2023: o democrático, feliz e difícil ano. Por Alexandre H. Santos
2023: O democrático, feliz e difícil ano que temos pela frente
“Conhecereis a verdade, e a verdade vos libertará!”
João 8:32
Nem você, nem eu, nem ninguém nunca viu nada igual. Após quase sessenta dias de silêncio, o ex-presidente fugiu para os EUA. Não, o verbo não é duro; foi mesmo uma fuga! Ele sequer se despediu da Nação. Sua última live foi como todo o seu governo: dirigida apenas para a minoritária bolha intolerante e antidemocrática que lhe deu incondicional apoio. Melancólico, medíocre e sem surpresas o epílogo do pior mandatário da nossa história republicana.
Ainda que o vírus das fake news – projetado na política além do maniqueísmo direita-esquerda – seja disseminado e combatido no planeta, há lugares e períodos nos quais a prática aparenta ter se institucionalizado. No Brasil, desde antes da campanha eleitoral de 2017 até o último dia de 2022, o Capitão, o Gabinete do Ódio e os extremistas elevaram as mentiras ao estado da arte.
Mas como alguém nos advertiu: “Você pode enganar algumas pessoas o tempo todo ou todas as pessoas durante algum tempo; mas você não pode enganar todas as pessoas o tempo todo.” A farsa do bravateiro caiu por terra. Ficou claro como a luz do dia que Bolsonaro era só um fanfarrão contumaz. O ex-Presidente mentia de modo compulsivo e ludibriou milhares de brasileiros e brasileiras, fazendo-os de idiotas, levando-os a acreditar que ele tinha um poder e uma capacidade de articulação que nunca possuiu. Fugiu deixando a definitiva imagem de criatura fraca, medrosa e chorona.
Já o que vimos em Brasília (01/01) foi a Festa da Democracia. Embora a praga do fascismo ainda permaneça ativa e raivosa em variados segmentos da nossa sociedade, a civilização venceu a barbárie. O discurso de Lula teve um tom apaziguador. A mensagem dirigida aos brasileiros e brasileiras foi de pacificação, de reunião fraterna e colaborativa das pessoas, de todas as pessoas, da nossa Nação. Lula e Alckmin não governarão apenas para seus eleitores. O compromisso da ampla coligação democrática é beneficiar o país inteiro; e, como é natural numa coligação com viés de centro-esquerda, com ênfase nas camadas mais desfavorecidas e pobres.
… o gigantesco desafio que 2023 trará para nós: reconstruir novos canais de confiança e/ou curar os antigos canais. O trabalho agora, me parece, é criar condições de abertura e tolerância. Reinventar a confiança – em nós mesmos, na família, nos amigos, um a um, uma a uma, desde os mais próximos até chegar nos mais distantes…
No momento em que falamos tanto de omissões e sigilos, é válido lembrar o trabalho do psicólogo norte-americano Will Schutz, falecido em 2002. Dedicou sua vida à criação e divulgação de um efetivo método terapêutico, aplicado a pessoas e grupos humanos. A abordagem parte da ideia de que a Natureza procura para seus desafios a solução mais simples. E não existe simplicidade maior do que a verdade. A partir desse entendimento, o ato de mentir revela o que há mais primitivo e tosco na existência humana e das relações interpessoais – quaisquer que sejam elas. Daí o gigantesco desafio que 2023 trará para nós: reconstruir novos canais de confiança e/ou curar os antigos canais. O trabalho agora, me parece, é criar condições de abertura e tolerância. Reinventar a confiança – em nós mesmos, na família, nos amigos, um a um, uma a uma, desde os mais próximos até chegar nos mais distantes…
Nós sabemos que a confiança é a base sobre a qual se forma e se sustenta o pacto republicano e o Estado Democrático de Direito. Machado de Assis já cutucava, com notável maestria, os ambientes fartos de hipocrisia: “quando a sinceridade é um risco, a dissimulação é um dever.” Pois bem, o extremismo que assaltou o país criou um tsunami de mentiras e dissimulações. Ninguém duvida que o fantasma do comunismo, o kit-gay e a mamadeira de piroca foram os maiores cabos eleitorais do indisciplinado Tenente que passou para a reserva com o posto de Falastrão, digo, de Capitão.
Onde falta abertura e transparência, quem primeiro sucumbe é a verdade. Ato contínuo e em decorrência disso, cresce a desconfiança. Por isso, Schutz dizia que a mentira é incompatível com a Democracia. Apontava que as omissões e prevaricações são tão nocivas para o indivíduo, a coletividade e suas instituições quanto as piores inverdades. Fraudar laudos, omitir fatos, escamotear estatísticas, apagar um dado, criar segredos, destruir uma prova são sinônimos do mesmo mal e são igualmente venenosos.
2023 chega colocando na cadeira da Presidência da República um velho conhecido nosso: Luís Inácio Lula da Silva. Ora, para uma significativa parte ou para todos os eleitores do Capitão, Lula é ladrão. Não importa que os processos abertos contra ele foram todos anulados pela Justiça. Não muda nada que Sérgio Moro e Cia. tenham emitido juízos comprovadamente (sic) parciais, etc. A imagem do PT como um Partido corrupto e o sentimento antipetista se propagaram pelo país como sarampo. A grande mídia, sempre serviçal dos poderosos, inflou essa onda e surfou nela. Contudo, em minha opinião, comparados com todos os outros governos que tivemos, os mandatários petistas até que foram modestos. E atenção: essa minha ressalva não desfaz a gravidade dos crimes que foram de fato cometidos. Já falei do ônus que todos pagamos pela ausência de autocrítica do PT; não faz falta repetir aqui.
A questão é que hoje nosso grau de desconfiança cresceu numa proporção geométrica. Não basta a mulher de César ser honesta; ela precisa parecer honesta. Nossos representantes também precisam ser e parecer honestos. Uma autoridade nacional pertencente a qualquer esfera do Poder, civil ou militar, conta hoje com uma gigantesca desconfiança por parte da nossa população. O egoísta e tóxico corporativismo desses grupos nos demonstra que não dá para a cidadã e o cidadão comuns confiarem em boas intenções e votos de honestidade. A Tolerância Zero para qualquer forma de corrupção e crime cometidos por agentes públicos dos três Poderes e das Forças Armadas é uma medida que contribuirá para fazer a confiança voltar a crescer entre nós!
Em breve veremos o que o ex-presidente Bolsonaro se empenhou tanto em esconder… Os seguidores verdadeiramente doentes vão escolher seguir negando a realidade; dirão que se trata de “fake news”. Paciência. Será nossa ocasião de exercitar a Tolerância. Esses fanáticos precisarão de acompanhamento psiquiátrico.
Observe 2023 com os olhos bem abertos!
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*Alexandre Henrique Santos – Atua há mais de 30 anos na área do desenvolvimento humano como consultor, terapeuta e coach. Mora em Madri e realiza atendimentos e workshops presenciais e à distância. É meditante, vegano, ecologista. Publicou O Poder de uma Boa Conversa e Planejamento Pessoal, ambos editados pela Vozes..
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Belas e verdadeiras palavras. Agora é aguardar…. Tudo vai mudar, devagar, mas vai.