Pós-eleição e o nosso calcanhar de Aquiles. Por Meraldo Zisman
… abro um parêntese para dizer que segundo a Organização da Saúde (O.M.S.) o brasileiro é o povo mais ansioso do mundo. Perdedores ou ganhadores, todos possuímos um calcanhar de Aquiles. Afirma-se por aí que a fraqueza dessa parte traseira do guerreiro grego Aquiles se repete no colégio eleitoral…
Passeando pelo livro de Zygmunt Bauman (1925 – 2017) — A Modernidade e Holocausto — publicado pela editora Zahar (1998) menciona um jornalista do Le Monde que entrevistou um punhado de vítimas de sequestro. Uma das coisas mais interessantes que descobriu foi uma incidência anormalmente alta de divórcios entre os casais que sofreram juntos a situação amedrontadora da ameaça de serem mortos pelos agressores. Intrigado, pesquisou nesses casais, hoje divorciados, para saber as razões de sua separação, ocorrida em decorrência do que passaram.
A maioria dos entrevistados confessou que nunca haviam pensado em divórcio, antes do sequestro. Durante o apavorante episódio viram-se, marido e esposa, sob nova aparência. Revelaram-se indivíduos egocêntricos, preocupados com sua própria salvação. O Homo sapiens, independente do gênero a que pertença, é ligado às normas e ações estruturais que equilibram as relações sociais, econômicas e políticas, que o ajudam a sobreviver como espécie na sociedade à qual pertencem. No caso específico dos cônjuges sequestrados, cada um passou a conhecer as duas faces dos seus respectivos companheiros ou companheiras ante uma situação de adversidade, quando abrolha verdadeira personalidade.
O leitor que chegou até aqui neste texto, pode talvez pensar em relacionar tais divórcios com o segundo turno da eleição recém ocorrida e causa de muitas ansiedades pós-eleitorais dos brasileiros sob o desgastado princípio da palavra democracia. A memetização das mensagens está saturando nossas mentes (aparelhos mentais) independentemente das posições e preferências político-eleitorais. Provoca medos, raivas, temores gerais no povo, seja em quem votaram.
Lembro e abro um parêntese para dizer que segundo a Organização da Saúde (O.M.S.) o brasileiro é o povo mais ansioso do mundo. Perdedores ou ganhadores, todos possuímos um calcanhar de Aquiles. Afirma-se por aí que a fraqueza dessa parte traseira do guerreiro grego Aquiles se repete no colégio eleitoral.
Quanto aos resultados das eleições, é bom lembrar que a insegurança alimentar (fome), a violência, a corrupção, os desníveis sociais causados pela existência da escravatura e a agora pretendida participação dos denominados povos originais (índios ou ameríndios) são nossos calcanhares de Aquiles. Somos um povo que, de cinco brasileiros quatro são mestiços, pardos ou índios. Há que aceitar e ssa realidade e procurar resolver o impasse criado por uma instituição cuja existência só é necessária se ela resolver qualquer impasse com justiça e transparência.
Aprendi com um motorista de caminhão no alto sertão de meu estado natal, Pernambuco, e esclareço ou relembro: o cabresto pode mudar, mas a besta permanece a mesma. Relembro ou esclareço — cabresto em nordestinês é a correia, com uma extremidade armada especialmente para se firmar na cabeça do animal, que serve para amarrá-lo ou dirigí-lo.
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Meraldo Zisman – Médico, psicoterapeuta. É um dos primeiros neonatologistas brasileiros. Consultante Honorário da Universidade de Oxford (Grã-Bretanha). Vive no Recife (PE). Imortal, pela Academia Recifense de Letras, da Cadeira de número 20, cujo patrono é o escritor Alvaro Ferraz.
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