Oscars – Os chatos ladram; a turma do tapete vermelho passa. Por Wladimir Weltman
OSCARS 2023 – OS CHATOS LADRAM E A TURMA DO TAPETE VERMELHO PASSA
Podem meter o malho nos Oscars. Falar mal de Hollywood. Acusar o cinema americano de ser o culpado dos problemas do cinema brasileiro. O que realmente importa é que os chatos que sempre fazem essas acusações e críticas, não perdem um segundo do show dos Oscars. E este ano a festa foi linda.
Depois da pandemia, depois do tapa na cara, depois do “Mito” virar apenas uma memória triste, os Oscars 2023 rolaram num clima de “paz e amor”. O que estava nas mentes e corações presentes era uma coisa só — vamos salvar Hollywood da crise, afinal é o nosso ganha pão.
Claro que tem sempre uns desavisados que moscam e pisam na bola, como o astro inglês Hugh Grant que foi extremamente indelicado com a modelo/host Ashley Graham no tapete vermelho (quer dizer, tapete champanhe). Ele não estava visivelmente entusiasmado de estar ali. A cada pergunta da moça tentando ser simpática, ele respondia desinteressado, de forma arrogante, alheio a vibração geral do ambiente. A turma do Twitter votou por dar a Ashley Graham o Oscar de Melhor Entrevistadora Zen, por tolerar o panaca do inglês. Essa porém não é a primeira vez que ele pisa na bola em Hollywood. Há 27 anos foi flagrado pela polícia com a prostituta Divine Brown, com repercussão trágica para sua carreira.
Já o comediante Jimmy Kimmel, o “host” pela terceira vez, caiu literalmente de paraquedas no palco do show. Mas essa foi a única ação ousada da noite.
O monólogo inicial do programa foi divertido, mas cuidadoso para não ofender ninguém. Fez piada sutis com a maioria dos concorrentes das diversas categorias e se deu ao direito de avacalhar com James Cameron e Tom Cruise que não estavam lá.
Quase ao fim do monólogo, como não poderia deixar de ser, falou também do escandaloso tapa em Chris Rock no ano anterior:
“Queremos que você se divirta, se sinta seguro e, o mais importante, queremos que eu me sinta seguro. Então, temos políticas rígidas em vigor. Se alguém neste teatro cometer um ato de violência a qualquer momento durante o show, você receberá o Oscar de Melhor Ator e terá permissão para fazer um discurso de 19 minutos”.
Antes de terminar, Kimmel avisou que a Academia voltou atrás e resolveu corrigir uma injustiça do ano anterior, quando várias categorias importantes deixaram de ser premiadas ao vivo.
Infelizmente cometeram outra gafe grave, este ano. Deixaram de homenagear diversos mortos ilustres da indústria, no segmento “In Memorian”, que este ano contou com Lenny Kravitz ao piano tocando e cantando a música “Calling All Angels”. Nomes como Paul Sorvino, Anne Heche, e Tom Sizemore, entre outros.
Apesar de bem-comportado, o Oscar 2023 teve sua dose de manifestações político/sociais. Vários participantes portavam fitinhas azuis para homenagear os refugiados e perseguidos políticos do mundo — o ator Ke Huy Quan, que ganhou o Oscar de Melhor Ator Coadjuvante, chegou aos EUA criança, refugiando-se do Vietnã.
A moda acessível e reciclável também foi assunto, com muitos modelitos em cores claras e tecidos naturais. Cate Blanchet foi mencionada como uma das estrelas que se destacam nessa campanha.
Os índios Yanomamis também estiveram presentes. Vinte Indicados receberam estátuas Yanomamis que representa o deus Omama, alertando contra a extração ilegal de ouro no Brasil, informando as estrelas de Hollywood da crise de saúde que o povo Yanomami enfrenta devido a esses mesmos garimpos.
O documentário NALVANY, sobre o líder da oposição ao Presidente Vlad Putin, Alexey Navalny, que foi “misteriosamente” envenenado e agora está preso, ganhou um Oscar. Sua família esteve presente no palco junto com os produtores do filme.
A questão das mulheres em Hollywood foi outro tema presente. Michelle Yeoh, que se tornou a primeira mulher asiática a ganhar um Oscar de Melhor Atriz, tem 60 anos e no seu discurso disse : “Não deixe ninguém dizer que você já passou do seu apogeu”. Comentário super atual em face ao escândalo das jovens na Internet que fizeram pouco de uma colega de faculdade de 40 anos.
Na verdade este foi um Oscar muito especial, foi o Oscar dos “losers” ou, em bom português, dos vencidos, aquela turma que está sempre por baixo. Quatro das principais categorias – Melhor Ator, Melhor Atriz e Melhor Atores Coadjuvantes foram para artistas assim. Vejam só:
Angela Bassett era a favorita para vencer a categoria. Ela já tinha ganho nos Golden Globes e Critics Choice Awards por sua participação no filme WAKANDA FOREVER. Mas o Oscar de Melhor Coadjuvante foi para Jamie Lee Curtis por EVERYTHING EVERYWHERE ALL AT ONCE. A atriz que se consagrou com os filmes de terror da franquia HALLOWEEN. No discurso Jamie agradeceu a seus pais, os astros da Hollywood do passado, Tony Curtis e Janet Leigh, que nunca receberam a desejada estatueta. Com ela nas mãos Jamie gritou: “Acabamos de ganhar um Oscar”!
