Adeus, mordomias! Por José Horta Manzano
… Desde que tomou posse do cargo, em 2019, Bolsonaro se habituou a viver cercado de reverências e mordomias. Foram quatro anos durante os quais não teve de se preocupar em abrir portas, fazer compras, arrumar a cama, mandar um eletrodoméstico para o conserto, conduzir a filha até a escola, levar o carro para a revisão, pagar a conta do telefone, fazer fila no banco…
Desde que tomou posse do cargo, em 2019, Bolsonaro se habituou a viver cercado de reverências e mordomias. Foram quatro anos durante os quais não teve de se preocupar em abrir portas, fazer compras, arrumar a cama, mandar um eletrodoméstico para o conserto, conduzir a filha até a escola, levar o carro para a revisão, pagar a conta do telefone, fazer fila no banco, comprar aspirina na farmácia, apertar o botão do elevador. Até o pastel que comia no boteco – sempre em frente às câmeras, naturalmente – era pago por um serviçal.
Derrotado, o ex-presidente ainda conseguiu dar uma espichadinha no mundo da fantasia. Dois dias antes de entregar o cargo, escapuliu do Brasil em avião oficial e estacionou três meses pras bandas da Disneylândia. Lá continuou cercado de serviçais e de apoiadores, concedeu autógrafos, posou para selfies, comeu hambúrguer e pizza (longe das câmeras) e visivelmente engordou algumas libras.
Mas chegou a hora do retorno. Prolongar a estada equivalia a pavimentar a estrada para outros potenciais candidatos à Presidência em 2026. Medroso como é, o capitão há de ter engolido meio vidro de remédio tranquilizante pra poder embarcar de volta.
Já no aeroporto de Orlando, levou seu primeiro susto de ex-presidente. Como qualquer mortal, teve de fazer fila e passar o controle de bilhetes. Chegando ao guichê, Bolsonaro, que não carrega a própria passagem, mas deixa a tarefa para um assessor, parou e ficou esperando que lhe dessem autorização de seguir adiante.
Nesse instante, o assessor carregador de bilhete espicha o braço e entrega a tarjeta informando que é do senhor que está de pé. A mocinha do embarque cata o papel, confere, e devolve o cartão de embarque ao ex-presidente. Faz isso com um gesto displicente, dando as costas a Bolsonaro e espichando o braço para trás enquanto conversa com outra pessoa. Para o ex-presidente, há de ter sido um susto!
Logo em seguida, ele teve de embarcar num voo comercial (coisa que não fazia havia anos), espremido como qualquer cidadão comum. Ouviu aplausos, mas também teve de aguentar gritos hostis. Parece que não dormiu durante a viagem. Ao desembarcar, não viu multidão nenhuma. Foi levado em viatura da PF até a sede de seu partido. Na porta, esperando por ele, havia meia dúzia de gatos pingados.
À noite, depois que uma dia calamitoso o fez cair na real, acho que ele teve de tomar remédio pra dormir.
Ai, ai, ai. A dor de ser ex é a dor de quem era, mas deixou de ser. E com pouca esperança de voltar a ser.
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JOSÉ HORTA MANZANO – Escritor, analista e cronista. Mantém o blog Brasil de Longe. Analisa as coisas de nosso país em diversos ângulos, dependendo da inspiração do momento; pode tratar de política, línguas, história, música, geografia, atualidade e notícias do dia a dia. Colabora no caderno Opinião, do Correio Braziliense. Vive na Suíça, e há 45 anos mora no continente europeu. A comparação entre os fatos de lá e os daqui é uma de suas especialidades.
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Ele voltou (pense em volta do boêmio, de Adelino Moreira, com Nelson Goncalves)
Ele voltou,
Partiu daqui descontente
Por que razão quis voltar
Acontece, que ele não conseguiu
O que tanto queria
Criar uma tal desarmonia
Juntar milicos que queria leais
Pois alguns
Que o acompanhavam
Até outro dia
Agora buscam outra companhia
Nos eternos
Refastelar do poder
Se ajeitam em algum
Porco lugar…
Buscam a discórdia
Querem achar o mito perdido
Encontrar em novas motociatas
O seu líder ideal
Ele voltou!
Nosso mito voltou novamente
Mas, onde estão seus momentos e glórias
Onde estão sua vida sem manchas
Onde ficou sua imagem fiel
Vá buscar
Em rios e poucas cascatas
Em matas que foram devastadas
Em algum garimpo ilegal
Ou talvez, desprezo pelo ser
Em maca de hospital
Que a Covid matou
Vá embora, pois o querer
Que um dia queria
Tornou-se algo que não teria
A alegria de se reeleger
Com ampla maioria
Virou utopia
E nos livramos desse mal
Enfim, tudo acabou como sempre
Nas mãos de outro pouco inocente
E, agora esperar pelo futuro
Onde nada é certo, mas que de mim
O governo de plantão espera,
Nadamais…
SP 01/04/2023
Nélson Gonçalves não deixou herdeiro artístico, mas Adelino Moreira sim. Parabéns!