sermos educados para a paz. Precisamos formar cidadãs e cidadãos que encarnem o respeito e a tolerância para com o singular e o diverso. O desafio essencial é o indivíduo, a família, a escola e a comunidade sermos exemplos vivos de cidadania.

Muitos resumem todo esse palavreado numa singela expressão: a prática cotidiana da democracia.

__________________

Foto: @catherinekrulik

*Alexandre Henrique Santos – Atua há mais de 30 anos na área do desenvolvimento humano como consultor, terapeuta e coach. Mora em Madri e realiza atendimentos e workshops presenciais e à distância. É meditante, vegano, ecologista. Publicou O Poder de uma Boa Conversa e Planejamento Pessoal, ambos editados pela Vozes..

Acesse: www.quereres.com

Contato: kari1954kari@gmail.com

 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Assine a nossa newsletter