O de Melhor Ator Coadjuvante ficou para Ke Huy Quan (também por EVERYTHING EVERYWHERE ALL AT ONCE ), que foi o astro mirim de filmes como GOONIES e INDIANA JONES AND THE TEMPLE OF DOOM. Depois ele cresceu e foi trabalhar por trás das câmeras. No discurso, Ke contou que:
“Minha jornada começou num barco. Passei um ano em um campo de refugiados. E, de alguma forma, acabei aqui no maior palco de Hollywood. Dizem que histórias como essa só acontecem nos filmes. Não acredito o que está acontecendo comigo. Este é o sonho americano.”
E o Oscar de Melhor Atriz ficou com Michelle Yeoh (novamente por EVERYTHING EVERYWHERE ALL AT ONCE), que fez carreira com filmes de ação como SUPERCOP, CROUCHING TIGER, HIDDEN DRAGON e TOMORROW NEVER DIES. Com a estatueta na mão disse:
“Para todos os meninos e meninas que se parecem comigo assistindo esta noite, este é um farol de esperança e possibilidades. Esta é a prova de que os sonhos mais alto podem se tornar”.
O último desse grupo, e o mais dramático deles, foi o Oscar de Melhor Ator, que ficou para Brandon Fraser pelo filme A BALEIA. Fraser se afastou (ou foi afastado) de Hollywood por uma série de problemas pessoais (inclusive um caso de assédio que sofreu nas mãos do ex-presidente da Hollywood Foreign Press Association, a organização que organiza o Globo de Ouro). As diversas premiações nesta temporada representam para ele uma volta ao estrelato. Emocionado em seu discurso, ele falou:
“Comecei neste negócio há 30 anos, e as coisas não foram fáceis para mim, mas havia uma facilidade que eu não apreciei na época até que deixou de existir. Hoje eu só quero dizer, obrigado por este reconhecimento.”
O quinto “loser” premiado, considerado o azarão do páreo, foi o filme EVERYTHING EVERYWHERE ALL AT ONCE, que de onze indicações levou 7 Oscars, incluindo Melhor Filme. Uma história confusa, contada em ritmo alucinante, que mistura ação, comédia, ficção científica, drama familiar inclusivo (uma família de imigrantes asiáticos com uma filha lésbica), etc. Ou seja – tudo, em todas a partes, de uma vez só. Apesar de fugir aos padrões tradicionais de Hollywood, a Academia curtiu a coisa e até Spielberg (que concorria com seu filme ultra pessoal, THE FABELMANS) bateu palmas.
Infelizmente, meu favorito na categoria internacional, ARGENTINA, 1985, perdeu para ALL QUIET IN THE WESTEN FRONT (que um dos produtores é brasileiros – Daniel Dreifuss), mas os Oscars são assim mesmo. Antes da arte, antes de tudo, vale a emoção. A turma sempre vota com o coração. Mas sei que a escolha foi difícil. Os latinos pelo menos puderam lavar a alma com Guillermo Del Toro e seu PINOCCHIO ganhando o Oscar de Melhor Animação.
Lamento por Ana de Armas (BLONDE), Baz Luhrmann e Austin Butler (ELVIS), Cate Blanchett (TÁR), Colin Farrell, Brendan Gleeson e Barry Keoghan (THE BANSHEES OF INISHERIN), Judd Hirsch, Michelle Williams e Spielberg (THE FABELMANS), Angela Bassett (WAKANDA FOREVER), pelos quais também torcia, sabendo que nem todos poderiam ser agraciados com a estatueta, apesar de merecer.
Para os chatos que postaram que o Oscar morreu, ou já não tem graça… A cerimônia do Dolby Theatre em Hollywood teve uma média de 18,7 milhões de espectadores, 12% a mais do que no ano anterior.
A maior audiência desde 2020.
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WLADIMIR WELTMAN – é jornalista, roteirista de cinema e TV e diretor de TV. Cobre Hollywood, de onde informa tudo para o Chumbo Gordo
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(DIRETO DE LOS ANGELES)
Salve Wladimir. Ótimo seu texto que acompanho sobre sua viagem e esse do Oscar tbem adorei. Sobre o filme “Tudo em todo lugar ao mesmo tempo”, eu gostei por ser uma metáfora do mundo, da vida, das emoções e da sociedade atual. Achei tbem longo demais, com alguns cliches e bem oriental, mas valeu…Acho que é boa essa crítica social ser direcionada a muita gente que precisa ouvi-la, mas que a ignora.